Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n. 178.991/12

Autos n. 1.005/12 – MM. Juízo da 3.ª Vara Criminal da Comarca de Santo André

Suscitante: Promotoria de Justiça Criminal de Santo André

Suscitadas: 5.ª Promotoria de Justiça Criminal do Foro Central da Capital

Assunto: foro competente para apuração de delito de duplicata simulada

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DUPLICATA SIMULADA (CP, ART. 172). CRIME FORMAL. DELITO QUE SE CONSUMA COM A EMISSÃO DO TÍTULO, ENTENDIDA COMO O LOCAL EM QUE A CÁRTULA É POSTA EM CIRCULAÇÃO (SENTIDO NORMATIVO DA CONDUTA NUCLEAR). O FORO COMPETENTE, PORTANTO, É O LOCAL EM QUE O DOCUMENTO FOI APRESENTADO A DESCONTO BANCÁRIO, OU SEJA, AQUELE EM QUE ATUA O DOUTO SUSCITADO.

1.      O crime de duplicata simulada dá-se quando o agente “Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado”.

2.      O conceito de emissão não deve ser interpretado de maneira puramente objetiva, como se fora sinônimo de elaborar um documento, em papel, e entregá-lo a outrem. O sentido da conduta é normativo e compreende o ato de por em circulação, materializado nos autos por meio da apresentação do documento para desconto na instituição financeira.

3.      A summatum opus, portanto, deu-se no território correspondente à Comarca em que oficia o competente Suscitado, sendo este o locus commissi delicti, nos termos do art. 70 do CPP. Nesse sentido, inclusive, a orientação sufragada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ, RHC n. 16.053, rel. Ministro PAULO MEDINA, DJU de 12/09/2005, p. 368).

Solução: conhece-se do presente conflito para dirimi-lo e declarar que a atribuição para oficiar nos autos incumbe ao Douto Suscitado.

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado visando à apuração da conduta dos representantes legais da pessoa jurídica denominada “(...)”, pois, em tese, teriam emitido duas duplicatas em face da “IGREJA (...)” sem o devido lastro, em operações de prestação de serviços.

Os títulos de crédito foram repassados às seguintes instituições financeiras: “BANCO (...)” e “BANCO (...)”, as quais os levaram a protesto.

Concluídas as providências de polícia judiciária, o Ilustre Representante Ministerial inicialmente oficiante pugnou pelo envio do procedimento à Promotoria de Justiça de Repressão à Sonegação Fiscal (fl. 247, verso).

O Douto Membro do Parquet que o recebeu, por sua vez, vislumbrando cometido o delito de duplicata simulada (CP, art. 172), consumado em Santo André, onde sediada a empresa, requereu a remessa da causa a tal Comarca (fls. 250/251).

A Ilustre Promotora de Justiça nela atuante, discordando do posicionamento de seu antecessor, por considerar ter a realização integral do ilícito se operado na Capital, suscitou conflito negativo de atribuição em face do primeiro Órgão Ministerial (fls. 267/268).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que a vinda da questão a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações, o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, de modo que não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe o dever de oficiar nos autos.

Pois bem.

Excluída a imputação de crime contra a ordem tributária, a questão fundamental a ser analisada consiste em definir qual o momento consumativo da infração penal descrita no art. 172 do CP.

Há, como se sabe, divergência a respeito do assunto. A orientação majoritária, no entanto, caminha no sentido de que a efetiva emissão da cártula não se dá com o mero preenchimento, mas no instante em que esta é posta em circulação.

         Confira-se, nesse linha, precedente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

“PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DUPLICATA SIMULADA. ART. 172 DO CÓDIGO PENAL. CRIME FORMAL E UNISSUBSISTENTE. COMPETÊNCIA QUE SE DEFINE PELO LOCUS DELICTI. COMPETENTE A COMARCA ONDE OS DOCUMENTOS FORAM POSTOS INICIALMENTE EM CIRCULAÇÃO, INDEPENDENTE DO LOCAL DE OCORRÊNCIA DO PREJUÍZO. RECURSO PROVIDO.

O habeas corpus é ação constitucional adequada à obstar coação ilegal quando quem a ordenar não tiver competência para fazê-lo (art. 648, inciso III, do CPP).

A consumação do delito previsto no art. 172 do CP, crime formal e unissubsistente, dá-se com a simples e efetiva colocação da duplicata em circulação, independentemente do prejuízo.

Demonstrado que a emissão dos títulos de crédito foi efetuada na cidade Franca/SP, consoante documentos acostados aos autos, a competência para o processamento e julgamento do feito é do Juízo Comum Estadual daquela Comarca, lugar em que ocorrida a infração”.

(STJ, RHC n. 16.053, rel. Ministro PAULO MEDINA, DJU de 12/09/2005, p. 368; grifo nosso).

 

No caso em tela, os documentos foram colocados em circulação na Comarca da Capital, onde levados para serem cobrados, depois de entregues pelos representantes legais da empresa “PULSAR” ao “BANCO (...)”, agência situada à Av. Brigadeiro Faria Lima, n. 3.729 (fl. 19), e também ao “BANCO (...)”, agência localizada à Av. Paulista, n. 923 (fls. 20 e 21), ambos em São Paulo.

O locus commissi delicti, destarte, nos termos do art. 70 do CPP, é o foro perante o qual atua o Douto Suscitado, vale dizer, o competente Promotor de Justiça Criminal da Capital.

Diante do exposto, conhece-se do presente conflito para dirimi-lo, declarando incumbir a ele a atribuição para atuar no feito.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, designo outro representante ministerial para oficiar nos autos.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 10 de dezembro de 2012.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

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