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Capa: atendimento por funcionário de distribuidor de medicamentos

Fraudes em Licitações e Contratos

Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça
de Defesa do Patrimônio Público e Social – CAO-PP

Sumário


Prefácio

As licitações no Brasil movimentam cerca de 700 bilhões de reais, representando 20% do PIB. Sua importância no ordenamento jurídico nacional é incontestável tendo em vista que o instituto tem status normativo constitucional: o inciso XXI do art. 37 da Constituição de 1988 a erige como uma das regras básicas da Administração Pública. A Lei n. 8.666, de 1993, foi editada para atribuir maiores níveis de eficiência e moralidade nas licitações e contratações administrativas, e não obstante é alto o índice de fraudes nesse campo como se percebe da atuação dos órgãos de controle.

Tarefa do Ministério Público como um dos principais protagonistas na luta por um governo honesto é se preparar adequadamente para o desempenho firme, profissional e objetivo dessa atuação.

A correta realização de negócios públicos é ponto de partida para a construção de um Estado que atenda aos objetivos fundamentais da República, uma vez que eles viabilizam em obras, serviços, compras, fornecimentos uma sociedade justa e solidária, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades, e a promoção do bem geral. Sem a rígida fidelidade ao compromisso com a ética de nada adiantam os resultados, até porque as fraudes inviabilizam, diminuem e retardam seu alcance.

O Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social cumpre seu papel com a elaboração deste livro cujo objetivo é o fornecimento de instrumental para o enfrentamento de fraudes em licitações e contratos administrativos.

A obra tem um perfil eminentemente prático indicando o percurso da investigação e apreciando as situações mais comuns como a preterição da licitação, o fracionamento ilícito do objeto, o superfaturamento, o direcionamento e as cláusulas restritivas, os cartéis, e as principais ilicitudes na execução dos contratos, entre outros assuntos que têm a indicação da legislação aplicável e a menção às contribuições doutrinárias e aos entendimentos dos tribunais, inclusive os de Contas.

Esta fértil iniciativa do Centro de Apoio Operacional, coordenado pelo Doutor Tiago Cintra Zarif, Procurador de Justiça, é meritória, assim como a colaboração dos ilustres colegas que nomino, agradecendo antecipadamente ao empenho e à dedicação em prol do interesse público: a Procuradora de Justiça Doutora Evelise Pedroso Teixeira Prado Vieira e os Promotores de Justiça Doutores André Vitor de Freitas, Arthur Pinto de Lemos Júnior, Ernani de Menezes Vilhena Júnior, Rita de Cassia Bergamo, Beatriz Lopes de Oliveira e Dênis Fábio Marsola – estes dois últimos, Assessores do Centro de Apoio Operacional – que, com seus conhecimentos e a sua experiência, disponibilizam potente arsenal para a diuturna execução do ofício de Ministério Público na senda da defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa.

Márcio Fernando Elias Rosa - Procurador-Geral de Justiça
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Apresentação

O Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social do Ministério Público do Estado de São Paulo (CAOPP) apresenta o resultado do estudo conjunto de inúmeros Promotores e Procuradores de Justiça que atuam nesta área e também na área criminal, em matérias que guardam relação com a defesa do patrimônio público e da probidade administrativa.
O material apresentado integra a publicação que ora denominamos “Temas de Patrimônio Público”, sendo o primeiro volume alusivo a “Fraudes em Licitações e Contratos”.

A escolha do tema que compõe este primeiro volume foi feita após a análise do registro da demanda apresentada ao CAOPP por membros de todas as regiões do Estado. Decorreu da exposição de dúvidas, solicitações de apoio e de material necessário à atuação diária nas respectivas comarcas, que chegam ao CAOPP por diversos meios, mas, principalmente, por ligações telefônicas tendentes a encontrar postura eficaz na condução de Inquéritos Civis e Ações Civis Públicas em trâmite na área de Patrimônio Público.

Objetivando dar resposta satisfatória a esta demanda deliberou-se pela elaboração deste material, com distribuição a todos os membros do Ministério Público do Estado de São Paulo, iniciativa esta que contou com o integral apoio da Procuradoria-Geral de Justiça.

Esta iniciativa encontra fundamento nas funções institucionais do Centro de Apoio Operacional, estabelecidas pela Lei Federal nº 8.625/93 (artigo 33, incisos I e II) e pela Lei Complementar Estadual nº 734/93 (artigo 51, incisos I e II), e visa, precipuamente, a proporcionar aos membros material de utilidade eminentemente prática para sua atuação nas Promotorias de Justiça.

O material ora apresentado é composto de breves considerações sobre os aspectos teóricos e práticos relacionados à apuração de fraudes e outras ilicitudes verificadas em procedimentos licitatórios diversos, contando com sugestões de diligências e indicações de repertório jurisprudencial pertinente e relevante sobre os temas.

As análises incluem: aspectos gerais da investigação; situações ilegais de dispensa e inexigibilidade de licitação; fracionamento ilícito do objeto; fraude no preço do produto e do serviço (superfaturamento e jogo de planilha); direcionamento e cláusulas restritivas; fraude na execução; alteração contratual.

São analisadas, ainda, questões relacionadas à apuração de cartéis em licitações.
Por fim, traz explanação sobre a extensão das sanções aplicadas às empresas condenadas.

Para algumas situações específicas foram colacionadas decisões do Tribunal de Contas da União e do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, considerada a relevância dos temas apresentados.
Por fim, resta salientar que este trabalho não encerra a colheita de material (peças processuais, decisões judiciais, orientações técnicas, etc.) realizada diariamente pelo CAOPP por força do contato diário com os membros que militam na área, já que parte dele se encontra na página eletrônica do Ministério Público.

Assim, tanto para o aprimoramento deste trabalho, que poderá ser realizado a qualquer momento, quanto para a elaboração dos próximos volumes, a participação dos membros é de suma importância.
Esperamos que o trabalho seja efetivamente útil aos membros que militam na área.

