Conflito Negativo de Atribuição

 

Processo n.º 994.09.224163-9 (Tribunal de Justiça de São Paulo)

Autos n.º 2.116/09 – MM. Juízo do Juizado Especial Criminal da Comarca de São José dos Campos

Indiciada: (...)

Suscitante: Promotoria de Justiça do Juizado Especial de São José dos Campos

Suscitada: Promotoria de Justiça Criminal de São José dos Campos

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE PRATICADA ENTRE CÔNJUGES (CP, ART. 129, §9º). SUJEITO PASSIVO DO SEXO MASCULINO. POSSIBILIDADE. DISTINÇÃO ENTRE O TIPO PENAL DENOMINADO “VIOLÊNCIA DOMÉSTICA” E O CONCEITO PREVISTO NA LEI N. 11.340/06 (LEI MARIA DA PENHA). ATRIBUIÇÃO DA PROMOTORIA CRIMINAL (E NÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS), EM FACE DA PENA MÁXIMA COMINADA AO DELITO (TRÊS ANOS).

1.     A violência doméstica que constitui modalidade de lesão corporal não se confunde com aquela prevista na Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), cujo alcance é mais restrito. Esta é categórica quanto ao gênero do sujeito passivo, que somente pode pertencer ao sexo feminino.

2.     O crime do Código Penal, porém, pode ter como vítimas pessoas de ambos os sexos. Seu aperfeiçoamento requer a presença de algumas circunstâncias, dada a sua especialidade em relação ao tipo fundamental. São estas: a) a qualidade do sujeito passivo: ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda, b) o prevalecimento de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.

3.     Na hipótese concreta, é inegável que o fato ocorreu no âmbito das relações familiares, já que autora e vítima foram cônjuges.

4.     A pena máxima cominada à infração penal em tela (três anos), o que torna a matéria estranha à competência do Juizado Especial.

Solução: conflito dirimido para declarar que a atribuição para oficiar nos autos incumbe ao Douto Suscitado.

 

 

 

Cuida-se de conflito negativo de atribuição, em que os Doutos Promotores de Justiça Criminal em exercício no Juízo Comum e no Juizado Especial de São José dos Campos divergem acerca da responsabilidade de atuar no feito, que foi instaurado visando à apuração da conduta de (...), a qual, no dia 23 de abril de 2008, por volta das 22 horas e 10 minutos, teria agredido (...), produzindo-lhe lesões corporais de natureza leve, consoante o laudo pericial encartado a fls. 16.

O expediente tramitou, inicialmente, no âmbito da Vara Criminal, tendo o Douto Representante Ministerial vislumbrado a prática do crime tipificado no art. 129, caput, do CP, pelo que propôs seu encaminhamento ao Juizado Especial (fls. 40).

O Ilustre Membro do Parquet que o recebeu, discordando de tal entendimento, suscitou conflito de competência (fls. 50/51).

O MM. Juiz, a partir daí, enviou os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (fls. 52), o qual não conheceu da remessa, por se tratar de conflito de atribuição, remetendo-o, destarte, a esta Procuradoria Geral de Justiça, consoante o v. acórdão de fls. 67/69.

Eis a síntese do necessário.

A questão fundamental reside em saber se o comportamento atribuído à agente configura simples crime de lesão corporal, na modalidade simples (CP, art. 129, caput) ou violência doméstica (CP, art. 129, §9.º).

A solução desta quaestio requer seja definida, desde já, a esfera de proteção típica da norma penal insculpida no §9.º do dispositivo acima mencionado.

Pois bem. A violência doméstica que constitui modalidade de lesão corporal não se confunde com aquela prevista na Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), cujo alcance é mais restrito. Esta é categórica quanto ao gênero do sujeito passivo, que somente pode pertencer ao sexo feminino.

O crime do Código Penal, porém, pode ter como vítimas pessoas de ambos os sexos. Seu aperfeiçoamento requer a presença de algumas circunstâncias, dada a sua especialidade em relação ao tipo fundamental. São estas: a) a qualidade do sujeito passivo: ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda, b) o prevalecimento de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.

Na hipótese concreta, é inegável que o fato ocorreu no âmbito das relações familiares, já que autora e vítima foram cônjuges.

A pena máxima cominada à infração penal em tela (três anos), o que torna a matéria estranha à competência do Juizado Especial.

Diante do exposto, dirimo o presente conflito para declarar que a atribuição para oficiar nos autos compete ao Douto Suscitado.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, tendo em vista sua opinio delicti exarada a fls. 40, designo outro Representante Ministerial para atuar na causa, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria. Publique-se a ementa.

                                                     

       São Paulo, 12 de maio de 2010.

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

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