Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n. 152.098/13

Autos n. 7.933/13 - MM. Juízo da Vara do Juizado Especial Criminal do Foro Central da Comarca da Capital

Suscitante: Promotoria de Justiça do Juizado Especial Criminal Central da Capital

Suscitada: 1.ª Promotoria de Justiça Criminal Central da Capital

Assunto: divergência quanto ao enquadramento dos fatos com reflexo na atribuição funcional

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR AGRAVADA (CTB, ART. 303, PAR. ÚNICO). VÍTIMA COLHIDA AO ATRAVESSAR A FAIXA DE PEDESTRES. EXASPERANTE CONFIGURADA. INCOMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. ATRIBUIÇÃO AFETA AO DOUTO SUSCITADO.

1. O crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, tipificado no art. 303 do CTB, constitui infração de pequeno potencial ofensivo (CF, art. 98, I e Lei n. 9.099/95, art. 61), pois sua pena máxima é de dois anos de detenção.

2. Na hipótese de se verificarem quaisquer das circunstâncias previstas no parágrafo único da disposição legal que remete às causas de aumento de pena do homicídio culposo de trânsito (CTB, art. 302, parágrafo único), o teto punitivo extravasa o patamar previsto na Lei dos Juizados Especiais, tornando este órgão materialmente incompetente. No caso concreto, a ofendida atravessava a via pública na faixa de pedestres. Por esse motivo, o dever funcional de examinar a causa incumbe à Douta Suscitada.

Solução: conhece-se do conflito, a fim de dirimi-lo e declarar que a atribuição para oficiar no procedimento cumpre à Ilustre Representante Ministerial em exercício no MM. Juízo Comum.

 

 

Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração da suposta prática do crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (CTB, art. 303) cometido, em tese, por (...) em face de (...), no dia 06 de junho de 2011, quando a atropelou enquanto ela atravessava a faixa de pedestres, provocando-lhe lesões corporais de natureza grave (consoante o exame pericial encartado a fl. 07).

A Douta Promotora de Justiça Criminal, recebendo o procedimento, entendeu perpetrado delito de menor potencial ofensivo, pugnando por seu encaminhamento ao Juizado Especial (fl. 48 verso).

A Ilustre Representante Ministerial nele oficiante, de sua parte, vislumbrando na causa a infração descrita no art. 303, parágrafo único, c.c. art. 302, parágrafo único, II, ambos do CTB, resultando em pena superior a dois anos, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 52/54).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento do expediente a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão se encontra com a Douta Suscitante, com a devida vênia da Ilustre Suscitada.

Isto porque os elementos informativos carreados revelam que, na data e local anteriormente mencionados, a ofendida foi atropelada quando atravessava a via pública sobre a faixa de pedestres (consoante depoimento de fl. 04 e BO/PM juntado a fls. 42/44).

Nestes termos, há de prevalecer o enquadramento legal vislumbrado pela Ínclita Representante Ministerial do JECRIM, haja vista que, dentre os motivos de majoração de pena aplicáveis à lesão corporal culposa de trânsito, encontra-se o fato de “praticá-la em faixa de pedestres ou na calçada” (inciso II do parágrafo único do art. 302 do CTB).

Destaque-se que doutrina e jurisprudência firmaram entendimento no sentido de que as causas de aumento de pena devem ser consideradas em conjunto com a sanção prevista em abstrato para se verificar a possibilidade de aplicação dos institutos da Lei n. 9.099/95.

Bem por isso, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça aprovaram Súmulas vedando a suspensão condicional do processo em casos de concurso de crimes em que a pena mínima, em abstrato, exceda um ano (Súmulas n. 723 do STF e 243 do STJ). O mesmo raciocínio há de ser adotado em relação ao conceito de infração de menor potencial ofensivo.

Nesse sentido, já decidiu a Procuradoria-Geral de Justiça, conforme se nota, entre outros, no Protocolado n.º 20.546/10- PGJ/SP, cuja ementa se transcreve:

 

“EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR (CTB, ART. 303). INFRAÇÃO PENAL DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO, SALVO QUANDO PRESENTE ALGUMA DAS CIRCUNSTÂNCIAS LEGAIS DE AUMENTO DE PENA, FUNDADAS NO PARÁGRAFO ÚNICO DA DISPOSIÇÃO. VÍTIMA COLHIDA QUANDO ATRAVESSAVA A FAIXA DE PEDESTRES. EXASPERANTE CONFIGURADA. INCOMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. ATRIBUIÇÃO AFETA AO DOUTO SUSCITADO.

1. O crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, tipificado no art. 303 do CTB, constitui infração de pequeno potencial ofensivo (CF, art. 98, I e Lei n. 9.099/95, art. 61), já que sua pena máxima é de dois anos de detenção.

2. Na hipótese de se verificarem quaisquer das circunstâncias previstas no parágrafo único da disposição legal, que remete às causas de aumento de pena do homicídio culposo de trânsito (CTB, art. 302, par. ún.), o teto punitivo extravasa o patamar previsto na Lei dos Juizados Especiais, tornando este órgão materialmente incompetente. No caso concreto, a ofendida atravessava a via pública na faixa de pedestres. Por esse motivo, o dever funcional de examinar a causa incumbe ao Douto Suscitado.

Solução: conflito dirimido para declarar que a atribuição para oficiar no procedimento cumpre à 2.ª Promotoria de Justiça Criminal da Capital”.

 

Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, atribuindo o dever funcional de oficiar nos autos à Ilustre Suscitada.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, designa-se outro Representante Ministerial para atuar na causa, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

 

São Paulo, 07 de outubro de 2013.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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