Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 57.288/14

Autos n.º  6.522/13 – MM. Juízo do DIPO 4 (Comarca da Capital)

Suscitante: 6.ª Promotoria de Justiça Criminal Central da Capital

Suscitada: Promotoria de Justiça Criminal de São José dos Campos

Assunto: controvérsia acerca do correto enquadramento dos fatos, com reflexo na atribuição funcional

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. FORO COMPETENTE PARA APURAÇÃO DE DESAUTORIZADA TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA DE VALOR ENTRE CONTAS CORRENTE E POUPANÇA. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE  FRAUDE (CP, ART. 155, §4.º, INC. II). ATRIBUIÇÃO DO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM EXERCÍCIO PERANTE O JUÍZO DO LOCAL DA SUBTRAÇÃO DO MONTANTE.

1. Os autos retratam hipótese em que agente transferiu quantia das contas corrente e poupança da vítima sem sua anuência, depositando-a em outra, situada em Comarca diversa, por meio da rede mundial de computadores.

2. A agência onde a ofendida possui as contas bancárias situa-se em São José dos Campos, de modo que neste local deu-se a subtração do valor. Nesse sentido, precedente da Colenda 3.ª Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: C.At. n. 222/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 16/05/2011.

Solução: conhece-se do conflito para dirimi-lo e declarar que a atribuição para atuar no feito incumbe ao Douto Suscitado.

 

Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração da suposta prática do delito de estelionato (CP, art. 171, caput) cometido, em tese, em face de (...).

O Ilustre Promotor de Justiça de São José dos Campos, acolhendo a manifestação da digna autoridade policial, no sentido de que a infração se consumou na Capital, local onde obtida a vantagem ilícita, postulou o correspondente encaminhamento (fl. 34).

A Douta Representante Ministerial recipiente, contudo, entendendo configurado o crime de furto qualificado pelo emprego de fraude (CP, art. 155, §4.º, II), cujo summatum opus teria se verificado na origem, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 45/52).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que a vinda dos autos a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão se encontra com a Douta Suscitante, com a máxima vênia do Ilustre Suscitado; senão, vejamos.

Consta da narrativa do feito, em breve síntese, que (...), no dia 09 de setembro de 2012, constatou a realização de operações anormais por meio da rede mundial de computadores (internet) em suas contas corrente e poupança, com a subtração dos montantes de R$ 2.499,75 (dois mil, quatrocentos e noventa e nove reais, setenta e cinco centavos) da primeira e R$ 3.837,47 (três mil, oitocentos e trinta e sete reais, quarenta e sete centavos) da segunda.

O BANCO DO BRASIL, destarte, informou que as transferências efetuadas no dia 15 de agosto de 2012 se deram para a conta corrente de (...) junto ao BANCO ITAÚ, em agência situada na Capital (fls. 18/19 e 28).

Diante de tal quadro, pode-se asseverar que houve furto qualificado pela fraude, pois se cuida de subtrações de quantias de contas corrente e poupança, realizadas por meio de transferências eletrônicas (via internet) sem a anuência do titular das contas.

Com efeito, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:

 

“CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. MPF E JUIZ FEDERAL. IPL. MOVIMENTAÇÃO E SAQUES FRAUDULENTOS EM CONTA CORRENTE DA CEF POR MEIO DA INTERNET. MANIFESTAÇÃO DO MPF PELA DEFINIÇÃO DA CONDUTA COMO FURTO MEDIANTE FRAUDE E DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRA O LOCAL ONDE MANTIDA A CONTA CORRENTE. INTERPRETAÇÃO DIVERSA DO JUÍZO FEDERAL, QUE ENTENDE TRATAR-SE DE ESTELIONATO. INEXISTÊNCIA DE CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. ARQUIVAMENTO INDIRETO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 28 DO CPP. PRECEDENTES DA 3A. SEÇÃO DESTA CORTE. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO CONFLITO. CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO NÃO CONHECIDO.

1. A 3ª. Seção desta Corte definiu que configura o crime de furto qualificado pela fraude a subtração de valores de conta corrente, mediante transferência ou saque bancários sem o consentimento do correntista; assim, a competência deve ser definida pelo lugar da agência em que mantida a conta lesada.

2. Inexiste conflito de atribuição quando o membro do Ministério Público opina pela declinação de competência e o Juízo não acata o pronunciamento; dest’arte, não oferecida a denúncia, em razão da incompetência do juízo, opera-se o denominado arquivamento indireto, competindo ao Juiz aplicar analogicamente o art. 28 do CPP, remetendo os autos à 2ª. Câmara de Coordenação e Revisão do MPF. Precedentes do STJ.

3. A hipótese igualmente não configura conflito de competência, ante a ausência de pronunciamento de uma das autoridades judiciárias sobre a sua competência para conhecer do mesmo fato criminoso.

4. Conflito de atribuição não conhecido.”

 (STJ, CAt n. 222/MG, 3.ª Seção, Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 16/05/2011; grifo nosso).

 

Nota-se pelo julgado cuja ementa encontra-se transcrita que, cuidando-se de furto qualificado, o foro competente deve ser o local em que ocorreu a subtração.

Sendo assim, com a devida vênia do Ilustre Suscitado, o locus commissi delicti é a Comarca de São José dos Campos, onde situada a agência responsável pela conta bancária da ofendida.

Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando que a atribuição para atuar nos autos incumbe ao Membro do Parquet acima referido.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, já que a presente decisão colide com sua opinio delicti, designa-se outro promotor de justiça para oficiar na causa, requerendo o que de direito.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 22 de abril de 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

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