Coordenador do CAOPP: Tiago Cintra Zarif

Colaboradores:

André Vitor de Freitas

Arthur Pinto de Lemos Júnior

Beatriz Lopes de Oliveira (Assessora)

Dênis Fábio Marsola (Assessor)

Ernani de Menezes Vilhena Júnior

Evelise Pedroso Teixeira Prado Vieira

Rita de Cassia Bergamo

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CAPÍTULO 01

INVESTIGAÇÃO – ASPECTOS GERAIS

As técnicas, procedimentos e fórmulas de investigação apresentadas a seguir não esgotam as inúmeras variáveis dos casos concretos e nem sempre se revelam adequadas para o principal (quando não único) objetivo do inquérito civil: uma investigação eficiente e célere, apta à resolução das questões afetas às atribuições do Ministério Público. Por isso mesmo, a adoção dos mecanismos dependerá do caso concreto, consideradas as alternativas que se apresentam para a resolução do caso.

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1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO A SER INVESTIGADO

Traçar os limites de uma investigação, delimitando seu objeto, é fundamental para o sucesso do inquérito civil. Quanto mais objetivo e melhor especificado estiver o que se pretende investigar, mais fácil será a escolha das diligências necessárias para a obtenção da prova que se deseja.

Não raro nos deparamos com portarias de inquérito civil que indicam o objeto da investigação como sendo: “investigar os fatos narrados na representação”. Ocorre que a representação, com frequência mal redigida e desorganizada, nem sempre apresenta com clareza os limites necessários a um eficiente trabalho investigativo.

Não é suficiente, de igual modo, a indicação genérica do objeto como, por exemplo: “Investigar irregularidades no contrato nº 001/2014 para o fornecimento de refeições a funcionários que estejam executando serviços fora da jornada de trabalho”. É necessário indicar com clareza quais são as supostas irregularidades e como elas se apresentam, de maneira a proporcionar uma imediata cognição da informação que já se tem, e onde se pretende chegar. O objeto da investigação, a ser descrito na portaria, poderia ser assim especificado, a título de ilustração: “Investigar a execução do contrato nº 001/2014, para o fornecimento de refeições a funcionários que estejam executando serviços fora da jornada de trabalho, nos seguintes pontos: 1) quantidade de refeições contratadas acima do necessário; 2) refeições fornecidas sem que esteja o funcionário executando serviços fora da jornada de trabalho; 3) ocorrência de desvios no fornecimento do objeto com agentes públicos se beneficiando de refeições diretamente no restaurante contratado”.

A partir dessa delimitação será possível, em um primeiro momento, eliminar outras frentes de investigação que não integram o objeto, como, por exemplo, a licitação que deu origem à contratação. O objeto está limitado à execução do contrato e restrito aos três pontos enumerados. Todas as diligências, salvo se verificada a necessidade de ampliação do objeto, estarão direcionadas à prova dos três pontos enumerados. A não ser que se tenha, por exemplo, algum indício ou denúncia de superfaturamento, não será o caso de produzir qualquer prova destinada à demonstração do preço de mercado do serviço.

Não é de se esquecer que o Ato Normativo nº 484-CPJ, de 5 de outubro de 2006, que disciplina o inquérito civil e demais investigações do Ministério Público na área dos interesses transindividuais, exige, em seu art. 19, inciso I, que a portaria fixe o objeto da investigação, o que é relevante, ainda, para evidenciar diversos aspectos, dentre os quais podem ser citados, a título de exemplo: atribuição do membro que subscreve a portaria; legitimidade da atuação do Ministério Público; justa causa para a instauração da investigação.

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1.1. FATO NOVO: ADITAMENTO DA PORTARIA OU INSTAURAÇÃO DE NOVO IC

É comum, durante o desenvolvimento da investigação, a constatação de fato novo, não descrito na portaria, que, de algum modo, guarda relação com o objeto da investigação.

A decisão de ampliar o objeto, com o consequente aditamento da portaria, ou, de instaurar novo Inquérito Civil, dependerá da natureza da relação do novo fato com o objeto já investigado. Se o fato novo apresentar uma conexão probatória com o que já está sendo investigado, pode ser conveniente incluí-lo na mesma investigação, ampliando-se o objeto. Se não houver conexão probatória direta e a cumulação de objetos revelar-se desvantajosa para as investigações, deve-se instaurar novo procedimento.
Utilizando o exemplo acima (item 1), aportando nos autos representação denunciando a existência de superfaturamento no preço das refeições contratadas, a portaria deve ser aditada para incluir o superfaturamento no objeto das investigações. Mas, se a citada representação denunciar também fraude na licitação para a aquisição de cestas básicas destinadas aos funcionários, ainda que seja a mesma empresa a contratada, será conveniente instaurar novo inquérito civil.

Em regra, o que irá determinar a investigação no mesmo procedimento será a identidade ou conexão dos objetos licitados ou contratados. Assim, licitações diversas para a mesma obra podem (e talvez devam ser) investigadas em um mesmo Inquérito Civil; mas pode não ser conveniente investigar no mesmo procedimento mais de uma contratação da mesma empresa para o fornecimento de produtos ou serviços diversos. É evidente que tudo dependerá das peculiaridades do caso concreto.

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2. DILIGÊNCIAS – COMO REQUISITAR DOCUMENTOS OU INFORMAÇÕES

Uma vez delimitado o objeto da investigação, fica mais fácil saber o que precisa ser requisitado.

2.1. REQUISITANDO INFORMAÇÕES

A requisição deverá ser objetiva, precisa, evitando-se o pedido para que, por exemplo, o investigado se manifeste sobre o teor da representação ou da portaria.

Preferencialmente, a requisição deverá ser feita por itens numerados, o que tornará mais difícil uma resposta genérica ou imprecisa.

Utilizando novamente o exemplo do item 1, a requisição ficaria assim:

1) Como se chegou ao número de 7.000 refeições por ano?

2) Quais dados foram utilizados para este cálculo?

3) Qual o número de refeições contratadas por ano nos três anos anteriores?

4) O que justificou eventual aumento na quantidade de refeições no ano de 2013 em comparação com os anos anteriores?

5) Qual o horário de trabalho dos funcionários da autarquia beneficiados com as refeições? Indicar os dias da semana.

6) Quais os critérios utilizados para a requisição das refeições, além do fato de estar o funcionário fora de sua jornada de trabalho?

