Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n. 24.170/14

Autos n. 9.748/13 – MM. Juízo da Vara do Juizado Especial Criminal do Foro Central da Capital

Suscitante: Promotoria de Justiça do Juizado Especial Criminal Central da Capital

Suscitada: 2.ª Promotoria de Justiça Criminal Central da Capital

Assunto: critério para aferição da competência do Juizado Especial Criminal quando há multa alternativamente cominada

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. PROMOTORAS DE JUSTIÇA EM EXERCÍCIO PERANTE O JUÍZO COMUM E O JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. HIPÓTESE EM QUE SE APURA A PRÁTICA DE DELITO CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO (ART. 7.º, II, DA LEI N. 8.137/90). PARÂMETRO DEFINIDOR DA COMPETÊNCIA DO JECRIM BASEADA NA PENA MÁXIMA COMINADA À INFRAÇÃO. DELITO APENADO COM DETENÇÃO, DE DOIS A CINCO ANOS, OU MULTA. PENA PECUNIÁRIA ALTERNATIVAMENTE COMINADA. IRRELEVÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE ILÍCITO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. ATRIBUIÇÃO DO ILUSTRE REPRESENTANTE MINISTERIAL OFICIANTE PERANTE O JUÍZO COMUM.

1. Cuida-se de procedimento instaurado para apurar a suposta prática de delito contra as relações de consumo, tipificado no art. 7.º, II, da Lei n. 8.137/90.

2. O parâmetro definidor da competência do Juizado Especial Criminal reside na pena máxima cominada ao delito. O preceito secundário do art. 7.º da Lei n. 8.137/90, conduta típica imputada aos indiciados, é apenado com detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa. A sanção pecuniária revela-se como sendo a pena mínima imposta ao fato, sendo o teto punitivo os cinco anos de detenção referidos na norma. Não há falar-se, portanto, em infração de menor potencial ofensivo.

3. Nesse sentido, a tranquila jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (R.Esp. n. 968.766/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, 5.ª TURMA, julgado em 10/09/2009, DJe de 28/09/2009; grifo nosso).

Solução: conhece-se da remessa para declarar que a atribuição para atuar no feito recai sobre o Douto Membro do Ministério Público oficiante junto ao MM. Juízo Comum.

 

Cuida-se de procedimento instaurado para apurar a suposta prática de delito contra as relações de consumo, tipificado no art. 7.º, II, da Lei n. 8.137/90, cometido, em tese, pelos representantes legais da pessoa jurídica denominada (...).

Concluídas as providências de polícia judiciária, o expediente foi remetido à Douta Promotora de Justiça Criminal, a qual, ponderando subsumir-se a conduta a tipo penal com cominação alternativa de multa, tornando o fato, portanto, infração de pequeno potencial ofensivo, requereu seu envio ao Juizado Especial (fls. 33/34).

A Ilustre Representante do Ministério Público destinatária, contudo, discordou do ponto de vista de sua antecessora e, destacando que o parâmetro para aferição da competência do citado órgão judicial é a pena máxima, que, nesse caso, excede o limite previsto no art. 61 da Lei n. 9.099/95, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 47/51).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento da questão a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, não lhe cumprindo determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

Parece-nos que assiste razão à Ilustre Suscitada, com a devida vênia da Douta Suscitante.

Isto porque o parâmetro definidor da competência do Juizado Especial Criminal reside na pena máxima cominada ao delito.

O preceito secundário do art. 7.º da Lei n. 8.137/90, conduta típica imputada aos indiciados, é apenado com detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.

A sanção pecuniária revela-se, com meridiana clareza, como sendo a pena mínima imposta ao fato, sendo o teto punitivo os cinco anos de detenção referidos na norma.

Não há falar-se, portanto, em infração de menor potencial ofensivo.

Nesse sentido, a tranquila jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

“RECURSO ESPECIAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUPERIOR A 2 (DOIS) ANOS. PENA ALTERNATIVA DE MULTA. IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO PRETÓRIO EXCELSO. RECURSO PROVIDO.

1. O advento da Lei n.º 11.313/2006 veio consolidar entendimento pacificado neste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que se considera crime de menor potencial ofensivo aquele cuja pena máxima não exceda o limite de 2 (dois) anos.

2. No caso, a pena máxima abstratamente cominada ao delito é de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de detenção. E, apesar da previsão de pena alternativa de multa, o critério eleito pelo legislador para definir se a infração reveste-se de menor gravidade e, portanto, se ao Indiciado podem ser oferecidos os benefícios da Lei n.º 9.099/95, é exatamente o quantum máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada.

3. Recurso provido”.

(STJ, R.Esp. n. 968.766/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, 5.ª TURMA, julgado em 10/09/2009, DJe de 28/09/2009; grifo nosso).

 

Diante disso, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando incumbir ao Ilustre Membro do Ministério Público oficiante junto ao MM. Juízo Comum o dever de atuar no caso. Revela-se desnecessária, outrossim, a designação de outro Representante Ministerial.

Isto porque, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

 

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime Jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo, Editora Verbatim, 2009, pág. 155; parêntese nosso).

Publique-se a ementa.

São Paulo, 14 de fevereiro de 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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