Conflito Negativo de Atribuição
Protocolado n.º
164.920/12
Autos n.º
761/12 – MM. Juízo da 6.ª Vara Criminal da Comarca de Santos
Suscitante:
Promotoria de Justiça Criminal de Santos
Suscitada: Promotoria
de Justiça Criminal de Santa Rosa de Viterbo
Assunto: divergência quanto ao local de
consumação dos delitos, com reflexo na atribuição funcional
EMENTA:
CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DELITOS DE AMEAÇA E LESÃO CORPORAL OU
CONTRAVENÇÃO DE VIAS DE FATO. VÍTIMA QUE NÃO SOUBE PRECISAR O LUGAR ONDE SE
DERAM OS FATOS. FORO COMPETENTE. LOCAL DA CONSUMAÇÃO INCERTO. DETERMINAÇÃO DA
COMPETÊNCIA TERRITORIAL EFETUADA COM BASE NO CRITÉRIO SUBSIDIÁRIO. DOMICÍLIO OU
RESIDÊNCIA DO RÉU (CPP, ART. 72).
1. Na hipótese vertente, não há como precisar o lugar
em que as infrações atingiram sua realização integral, pois o sujeito passivo
alegou desconhecer esta informação.
2. Com efeito, não se pode assegurar ter o summatum opus se operado em quaisquer
das Comarcas onde o procedimento tramitou. Em casos tais, o foro competente
deve ser determinado com base no art. 72 do CPP, segundo o qual: “Não sendo
conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou
residência do réu”. Nesse sentido, aliás, já se pronunciou o Egrégio Superior Tribunal de
Justiça: “Assiste razão ao juízo suscitante. Sendo incerto o local de
consumação do furto das mercadorias receptadas, define-se a competência para
processamento do feito pelo art. 72, caput,
do Código de Processo Penal, ou seja, o domicílio do réu, no caso a comarca de
Passa Quatro/MG” (CC nº 110.831/SP, Relator Ministro GILSON DIPP, 3ª Seção, j.
em 17.02.11).
3. A atribuição, portanto, deve
recair sobre o Membro Ministerial oficiante junto ao foro subsidiário, isto é,
a Comarca de Santa Rosa do Viterbo.
Solução: conflito conhecido e dirimido para declarar
que a atribuição de oficiar no procedimento compete ao Douto Suscitado.
Cuida-se o presente feito de conflito negativo de atribuição entre os Promotores de Justiça em exercício nas Comarcas de Santos e Santa Rosa do Viterbo, que divergem acerca do foro competente para apuração de crimes contra a pessoa.
O Douto Promotor de Justiça de Santa Rosa do Viterbo considerou que os fatos teriam ocorrido nos limites territoriais da Comarca de Santos, motivo pelo qual postulou a remessa do procedimento ao mencionado foro (fls. 13).
A Ilustre Representante Ministerial que o recebeu, discordando do posicionamento de seu antecessor, suscitou conflito negativo de atribuição, invocando o critério do art. 72 do CPP (fls. 16/18).
Eis a síntese do necessário.
Há de se sublinhar, preliminarmente, que o presente incidente assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.
Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.
Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal medida tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).
Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações, o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, de modo que não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe oficiar nos autos.
Pois bem.
Cremos que assiste razão à Douta Suscitante, com a devida vênia do Ilustre Suscitado.
O inquérito policial busca apurar suposto crime de ameaça (CP, art. 147) e possível delito de lesão corporal dolosa leve (CP, art. 129, caput) ou contravenção penal de vias de fato (LCP, art. 21).
Em breve síntese, a ofendida noticiou que foi agredida por seu ex-namorado quando se recusou a permitir que ele, por estar embriagado, assumisse a direção do veículo automotor no qual se encontravam, inicialmente apertando seus braços; depois, teria tentado enforcá-la, golpeando-a, por fim, com o cotovelo.
Disse a vítima, entretanto, não saber precisar o locus commissi delicti.
Relatou, ainda, que o agente a ameaçou.
Em face deste cenário, o envio à Comarca de Santos mostrou-se injustificado.
Não há qualquer traço probatório hábil a revelar que os
fatos se deram
Cremos, em verdade, que a causa deve ficar sob os cuidados do Promotor de Santa Rosa do Viterbo.
Isto porque não se precisou a localidade em que os delitos atingiram sua realização integral, haja vista as declarações do sujeito passivo.
Em casos tais, o foro
competente deve ser determinado com base no art. 72 do CPP, segundo o qual:
“Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu”.
Nesse
sentido, aliás, já se pronunciou o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
“Assiste razão ao juízo suscitante.
Sendo incerto o local de consumação do furto das mercadorias receptadas,
define-se a competência para processamento do feito pelo art. 72, caput, do Código de Processo Penal, ou
seja, o domicílio do réu, no caso a comarca de Passa Quatro/MG”
(CC nº 110.831/SP, Relator Ministro
GILSON DIPP, 3ª Seção, j. em 17.02.11).
A atribuição, portanto, deve recair sobre o Membro Ministerial oficiante junto ao foro subsidiário, isto é, a Comarca de Santa Rosa do Viterbo.
Diante
do exposto, conhece-se do presente conflito, dirimindo-se-o, para declarar
competir ao Ilustre Suscitado a incumbência de intervir no feito.
A designação de outro Representante Ministerial afigura-se desnecessária, pois não se vislumbra qualquer menoscabo ao princípio da independência funcional.
Como bem pondera PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN,
examinando questões semelhantes à que ora se analisa:
“a exclusão de ambos (os Promotores
de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa
modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma
das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do
promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso
em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é
irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação
unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há
incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para
a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma
promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é
inviável” (REGIME JURÍDICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO PENAL, São Paulo,
Editora Verbatim, 2009, pág. 155); parêntese nosso.
Cumpra-se. Publique-se a ementa.
São Paulo, 13 de novembro de 2012.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
/aeal