7) Quem era o encarregado de aplicação desses critérios? (nome e qualificação).

8) Foram requisitadas refeições para funcionários que não estavam trabalhando fora da jornada de trabalho? Por quê?

9) Esse contrato foi utilizado para o usufruto de refeições diretamente no restaurante contratado? Por quê?

10) Quem se beneficiou dessas refeições feitas no restaurante? (nomes, cargos e qualificações).

11) Por que nas notas fiscais constou sempre o fornecimento de “marmitex” e não o fornecimento de refeições no próprio restaurante?

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2.2. REQUISITANDO DOCUMENTOS

Há documentos que já se apresentam como a prova da qual precisamos, e outros conjuntos de documentos dos quais precisaremos extrair e processar a informação para obter a prova.

2.2.1. GRANDE VOLUME DE DADOS E INFORMAÇÃO PROCESSADA

Antes de requisitar um grande volume de documentos, é necessário que se questione que informação exatamente será preciso extrair daquela documentação. Em tais casos, pode ser útil a prévia oitiva de um funcionário que esclareça que tipo de informação é registrada nos documentos oficiais. A partir de então, imprescindível saber como aquela informação será usada e como ela deve ser processada.

Imagine-se, por exemplo, que o objeto da investigação seja apurar o uso de combustível adquirido pelo município na campanha eleitoral. Uma das frentes de investigação pode ser a verificação de um aumento injustificado de combustível no período da campanha. Para isso seria necessária a requisição de todas as guias de abastecimento, documentos de controle de quilometragem de cada veículo que compõe a frota municipal, e notas fiscais de combustível, num período de, talvez, 18 meses para que se faça uma comparação com períodos anteriores. Mesmo em um município de pequeno porte, a quantidade de documentos será significativa, e demandará um tempo e uma estrutura de recursos humanos que a promotoria na maioria das vezes não dispõe. A solução é que se requisite a informação já processada em uma planilha eletrônica. Deve-se então encaminhar ao órgão requisitado um arquivo com a planilha já montada com os dados que se pretende obter para que seja preenchida com as informações extraídas dos documentos oficiais:

Placa do veículo Combustível Data do
abastecimento
Litros Km
odômetro
XXXX-1234 Gasolina 10/10/2012 40 22.369
YYYY-4321 Etanol 12/09/2011 60 59.827

A partir da utilização de filtros da planilha Excel1, será possível efetuar o cruzamento de dados sabendo-se, por exemplo, quantos litros de combustível um determinado veículo consumiu em dado período em comparação com o mesmo período do ano anterior. [1. O vídeo tutorial disponível na Cartilha Cargos em Comissão, disponível no site do CAO-PP explica a utilização dos filtros.]

A planilha deverá ser enviada à promotoria de justiça impressa, para fazer prova da autenticidade da informação, e em arquivo digital, para que possa ser manipulada com a utilização dos filtros.

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2.3. CREDIBILIDADE DAS INFORMAÇÕES PROCESSADAS

É possível confiar nas informações processadas pelo órgão requisitado?

A requisição das informações em planilha não dispensa, neces­sariamente, a requisição dos documentos que subsidiaram o preenchimento da planilha. É possível, dependendo das circunstâncias do caso concreto e do volume de documentos, requisitar total ou parcialmente os documentos e efetuar a checagem, total ou por amostragem, dos dados da planilha.

Outro expediente que confere maior credibilidade à prova é a requisição dos dados, na planilha, que deve ser fornecida na forma de certidão, subscrita pelo funcionário (efetivo) encarregado da tabulação das informações, com a advertência de sua responsabilidade pela fidelidade dos dados em relação aos documentos que respaldaram o preenchimento.

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3. PRINCIPAIS PONTOS A SEREM ANALISADOS EM UM
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO

3.1. DOCUMENTO DE REQUISIÇÃO DO OBJETO LICITADO

Ao requisitar ao gestor público a compra ou contratação de serviços, o requisitante pode fornecer elementos que ajudem a identificar o dolo, o direcionamento e a responsabilidade por eventual fraude. Em regra, é esse documento que inaugura o procedimento, justificando a necessidade da contratação.

3.2. ORÇAMENTO E FONTES

A administração pública para contratar tem que, obrigatoriamente, conhecer o preço de mercado do bem ou serviço2. O preço de mercado pode ser obtido através de tabelas oficiais, no caso de medicamentos, por exemplo a ANVISA; ou através da cotação de preços em orçamentos. Não é incomum que a fraude tenha início com orçamentos superfaturados, que elevam o preço da contratação, o que exige especial atenção sobre as fontes de tais orçamentos para verificar se provêm de empresas existentes e idôneas. Embora não haja vedação legal, é recomendável que empresas que fornecem orçamento não sejam posteriormente convidadas a oferecer proposta (na modalidade convite). Tudo dependerá da oferta do bem no mercado ser ampla ou restrita. De qualquer modo, em obediência ao princípio da publicidade, o orçamento deve sempre citar a fonte orçada, não bastando mera informação nos autos. [2. Art. 6º, inciso IX, alínea “f” e art. 7º, § 2º, inciso II, c.c. os arts. 14 e 43, inciso IV da Lei nº 8.666/1993.]

Prestar atenção que o bem ou serviço orçado o seja na mesma forma em que contratado. Assim, se o Administrador pretender adquirir, por exemplo, dois computadores, no orçamento prévio as características do equipamento e as condições do negócio devem ser idênticas às da contratação.

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3.3. EDITAL: IDENTIFICAÇÃO DE CLÁUSULAS RESTRITIVAS

Há cláusulas restritivas da competição cuja identificação decorre das regras de experiência comum, sendo facilmente perceptíveis quando encerram exigência desarrazoada ou absurda. Já outras exigirão um esclarecimento técnico por referirem-se a características específicas do objeto licitado, que não se tem como saber se são de fato necessárias ao atendimento do interesse público. Nesse último caso, a identificação da cláusula restritiva em regra ocorre a partir de denúncias, apontamentos do Tribunal de Contas ou impugnações no procedimento licitatório.

