Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 89.381/15

Autos n.º 0013114-65.2014.8.26.0050 – MM. Juízo da Vara Criminal e do Juizado Especial Criminal do Foro Regional de Itaquera

Suscitante: 3.º Promotor de Justiça Criminal de Itaquera

Suscitado: 81.º Promotor de Justiça Criminal da Capital

Assunto: divergência acerca do enquadramento legal dos fatos

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. CARACTERIZAÇÃO. CONTROVÉRSIA ACERCA DO ENQUADRAMENTO LEGAL DA CONDUTA, COM REFLEXO NA ATRIBUIÇÃO MINISTERIAL. SUJEITO QUE ARMAZENA RECIPIENTES CONTENDO GÁS NATURAL, EM CONDIÇÕES INADEQUADAS. CRIME AMBIENTAL (LEI 9.605/98, ART. 56) EM VEZ DE CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA (LEI N. 8.176/91, ART. 1.º, INCS. I E II). CONFRONTO ENTRE OS TIPOS PENAIS QUE REVELA, IN CASU, A PREVALÊNCIA DO PRIMEIRO, POR CONFIGURAR FORMAL E MATERIALMENTE A FIGURA TÍPICA PREVISTA NA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. ATRIBUIÇÃO DA PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL.

1.     O conflito de atribuição se dá, nos dizeres de HUGO NIGRO MAZZILLI, quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

2.     Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos. No caso em apreço, encontra-se devidamente configurado o incidente acima nominado.

3.     Com relação à controvérsia surgida nos autos, esta reside em determinar se a conduta perpetrada se subsume ao crime previsto no art. 56 da Lei n.° 9.605/98 ou no art. 1.° da Lei n.° 8.176/91.

4.     O primeiro se cuida do ato de “produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos”. O outro se consubstancia em “adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico, hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei” (inciso I) e “usar gás liquefeito de petróleo em motores de qualquer espécie, saunas, caldeiras e aquecimento de piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei” (inciso II).

5.     Nos planos formal e material, parece-nos que o ato corresponde ao crime ambiental supracitado. Isto porque, ficou registrado no auto de fiscalização, o sujeito armazenou recipientes contendo gás natural em condições inadequadas e, deste modo, expôs a perigo a saúde humana e o meio ambiente. O bem jurídico atingido, destarte, não foi a ordem econômica. O autor, ademais, não efetuou qualquer ato de aquisição, distribuição ou revenda ou fez uso do material irregular.

Solução: conhece-se deste incidente visando dirimi-lo, declarando competente para atuar no feito o Membro do Ministério Público oficiante junto ao MM. Juízo Comum.

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado visando à apuração da conduta perpetrada pelo representante legal da empresa (...), o qual foi autuado por infração administrativa pela ANP – Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.

Segundo se verificou no auto de fiscalização, foram encontrados, no interior do citado estabelecimento empresarial, recipientes contendo gás natural em inadequadas condições de armazenamento (fls. 15/18).

Concluídas as providências de polícia judiciária, o Douto Promotor de Justiça afirmou cuidar-se de infração contra a ordem econômica, capitulada na Lei n.º 8.176/91 e, por tal motivo, postulou o envio do procedimento ao Juizado Especial Criminal (fls. 210 e 214).

A Douta Promotora de Justiça oficiante junto ao Juizado Especial entendeu configurada a prática do delito previsto no art. 56 da Lei n.º 9.605/98 e, em consequência, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 217/218).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento da questão a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93.

Encontra-se configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A controvérsia surgida neste expediente cinge-se à correta subsunção, formal e material, dos fatos.

Os tipos penais invocados pelos Doutos Promotores de Justiça conflitantes são os seguintes:

a)    Pela Douta Suscitante, o art. 56 da Lei Ambiental:

 

Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”

 

b)    Pelo Ilustre Suscitado, o art. 1.º Lei n.º 8.176/91:

 

“Constitui crime contra a ordem econômica:

I - adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico, hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei;

II - usar gás liqüefeito de petróleo em motores de qualquer espécie, saunas, caldeiras e aquecimento de piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei.

Pena: detenção de um a cinco anos”

 

Trata-se, portanto, de saber se houve delito contra a ordem econômica ou crime contra o meio ambiente.

Nos planos formal e material, parece-nos que o ato corresponde ao crime ambiental supracitado.

Isto porque, ficou registrado no auto de fiscalização, o sujeito armazenou recipientes contendo gás natural em condições inadequadas e, deste modo, expôs a perigo a saúde humana e o meio ambiente.

Por todo o exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, a fim de declarar que a atribuição para atuar no feito incumbe ao Ilustre Representante Ministerial oficiante junto ao Juízo Comum.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, designo outro representante ministerial para intervir no procedimento, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n.º  302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n.º 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 30 de junho de 2015.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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