Conflito Negativo de Atribuição

Processo n.º 0126247-75.2013.8.26.0000

Autos nº 192/12 – MM. Juízo da Vara do Juizado Especial Criminal da Comarca de Valinhos

Suscitante: Promotoria de Justiça Criminal de Valinhos

Suscitada: Promotoria de Justiça Criminal de Campinas

Assunto: foro competente para apuração de delito de desobediência

 

“EMENTA. CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DIVERGÊNCIA ACERCA DA COMPETÊNCIA PARA APURAR CRIME DE DESOBEDIÊNCIA (CP, ART. 330), PERPETRADO POR DUAS VEZES. DELITO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO, A SER INVESTIGADO PELO JUIZADO ESPECIAL, NO LUGAR ONDE PRATICADO. ATO REALIZADO EM CAMPINAS, ONDE SEDIADA A UNIDADE DISPENSADORA QUE DEVERIA FORNECER O LEITE HIDROLISADO À CRIANÇA, INCUMBINDO AO PROMOTOR DE JUSTIÇA ATUANTE EM TAL COMARCA A RESPONSABILIDADE DE INTERVIR NO CASO.

1. O presente procedimento foi instaurado para apurar o cometimento, por duas vezes, do crime de desobediência (CP, art. 330). O Douto Promotor de Justiça de Campinas atribuiu ao colega oficiante em Valinhos a atribuição para atuar no feito, postulando o encaminhamento do expediente. O Ilustre Representante Ministerial que o recebeu, discordando do posicionamento de seu antecessor, requereu exitosamente fosse suscitado conflito de competência.

2. A Colenda Câmara Especial do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, destacando não haver denúncia oferecida, deixou de conhecer do incidente, remetendo a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça.

3. O crime de desobediência constitui infração de menor potencial ofensivo, tendo em vista o teto punitivo previsto no preceito secundário do art. 330 do CP. É competente para o exame da causa, portanto, o Juizado Especial Criminal.

4. Definida a competência ratione materiae, cumpre estabelecê-la segundo o critério territorial. A Lei n. 9.099/95 determina, em seu art. 63, que o foro competente será o lugar em que o delito for praticado. Trata-se, segundo orientação prevalente, do local em que a conduta, ou seja, a ação ou a omissão se realizou.

5. O tipo penal em tese violado contém a seguinte descrição: “Desobedecer a ordem legal de funcionário público”. O ato consubstancia-se no descumprimento de determinação respaldada em lei, oriunda de funcionário público, conceito em que o Magistrado pode ser inserido, ex vi do art. 327 do CP.

6. Importa verificar, destarte, o locus em que se deu a recusa da entrega dos produtos devidos, e, conforme resultou claro dos autos, tal se passou em Campinas, onde sediada a Unidade Dispensadora que forneceria o leite hidrolisado à criança.

Solução: conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando que a atribuição para intervir na causa incumbe ao Ilustre Suscitado.

 

O presente procedimento foi instaurado para apurar o cometimento, por duas vezes, do crime de desobediência (CP, art. 330), diante do descumprimento de determinação emanada pelo MM. Juízo da 11.ª Vara da Fazenda Pública Central da Capital, nos autos do Processo n.º 0105694-52.2007.8.26.0053, ordenando o fornecimento de leite hidrolisado “Neocate” a (...).

O Douto Promotor de Justiça de Campinas atribuiu ao colega oficiante em Valinhos a atribuição para atuar no feito, postulando o encaminhamento do expediente (fl. 09).

O Ilustre Representante Ministerial que o recebeu, discordando do posicionamento de seu antecessor, requereu fosse suscitado conflito de competência (fls. 14/15), pleito este deferido (fls. 02/03).

A Colenda Câmara Especial do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, em acórdão relatado pelo Eminente Desembargador CAMARGO ARANHA FILHO, não conheceu do incidente, remetendo a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 38/44).

É a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que se encontra devidamente configurado o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça, como explanado pela Augusta Corte Bandeirante.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

Em que pesem as ponderações do Ilustre Suscitante, a razão se encontra com o Douto Suscitado.

Como se sabe, o crime de desobediência constitui infração de menor potencial ofensivo, tendo em vista o teto punitivo previsto no preceito secundário do art. 330 do CP.

É competente para o exame da causa, portanto, o Juizado Especial Criminal.

Definida a competência ratione materiae, cumpre estabelecê-la segundo o critério territorial.

A Lei n. 9.099/95 determina, em seu art. 63, que o foro competente será o lugar em que o delito for praticado. Trata-se, segundo orientação prevalente, do local em que a conduta, ou seja, a ação ou a omissão se realizou.

O tipo penal em tese violado contém a seguinte descrição: “Desobedecer a ordem legal de funcionário público”. O ato consubstancia-se no descumprimento de determinação respaldada em lei, oriunda de funcionário público, conceito em que o Magistrado pode ser inserido, ex vi do art. 327 do CP.

Importa verificar, destarte, o locus em que se deu a recusa da entrega dos produtos devidos, e, conforme resultou claro dos autos, tal se passou em Campinas, onde sediada a Unidade Dispensadora que forneceria o leite hidrolisado à criança (fls. 02/04 e 13).

Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando que a atribuição para intervir na causa incumbe ao Ilustre Suscitado, sendo desnecessário designar outro Membro para tanto.

Não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime Jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo, Editora Verbatim, 2009, pág. 155, parêntese nosso).

 

Publique-se a ementa.

São Paulo, 06 de fevereiro de 2014.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

/aeal