Em se tratando de cláusula restritiva de natureza técnica, uma primeira providência pode ser ouvir em declarações o funcionário técnico do órgão, responsável pela inclusão da cláusula e a partir de seus argumentos, apreciar a efetiva ocorrência de restrição, ou mesmo elaborar quesitos para uma consulta pericial.

Muitas das cláusulas restritivas referem-se a prazos muito curtos para cumprimento de obrigações, o que não irá afetar a empresa conluiada com a administração, que já se preparou de antemão para atender à exigência. A identificação em tais casos pode ocorrer com a inquirição de empresas que retiraram o edital, mas não ofereceram proposta.

Outros exemplos são:

  • Qualificação técnica – fornecimento de percentual elevado do objeto licitado para outras pessoas jurídicas (Súmula 24 do TCESP 50 ou 60%).
  • Capital mínimo e patrimônio líquido exigidos que superam o índice de 10% do valor estimado da contratação (art. 31, § 3º da Lei nº 8.666/1993).
  • Exigências cumulativas de capacidade econômica (art. 31, §2º da Lei nº 8.666/1993).
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    3.4. RELAÇÃO DAS EMPRESAS QUE RETIRARAM O EDITAL

    Se o número de empresas que retiraram o edital for muito superior àquelas que se interessaram em participar da licitação, oferecendo proposta, haverá indício de cláusula restritiva, o que, como dito acima, poderá ser investigado perquirindo-se as empresas não participantes sobre o motivo do desinteresse.

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    3.5. ORIGEM, CONSTITUIÇÃO E PROPRIEDADE DAS EMPRESAS

    A análise dos contratos sociais das empresas pode revelar a existência de ligações entre elas que demonstrem a existência de cartel, e ou a existência de uma ligação entre a empresa e o órgão licitante.

    A participação de duas ou mais empresas originárias de locais distantes da sede do órgão licitante; o fato de ter sido uma determinada empresa constituída logo após o resultado das eleições municipais, ou no primeiro ano de mandato; e a existência de sobrenomes coincidentes entre os sócios ou de agentes públicos são situações que revelam indícios de conluio.

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    3.6. MOTIVOS DE DESCLASSIFICAÇÃO DOS LICITANTES

    As atas das sessões da comissão de licitação deverão apontar os motivos de eventuais desclassificações ou inabilitações de licitantes que podem revelar arbítrio deliberado do órgão público para favorecer determinada concorrente, ou a presença de empresas que apenas simulam uma concorrência.

    Deve-se ter em conta que a participação em uma licitação é algo trabalhoso, que demanda a reunião de uma série de documentos, não sendo crível que empresas se esqueçam de juntar documentos simples, gerando intencionalmente uma desclassificação.
    É evidente que a prova da fraude em tais casos não poderá estar calcada em um incidente isolado, mas poderá servir para demonstrar o dolo se inserida em um conjunto de elementos coerentes.

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    3.7. FORMATAÇÃO E CONTEÚDO DAS PROPOSTAS

    A atenta leitura de propostas fraudadas pode revelar-lhes a origem comum. Na prática, a simulação de propostas de duas ou mais empresas que emprestam seus nomes para forjar uma competição ocorre a partir de uma proposta inicial, elaborada em computador, que tem sua formatação alterada para parecer diferente em cada empresa. Não raro, porém, erros de grafia ou de digitação acabam passando despercebidos e podem ser identificados exatamente da mesma forma e na mesma localização nas duas, três ou quatro propostas que deveriam ter origens diversas. Tal situação acaba por conferir uma impressão digital, que revela a origem única das propostas e acaba por constituir prova cabal da fraude. A análise deve recair também sobre documentos fornecidos pelas empresas como declaração de não empregar menor de 16 anos, etc. Deve-se ter sempre o cuidado de conferir se a falha detectada não coincide com o modelo oficial fornecido como anexo do edital.

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    4. FONTES DE PESQUISA NA INTERNET

    4.1. PESQUISA DE PREÇOS E INDICADORES

    4.1.1. PROCON

    http://www.procon.sp.gov.br/categoria.asp?id=64

    – Cesta Básica

    – Comparativas de Preços

    – Comportamentais

    – Tarifas Bancárias

    – Taxas de Juros Bancários

    – Outras Pesquisas

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    4.1.2. FIPE – FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS

    http://fipe.org.br/

    A Fipe realiza levantamentos de dados primários para a elaboração de índices, tabelas de preços médios e de quantidades de uma série de variáveis econômicas.

    As pesquisas acadêmicas e aplicadas da Fipe têm a finalidade de diagnosticar, quantificar e avaliar os impactos das políticas econômicas e sociais. Atendem também às solicitações do governo em todos os seus níveis, às instituições nacionais e internacionais, às empresas e às organizações da sociedade civil.

    Embora a Fipe não faça menção, em todas as pesquisas realizadas, a preços específicos, é possível que se solicite, por meio de ofício, informes de valores de itens determinados que constem de banco de dados existentes, utilizados para elaboração dos índices divulgados.

    Os itens de pesquisa são os seguintes:

    Parte inferior do formulário

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    4.1.3. CADTERC – CADASTRO DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS

    http://www.cadterc.sp.gov.br/

    4.1.4. BEC - BOLSA ELETRÔNICA DE COMPRAS DO ESTADO DE SÃO PAULO

    http://www.bec.sp.gov.br/publico/aspx/Home.aspx

    4.1.5. IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA

    http://www.ibge.gov.br/home/mapa_site/mapa_site.php#indicadores

    IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo)

    IPP (Índice de Preços ao Produtor)

    SNIPC (Preços ao Consumidor)

    IPCA - INPC

    IPCA - E

    IPCA - 15

    4.1.6. DER – DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM

    http://www.der.sp.gov.br/WebSite/Index.aspx

    4.1.7. ANP - AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO

    http://www.anp.gov.br/?id=502

    4.1.8. ANVISA - AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA

    http://portal.anvisa.gov.br/

    4.1.9. SINAPI – SISTEMA NACIONAL DE PESQUISA DE CUSTOS E

    ÍNDICES DA CONSTRUÇÃO CIVIL

    http://www1.caixa.gov.br/gov/gov_social/municipal/programa_des_urbano/SINAPI/index.asp)

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    4.2. CADASTROS DE APENADOS
    (SANÇÕES CIVIS E ADMINISTRATIVAS)

    4.2.1. Tribunal de Contas do Estado de São Paulo

    Relação de Apenados

    1. Relação das pessoas físicas e/ou jurídicas que sofreram penas em procedimentos licitatórios ou contratações de que participaram, nos órgãos indicados, nos termos das instruções vigentes;

    2. Relação das pessoas físicas ou jurídicas que estão impedidas de contratar com a administração pública e/ou de receber benefícios ou incentivos fiscais, por determinação judicial.

