Conflito Negativo de Atribuição
Protocolado n.
53.699/13
Autos n.
341/13 – MM. Juízo da 2.ª Vara Criminal da Comarca de Jacareí
Suscitante: 1.º Promotor de Justiça de Jacareí
Suscitados: 3.º
Promotor de Justiça de Arujá e 12.º Promotor de Justiça de São José dos Campos
Assunto: divergência
quanto ao foro competente para apuração de roubo agravado, com reflexo na
atribuição funcional
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. CONTROVÉRSIA
ACERCA DO FORO COMPETENTE PARA APURAÇÃO DE ROUBO AGRAVADO PELO CONCURSO DE
AGENTES, EMPREGO DE ARMA E PRIVAÇÃO DE LIBERDADE DO SUJEITO PASSIVO (CP, ART.
157, §2º, I, II E V). MODALIDADE DE CRIME PERMANENTE, CUJA CONSUMAÇÃO SE
PROLONGA NO TEMPO, PERSISTINDO ENQUANTO A VÍTIMA CONTINUAR EM PODER DOS
AGENTES. COMPETÊNCIA FIRMADA PELA PREVENÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 71 DO CPP.
ATRIBUIÇÃO DO REPRESENTANTE MINISTERIAL INICIALMENTE OFICIANTE NA CAUSA.
1. Cuida-se de inquérito policial instaurado para
apurar a prática do delito de roubo agravado pelo concurso de agentes, emprego
de arma e privação de liberdade do sujeito passivo.
2. O procedimento investigatório retrata modalidade de
crime permanente, em decorrência da incidência da causa de aumento de pena
consistente na privação da liberdade do sujeito passivo.
3. Nesta forma, o roubo adquire feições de delito cuja
realização integral se prolonga no tempo, de tal modo que, enquanto a vítima
continuar em poder dos suspeitos, a fase consumativa perdura.
4. De aplicar-se à espécie, portanto, o disposto no
art. 71 do CPP. Consoante a norma legal indicada, em matéria de infrações
permanentes, cujo summatum opus atingiu
mais de um foro, firma-se a competência territorial pela prevenção. In casu, o juízo prevento, nos termos do
art. 83 do CPP, é, sem dúvida, aquele em que atua o Douto Promotor inicialmente
oficiante na causa. Nesse sentido: STJ, CC 88617, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO, DJU de
Solução: Conhece-se deste
incidente para dirimi-lo, a fim de declarar que a atribuição para oficiar nos
autos incumbe ao Ilustre Promotor de Justiça de Arujá, afigurando-se
desnecessária a designação de outro Representante Ministerial.
Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar a prática do delito de roubo agravado pelo concurso de agentes, emprego de arma e privação de liberdade do sujeito passivo (CP, art. 157, §2º, I, II e V) cometido, em tese, por (...), (...) e outras pessoas não identificadas.
Na hipótese vertente, os increpados abordaram (...) quando este, conduzindo caminhão, estacionou em um posto de serviços na Rodovia Presidente Dutra (possivelmente situado em Jacareí).
Os criminosos o mantiveram em seu poder por tempo juridicamente relevante, libertando-o na Comarca de Arujá, onde o ofendido comunicou o caso à Polícia.
Concluídas as providências investigatórias, o Douto Promotor de Justiça de Arujá, considerando que os fatos teriam ocorrido nos limites territoriais das Comarcas de São José dos Campos e Jacareí, requereu o envio do feito à primeira (fls. 222).
O Ilustre Membro do Parquet joseense discordou da providência, propugnando a remessa do expediente à Comarca de Jacareí, onde localizado o posto de serviços referido pelo sujeito passivo, lugar de sua abordagem (fls. 230/231).
O Nobre Órgão Ministerial a quem a causa foi direcionada, porém, imputou o dever de formar a opinião delitiva ao Promotor de Arujá, por acreditar estar-se diante de crime permanente, tendo o juízo de origem firmado sua competência pela prevenção, nos termos do art. 71 do CPP. Suscitou, em face disto, conflito negativo de atribuição (fls. 237/240).
Eis a síntese do necessário.
Há de se sublinhar, preliminarmente, que o presente incidente assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.
Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.
Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal medida tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).
Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, não lhe cumprindo determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.
Pois bem.
Cremos que assiste razão ao Douto Suscitante, com a devida vênia dos Ilustres Suscitados.
O procedimento investigatório retrata, como bem alertou, modalidade de crime permanente, em decorrência da incidência da causa de aumento de pena consistente na privação da liberdade do sujeito passivo.
Nesta forma, o roubo adquire feições de delito cuja realização integral se prolonga no tempo, de tal modo que, enquanto a vítima continuar em poder dos agentes, a fase consumativa ainda perdura.
De aplicar-se à espécie, portanto, o disposto no art. 71 do CPP.
Consoante a norma legal indicada, em matéria de infrações permanentes, cujo summatum opus atingiu mais de um foro, firma-se a competência territorial pela prevenção.
In casu, o juízo prevento, nos termos do art. 83 do CPP, é, sem dúvida, aquele em que atua o Douto Promotor de Justiça de Arujá. Nesse sentido:
“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL E
PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. RECEPTAÇÃO,
NA MODALIDADE CONDUZIR OU TRANSPORTAR (CAMINHÃO), E FORMAÇÃO DE QUADRILHA.
CRIMES PERMANENTES COMETIDOS
1. Na hipótese, o crime de receptação, praticado na modalidade de conduzir ou transportar o bem subtraído do seu proprietário, no caso, um caminhão, adquirindo assim a qualidade de permanente, e o de quadrilha (que já detém essa característica) ocorreram em mais de um Estado da Federação. Nesses casos, havendo Magistrados de igual jurisdição e não sendo possível escolher pela gravidade do crime ou pelo número de infrações, a competência deve ser fixada pela prevenção. Precedentes do STJ.
2. Conhece-se do conflito, para declarar a competência do Juízo de Direito da Vara Criminal de Inquéritos Policiais de Belo Horizonte/MG, o suscitado”.
(STJ, CC 88617, rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJU de
De ver, ainda, o seguinte julgado, sufragando a
mesma tese:
“CONFLITO NEGATIVO - Formação de quadrilha: roubos e recepção de
carga - Crimes ocorridos
(TJSP, Câmara Especial, CONFLITO
DE JURISDIÇÃO n. 151.925-0/9-00, da Comarca de SÃO PEDRO, rel. Des. Maria
Olivia Alves, j. em
Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, a fim de declarar que a atribuição para oficiar nos autos incumbe ao Ilustre Promotor de Justiça de Arujá.
A designação de outro Representante Ministerial, na hipótese vertente, afigura-se desnecessária, por não se vislumbrar qualquer menoscabo ao princípio da independência funcional.
Como bem pondera PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN,
examinando conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça: “a exclusão de ambos (os
Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque
essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a
uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do
promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso
em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é
irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação
unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há
incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento
anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma
antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime Jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo,
Editora Verbatim, 2009, pág. 155); parêntese nosso.
São Paulo, 16 de abril de 2013.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
/aeal