Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 11.517/16

Processo n.º 0006240-39.2015.8.26.0047 – MM. Vara do Juizado Especial Criminal da Comarca de Assis

Suscitante: 7.º Promotor de Justiça de Assis

Suscitado: 4.º Promotor de Justiça de Assis

Assunto: divergência sobre reunião de investigações relativas a fatos conexos

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DIVERGÊNCIA ACERCA DA ATRIBUIÇÃO PARA FORMAR A OPINIÃO DELITIVA COM RELAÇÃO AO CRIME DE LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR (CTB, ART. 303, CAPUT), CONEXO A DELITO DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (CTB, ART. 306, CAPUT), OBJETO DE ARQUIVAMENTO NA VARA DE ORIGEM. VÍNCULO PROCESSUAL RECONHECIDO, NOS TERMOS DO ART. 76, INC. III, DO CPP. REUNIÃO, PORÉM, INVIÁVEL, TENDO EM VISTA O ARQUIVAMENTO PRETERITAMENTE DETERMINADO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 82 DO CPP E DA SÚMULA 235 DO STJ. ATRIBUIÇÃO PARA APURAR O DELITO REMANESCENTE, QUE TEM NATUREZA DE INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO, AFETA AO DOUTO PROMOTOR OFICIANTE NO ÂMBITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.

1.      A questão central consiste em determinar se há conexão entre as infrações penais apuradas, e, em caso afirmativo, se deve ou não prevalecer a atribuição do promotor atuante originariamente.

2.      Não há dúvida acerca do vínculo citado, que se baseia no art. 76, inc. III, do CPP, in verbis: quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração”. A consequência natural, portanto, deveria ser a análise conjunta das condutas no juízo criminal comum, uma vez que a soma das penas máximas cominadas aos delitos previstos nos artigos 303 e 306 ultrapassa o patamar relativo ao Juizado Especial Criminal (análise que, a princípio, se verificou).

3.      Ocorre, todavia, que o arquivamento do caso em relação ao crime de embriaguez ao volante opera como obstáculo ao simultaneus processus, por aplicação analógica do art. 82 do CPP: “Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas”. De ver, ainda, o teor da Súmula n.º 235 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado”.

4.      Cumpre, destarte, ao membro atuante na esfera do Juizado Especial Criminal formar a opinião delitiva com respeito à infração remanescente, a qual se qualifica como de menor potencial ofensivo.

5.      De lembrar-se que: “O instituto da conexão, como se sabe, foi concebido para propiciar a economia processual, permitir uma visão mais abrangente dos fatos e evitar o conflito lógico entre julgados, o que, em tese, o qualifica como “fator de melhor aplicação jurisdicional do direito” (MARQUES, José Frederico, Elementos de Direito Processual Penal, vol. I, 2ª ed., Forense, 1965, n. 143, p. 272).

6.      Pondera-se, por fim, afigurar-se desnecessária a designação de outro membro do Parquet. Como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça: “a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo: Editora Verbatim, 2009. pág. 155; parêntese nosso).

Solução: dirime-se o presente conflito para declarar que a atribuição para atuar nos autos incumbe ao Douto Suscitante.

 

 

Cuida-se o presente de investigação criminal instaurada para apurar os crimes de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (CTB, art. 303, caput) e embriaguez ao volante (CTB, art. 306, caput), praticados, em tese, por (...).

Ao cabo das diligências de polícia judiciária, o Douto Promotor de Justiça requereu o arquivamento do feito em relação ao delito previsto no art. 306 do CTB. Quanto à conduta remanescente, dada a pena máxima a ela cominada, requereu a remessa de cópias dos autos ao Juizado Especial, por se tratar de infração de menor potencial ofensivo (fls. 43/44).

Os pleitos foram judicialmente deferidos (fl. 45).

O Ilustre Representante Ministerial atuante perante o JECRIM, por sua vez, entendeu que a despeito do arquivamento verificado, a conexão determinaria o processamento conjunto na Vara Criminal de origem, motivo por que requereu a redistribuição do feito à origem (fls.67/71).

A MM. Juíza, no entanto, considerou configurado um conflito negativo de atribuição e aplicou analogicamente o art. 28 do CPP (fls. 73/77).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento do caso a esta Chefia Institucional se assenta, em verdade, no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93.

Encontra-se configurado, como bem anotou a Digníssima Magistrada, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão se encontra com o Douto Suscitado, com a devida vênia do Ilustre Suscitante; senão, vejamos.

A questão central a ser analisada consiste em determinar se há conexão entre as infrações penais ocorridas, e, em caso afirmativo, se deve ou não prevalecer a atribuição do promotor atuante originariamente.

Não há dúvida alguma acerca do vínculo citado, que se baseia no art. 76, inc. III, do CPP, in verbis:

 

III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração”.

 

A consequência natural, portanto, deveria ser a análise conjunta das condutas no juízo criminal comum, uma vez que a soma das penas máximas cominadas aos delitos previstos nos artigos 303 e 306 ultrapassa o patamar relativo ao Juizado Especial Criminal.

Ocorre, todavia, que o arquivamento do feito em relação ao crime de embriaguez ao volante (judicialmente determinado a fl. 45) serve como obstáculo ao simultaneus processus, por aplicação analógica do art. 82 do CPP:

 

“Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas”.

 

De ver, ainda, o teor da Súmula n.º 235 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

“A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado”.

 

Lembre-se, ademais, que:

 

“O instituto da conexão, como se sabe, foi concebido para propiciar a economia processual, permitir uma visão mais abrangente dos fatos e evitar o conflito lógico entre julgados, o que, em tese, o qualifica como “fator de melhor aplicação jurisdicional do direito” (Cf. José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, vol. I, 2ª ed., Forense, 1965, n. 143, p. 272).

 

Assim, dirime-se o presente conflito para declarar que a atribuição para atuar nos autos incumbe ao Douto Suscitante.

Pondera-se, por fim, que se afigura desnecessária a designação de outro membro do Parquet.

Não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

 

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (REGIME JURÍDICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO PENAL. São Paulo: Editora Verbatim, 2009. pág. 155; parêntese nosso).

 

            Publique-se a ementa.

 

 

  

São Paulo, 29 de janeiro de 2016.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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