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    4.2.2. Corregedoria Geral da Administração do Governo do Estado
    de São Paulo

    Sanções Administrativas

    Impõem a pessoas físicas e jurídicas a proibição de licitar e contratar com qualquer órgão ou entidade da Administração Pública do Estado de São Paulo.

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    4.2.3. Controladoria Geral da União do Governo Federal

    Cadastro Nacional de Pessoas Inidôneas e Suspensas - CEIS

    Cadastro de entidades privadas sem fins lucrativos impedidas – CEPIM

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    4.2.4. Tribunal de Contas da União

    http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/responsabilizacao

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    4.2.5. Conselho Nacional de Justiça

    http://www.cnj.jus.br/improbidade_adm/consultar_requerido.php

    4.3. Outros links de Pesquisa

    4.3.1. Pesquisas em Fontes Abertas - Google

    Google (www.google.com.br) e outros sites de busca:

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    4.3.2. Diário Oficial do Estado de São Paulo

    www.imprensaoficial.com.br

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    4.3.3. Empresas registradas no Estado de São Paulo - JUCESP

    www.jucesponline.sp.gov.br

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    4.3.4. Domínios de internet

    www.registro.br

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    4.3.5. Operações financeiras suspeitas de lavagem de dinheiro - COAF

    http://www.coaf.fazenda.gov.br/

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    4.3.6. Matrículas de imóveis - ARISP

    https://www.oficioeletronico.com.br/

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    4.3.7. Despesas municipais

    http://transparencia.tce.sp.gov.br/

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    4.3.8. Central notarial do Brasil – CNB – CENSEC

    www.censec.org.br

    – Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários – CESDI: destinada à pesquisa de escrituras a que alude a Lei 11.441, de 04 de janeiro de 2007; e

    – Central de Escrituras e Procurações – CEP: destinada à pesquisa de procurações e atos notariais diversos.

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    4.3.9. Sistema ARPEN-SP- CRC-JUD – Cartórios de Registro Civil do Estado de São Paulo

    http://www.arpensp.org.br/ 

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    4.3.10. CADASTRO NACIONAL DE INFORMAÇÕES SOCIAIS - CNIS

    https://www5.dataprev.gov.br/cnisinternet/faces/login.xhtml

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    CAPÍTULO 02

    AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO – SITUAÇÕES DE DISPENSA E INEXIGIBILIDADE INDEVIDAS

    A regra geral, segundo exigência do artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal, é de que os órgãos da Administração Pública somente adquiram bens e serviços mediante prévio procedimento licitatório. Porém, o próprio dispositivo constitucional autoriza a legislação disciplinadora do tema a dispensar ou considerar inexigível a licitação em determinadas situações.

    As hipóteses em que a licitação é dispensável estão previstas no artigo 24 da Lei nº 8.666/93. Já o artigo 25 do mesmo diploma legal disciplina as hipóteses em que a licitação se torna inexigível.

    De acordo com o inciso VIII do artigo 10 da Lei nº 8.429/92, constitui ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário qualquer conduta que importe frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente.

    A expressão deve ser interpretada extensivamente de modo a abranger tanto as situações de dispensa, previstas no artigo 24 da Lei nº 8.666/93, quanto as situações de inexigibilidade, apontadas no artigo 25, de maneira que por indevida dispensa de licitação podemos entender toda a situação que ensejar a compra de bem ou serviço, ou a alienação de bem pela Administração Pública sem procedimento licitatório e sem que de fato se esteja em face de uma hipótese de dispensa ou de inexigibilidade.

    Cabe observar que a dispensa indevida de licitação ou o entendimento de que ela é inexigível também constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública, nos termos do artigo 11 da Lei nº 8.429/92, especialmente o princípio da impessoalidade, já que a dispensa ou inexigibilidade indevidas são motivadas pela prévia intenção ou desejo de contratar determinado fornecedor, evitando o risco de que não se sagrasse vencedor no certame que porventura viesse a ser promovido.

    As situações práticas adiante expostas e comentadas cuidam dos temas que mais foram objeto de questionamentos e dúvidas apresentadas ao CAO-PP por Promotores de Justiça, envolvendo o tema de fraudes a licitações.

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    1. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA PARA REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO

    Fundamento legal: artigo 23, inciso II, combinado com o artigo 24, inciso II, alínea “a” e artigo 24, inciso XIII, todos da Lei nº 8.666/93. Dispensa de licitação.

    As fraudes relacionadas à contratação de empresas para realização de concursos para órgãos públicos em geral são realizadas sob dois fundamentos de dispensa admitidos em lei: a dispensa de licitação em decorrência do valor do contrato (art. 24, inciso II) e a dispensa em razão da natureza das atividades desenvolvidas pela entidade contratada (art. 24, inciso XIII).
    Evidente que existem outras ilegalidades relacionadas a contratações desta natureza, tais como a opção pela modalidade licitatória (pregão, convite, tomada de preços ou concorrência) ou pelo tipo de licitação (menor preço em detrimento da melhor técnica e preço).
    Estas também merecerão alguns comentários e indicações jurisprudenciais. Todavia, aqui abordaremos os casos em que há maior incidência de fraudes.

    Importante também salientar que neste trabalho levaremos em consideração os valores que a Lei Federal nº 8.666/93 estabelece como limites de dispensa de licitação, ressaltando, entretanto, que leis estaduais e municipais podem estabelecer outros limites, desde que não superiores àqueles previstos na referida lei federal.

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    1.1. Dispensa em razão do valor do contrato (art. 24, inciso II)

    A experiência de atuação na área do patrimônio público demonstra que os órgãos públicos têm realizado a contratação direta de empresas para a realização de concursos públicos, de maneira irregular, considerando o valor da contratação, nas seguintes condições:

    a) contratação por valor inferior ao limite legal para dispensa de licitação (no caso de Convite, inferior a oito mil reais3); [3. Conforme artigo 24, inciso II da Lei nº 8.666/93.]

    b) contratação sem previsão de valor, sob a alegação de que não é possível estimar os custos;

    c) contratação sem previsão de valor sob a alegação de que tal serviço não gerará dispêndio de recursos públicos, já que a remuneração da empresa se fará mediante o recebimento direto dos valores pagos a título de taxa pelos candidatos que se inscreverem no concurso público a ser realizado.

    Nas hipóteses “a” e “b”, a irregularidade consiste na completa desconsideração dos aspectos comuns, rotineiros, inerentes à realização de um concurso público, tais como: a estimativa do número de inscrições e do somatório dos valores que a empresa receberá diretamente dos candidatos inscritos (muitas vezes superior ao limite permitido para a dispensa licitatória nos casos de Convite); os custos para a elaboração de provas e sua realização; a montagem e estruturação de equipe técnica para acompanhamento, fiscalização e correção das provas, dentre outros serviços.

    Nesses casos, a fase que antecede a licitação contém ou estimativa irreal, a justificar valor inferior ao limite legal ou a completa ausência de estimativa.

    Importante destacar que é perfeitamente possível estimar os serviços e seus custos. Caso não se considere possível estimar a quantidade de candidatos, deve o ente público optar pelo procedimento licitatório de maior valor, no caso, a Concorrência Pública.
    Na hipótese “c”, quando o argumento para dispensa é a ausência de dispêndio de recursos públicos, a caracterização da fraude é evidente, porquanto o valor que a empresa recebe em decorrência da arrecadação resultante dos valores pagos pelos candidatos inscritos supera o limite legal de dispensa.

    Outro argumento a sustentar a ilegalidade reside no fato de que os valores arrecadados em virtude das inscrições têm natureza de verba pública, constituindo recurso que provém dos candidatos inscritos e que deve ingressar nos cofres públicos4. [4. Rita Tourinho. Da ação civil pública no controle da contratação de empresa para realização de concurso público. Encontrado em: http://www.ccjb.org.br/documentos/DA%20CONTRATA%C3%87%C3%83O%20DE%20EMPRESA%20PARA%20 REALIZA%C3%87%C3%83O%20DE%20CONCURSO%20P%C3%9ABLICO.doc. Pesquisa feita no dia 21/10/2014;]

    Há doutrinadores que defendem a natureza tributária destes recolhimentos5, seja como taxa, seja como preço público, enquanto há outros que defendem sua natureza não tributária, sem, contudo, negar a natureza de recursos pertencentes ao poder público6. [5. Gasparini, Diógenes. Concurso Público - Imposição Constitucional e Operacionalização. In: Concurso Público e Constituição. BeloHorizonte: Fórum, 2005. p. 69.] [6. Fernandes, Jorge Ulisses Jacoby. Os Tribunais de Contas e o Controle Sobre as Admissões no Serviço Público.Revista do Tribunal deContas do Estado de Minas Gerais. Edição 2002. n° 02.]

    Independentemente de considerarmos ou não a natureza tributária de tais recursos, o fato é que eles são pagos pelas pessoas que estabelecem um vínculo com o órgão ou ente público que promove um concurso público, não importando a elas se quem elabora e/ou executa as provas é ou não uma empresa privada.

    Portanto, são recursos que devem ingressar e sair dos cofres públicos mediante estrita observância das regras estabelecidas pela Lei Federal nº 4.320/64. Assim, mostra-se ilegal o recebimento direto de tais recursos por pessoas jurídicas privadas que tenham contratado com a Administração Pública para a prestação de quaisquer serviços, inclusive a realização de concursos públicos.
    Neste sentido é a Súmula nº 217 do Tribunal de Contas da União, aplicável à Administração Pública Federal, mas que pode (e deve) ser utilizada como parâmetro para os entes públicos das outras esferas de governo:

    “Os valores correspondentes às taxas de inscrição em concursos públicos devem ser recolhidos ao Banco do Brasil S.A., à conta do Tesouro Nacional, por meio de documento próprio, de acordo com a sistemática de arrecadação das receitas federais prevista no Decreto-lei nº 1.755, de 31/12/79, e integrar as tomadas ou prestações de contas dos responsáveis ou dirigentes de órgãos da Administração Federal Direta, para exame e julgamento pelo Tribunal de Contas da União. Fundamento legal - Constituição, art. 70, §§ 1º, 3º e 4º - Decreto-lei nº 1.755, de 31/12/79”.

    Os valores devem ser arrecadados pelo órgão público contratante e, se for o caso (isto é, se o ente não realizar diretamente o concurso), transferidos à empresa contratada para realizar o concurso, mediante observância das normas de direito financeiro e de contabilidade pública aplicáveis.

    Neste sentido já foi decidido que:

    “Os candidatos ao concurso não têm qualquer relacionamento direto e imediato com a contratada pois com esta não celebraram qualquer ajuste. Em verdade, aderiram ao chamamento do edital convocatório e estabeleceram uma relação jurídica direta com o Município, que impôs a obrigação do pagamento da referida “taxa” e, por consequência, assumiu a contraprestação de realizar o certame. Tem, pois, a taxa de inscrição a natureza de prestação imposta pela Municipalidade como condição para participar do certame e com o objetivo de satisfazer o seu custo. Chega-se, pois, à conclusão de que a taxa de inscrição se insere na remuneração que o Município deveria pagar à contratada e foi recebida diretamente por esta, mas em nome e por conta daquele”
    (TJSP, 3ª Câmara de Direito Público, Apelação Cível nº 171.866-5/3-00, de Marília, j . 26.06.2001, Relator o Des. PEIRETTI DE GODOY).

    O STJ já se posicionou sobre o assunto no mesmo sentido:

    “ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE EMPRESA ORGANIZADORA DE CONCURSO PÚBLICO, COM FUNDAMENTO NO ART. 24, II, DA LEI DE LICITAÇÕES. VALOR DO CONTRATO ADMINISTRATIVO INFERIOR A R$8.000,00 (OITO MIL REAIS). RECEBIMENTO PELA EMPRESA CONTRATADA DAS TAXAS DE INSCRIÇÃO DO CONCURSO, EM MONTANTE SUPERIOR AO PERMISSIVO DA LEI DE LICITAÇÕES. NECESSIDADE DE PRÉVIO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.”
    (STJ, RESP 1.356.260 – SC, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 07/02/2013, T2 - SEGUNDA TURMA).

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    1.2. Dispensa em razão da natureza das atividades desenvolvidas pela entidade contratada (art. 24, inciso XIII)

    Também é possível que a fraude a licitação ocorra em virtude da dispensa na contratação de empresa para realização de concurso público, tendo como fundamento o disposto no inciso XIII do artigo 24 da Lei de Licitações:

    “Art. 24. É dispensável a licitação:

    (...)

    XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos”.

    Não raras vezes, órgãos públicos contratam diretamente instituições para a realização de concursos públicos, invocando o desenvolvimento institucional como fundamento.

    Porém, não basta que os serviços a serem prestados estejam previstos no artigo 24 da Lei nº 8.666/1993 para justificar a dispensa de licitação. É imprescindível, em razão da particular e expressa previsão legal, a verificação dos requisitos estabelecidos nos artigos 24 e 26 da citada Lei.

    Assim, as instituições referidas no inciso XIII do artigo 24 devem consignar nos respectivos regimentos ou estatutos as finalidades a que se dedicam, entre as quais devem constar, para que a dispensa seja lícita, a pesquisa, o ensino, o desenvolvimento institucional ou a recuperação social do preso. Ademais, tais entidades não podem ter fins lucrativos e devem ostentar inquestionável reputação ético-profissional. Deve haver, por fim, correlação lógica entre os objetivos preconizados no inciso XIII, do artigo 24, a natureza da instituição e o objeto do contrato7. Desse modo, a instituição deverá dedicar-se à área objeto do contrato e revelar experiência nela. [7. Súmula no. 150 TCE: A contratação de instituição sem fins lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei n.º 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado.]

    Acerca dos requisitos, vale conferir o seguinte trecho do Voto proferido nos autos do TC-006049/026/12, do TCE/SP:
    “...Conforme a orientação traçada em sede de recurso ordinário no TC-31187/026/011, a validade da contratação direta pressupõe a presença de diversos requisitos, que devem ser observados cumulativamente:

    a) o objeto societário da instituição, sempre pessoa jurídica, brasileira e sem fins lucrativos, deverá ser preciso quanto à sua finalidade, abrangendo atividades dedicadas à pesquisa, ao ensino, ao desenvolvimento institucional ou à recuperação de presos;

    b) o objeto do contrato deverá corresponder a uma dessas especialidades e não se referir a serviços corriqueiramente encontrados no mercado;

    c) o contrato deverá ter caráter intuitu personae, vedadas, em princípio, a subcontratação e a terceirização, ou seja, a avença meramente instrumental ou de intermediação;

    d) ser inquestionável a capacitação da contratada para o desempenho da atividade objetivada;

    e) a reputação ético-profissional da instituição deve referir-se ao objeto pactuado e ser aferida no universo de outras entidades da mesma natureza e fins, no momento da contratação;

    f) ser comprovada a razoabilidade do preço cotado; e

    g) se houver mais de uma instituição com semelhante ou igual capacitação e reputação, há que se proceder à licitação, caso não seja possível justificar adequadamente o motivo da preferência por uma delas”.
    (TC - 576/009/11 - São Roque - Dispensa de licitação com fundamento no inciso XIII, do art. 24 da Lei nº 8666/93.)

    Vale destacar, ainda, que imprescindível se apresenta a justificação da dispensa de licitação através de procedimento próprio, sob pena de incidir em crime previsto na própria Lei de Licitações (art. 89).

    A propósito, nos termos do artigo 26 da Lei nº 8.666/93, as dispensas previstas nos incisos III e seguintes do artigo 24 devem ser comunicadas, dentro de três dias, à autoridade superior, de cuja ratificação, em igual prazo, depende sua eficácia. Disso decorre que, nos casos enumerados, enquanto o ato que autorizou a dispensa não for ratificado (ou homologado) pela autoridade competente, o contrato não poderá ser celebrado, sob pena de responsabilização do servidor que o fez.
    Portanto, no procedimento administrativo de justificação deve constar pesquisa de mercado das instituições organizadoras de concursos públicos, a reputação ético-profissional delas, avaliação de suas competências e experiências, finalidade lucrativa, além dos respectivos orçamentos concernentes ao objeto do contrato.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    Dispensa de licitação em razão do valor. Recebimento das taxas de inscrição pela empresa contratada:

    Apelação nº 0008779-13.2010.8.26.0189, da Comarca de Fernandópolis. Julgado em outubro de 2012.
    Dispensa indevida de licitação. Valor cobrado que não torna dispensável o procedimento licitatório. Contrato que beneficiou a empresa acusada.

    Apelação nº0012528-19.2010.8.26.0066, da Comarca de Barretos. Julgado em março de 2014.
    Procedimento de dispensa de licitação para a contratação de empresa visando a realização de concurso público. Pretensão à decretação de nulidade de atos administrativos e conseqüente ressarcimento pelos danos ao erário.

    Dispensa de licitação em razão da natureza da empresa ou entidade contratada:

    Apelação Cível 20110111374632APC. Distrito Federal. Julgado em julho de 2013.
    Realização de concurso. Dispensa de licitação. Existência de outras instituições capacitadas. Concorrência. Preservação da competitividade.

    Apelação / Reexame Necessário n° 990.10.074992-7, da comarca de Jacareí. Julgado em julho de 2010.

    A dispensa de licitação foi imotivada no tocante à inquestionável reputação ético-profissional. Contrato nulo.

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    2. CONTRATAÇÃO DE ARTISTAS

    Fundamento legal: artigo 25, inciso III, da Lei nº 8.666/93. Inexigibilidade de licitação.

    “Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
    (...)

    III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.”

    As contratações de artistas para espetáculos e shows de diversas naturezas têm sido objeto recorrente de atos de improbidade administrativa, notadamente em razão de práticas específicas e reiteradas, tais como: a) contratação de empresa ou pessoa física sem licitação, na qualidade de intermediária do negócio, sob a alegação de se tratar de “empresário exclusivo” do artista pretendido; b) fixação de preços sem parâmetro algum e c) aglutinação de diversos objetos em um mesmo contrato (a apresentação artística, a montagem de palcos, a montagem e execução de equipamentos de som e iluminação, etc.).

    Nestas situações, recomenda-se não só a análise da condição e qualificação do empresário contratado (pessoa física ou jurídica), mas também o objeto e preço do contrato, elementos nos quais normalmente estão concentradas as práticas fraudulentas.

    É importante destacar que o processo de inexigibilidade deve ser instruído com a razão da escolha do artista e com a justificativa do preço do cachê, de modo a atender ao princípio da transparência e para que se evitem distorções (artigo 26, incisos II e III da Lei nº 8.666/93).

    Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União já expediu recomendação à entidade pública no sentido que:

    “Quando contratar a realização de cursos, palestras, apresentações, shows, espetáculos ou eventos similares, demonstre, a título de justificativa de preços, que o fornecedor cobra igual ou similar preço de outros com quem contrata para eventos do mesmo porte, ou apresente as devidas justificativas, de forma a atender ao inciso III do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/93"
    (Tribunal de Contas da União – Acórdão 819/2005 – Plenário – AC-0819-23/05-P – Relator Marcos Bemquerer).

    Da mesma forma, o histórico das apresentações do artista, levando-se em conta o porte do evento e para quem prestou seus serviços, se para iniciativa privada ou pública, é elemento balizador para justificação de preço. De posse dessa informação, deve a Administração Pública proceder à comparação com o valor a ser contratado.

    Esse entendimento foi expedido pela Advocacia Geral da União – AGU, na Orientação Normativa 17/2009:
    “É obrigatória a justificativa de preço na inexigibilidade de licitação, que deverá ser realizada mediante a comparação da proposta apresentada com preços praticados pela futura contratada junto a outros órgãos públicos ou pessoas privadas”.

    A contratação intermediada pelo empresário é possível, desde que seja comprovado se tratar do empresário exclusivo do artista a ser contratado. Por empresário exclusivo deve-se entender a figura do representante ou agente, ou seja, aquele que se obriga a, autonomamente, de forma habitual e não eventual, promover, mediante retribuição, a realização de certos negócios, por conta do representado.

    A figura do empresário eventual ou ad hoc tem surgido de maneira muito comum e ocorre quando uma empresa apresenta uma carta ou documento firmado pelo empresário exclusivo do artista afirmando, por exemplo, que aquela empresa tem exclusividade para intermediar a contratação do artista para sua apresentação em uma determinada data e local. A contratação desta empresa não pode ser feita mediante processo de inexigibilidade de licitação, pois esta situação foi criada para este fim, ou seja, a exclusividade para uma única apresentação não é exclusividade para os fins da Lei de Licitações.

    A Administração Pública, ao contratar artista através de empresário exclusivo, deve exigir o contrato de exclusividade artística. É através dele que a Administração Pública tomará conhecimento acerca da remuneração cobrada pelo empresário, se o mesmo é exclusivo do artista e se atua em seu âmbito territorial, bem como se o contrato é vigente.

    “Quando da contratação de artistas consagrados, enquadrados na hipótese de inexigibilidade prevista no inciso III do art. 25 da Lei nº 8.666/1993, por meio de intermediários ou representantes, deve ser apresentada:

    Além disso, a exclusividade na contratação do artista não pode estar relacionada a conluio prévio entre a contratada e os representantes da Administração. (TJ-SC - Agravo de Instrumento: AI 251725 SC 2010.025172-5).

    De outra parte, o art. 26 da Lei nº 8.666/93 define que as situações de inexigibilidade referidas no artigo 25 deverão ser comunicadas, dentro de 03 dias, à autoridade superior para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 05 dias, como condição para a eficácia dos atos.

    Estes atos, pois, devem estar demonstrados no procedimento de inexigibilidade de licitação.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    TRF 3ª Região – Agravo de Instrumento nº 0025817-27.2012.4.03.0000/SP – 25/07/2013.
    Empresas intermediadoras de shows artísticos contratadas irregularmente mediante instrumento de inexigibilidade de licitação, para a realização de eventos promovidos com recursos oriundos do Ministério do Turismo.

    TJDF - Apelação Cível 20080111606099APC – 28/08/2013.

    Inexigibilidade de licitação. Contratação de artistas.

    TJSP - Apelação nº 0007548-83.2005.8.26.0428, da Comarca de Campinas. 26/09/2011.

    Prefeito e empresa contratada para a realização de evento artístico na inauguração de shopping. A inexigibilidade da licitação somente poderia incidir sobre o valor pago à cantora e não a toda produção decorrente da apresentação.

    TJSP - Apelação nº 0206195-42.2008.8.26.0000, da Comarca de Avaré. 25/02/2013.

    Contratação irregular de empresa privada para prestação de serviços de mão-de-obra e montagem de shows pirotécnicos, com geração de despesas impróprias para municipalidade.

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    3. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADOS OU ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA

    Fundamento legal: artigo 25, inciso II, combinado com o artigo 13, incisos III ou V (conforme o caso), ambos da Lei nº 8.666/93. Inexigibilidade de licitação.

    “Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
    (...)

    II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação”.

    Desse modo, é inexigível a licitação para a contratação dos serviços técnicos relacionados nos incisos do artigo 13, desde que tais serviços sejam caracterizados pela “natureza singular” e que o profissional ou empresa escolhida tenha “notória especialização”.
    Dentre os serviços técnicos previstos no artigo 13 encontram-se, no inciso II, os pareceres e, no inciso V, o patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas, ou seja, a contratação de advogados ou de escritórios de advocacia para elaboração de pareceres jurídicos ou patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas.

    Antes que adentremos o tema que envolve a inexigibilidade de licitação na contratação de advogados, é importante destacar que tratando-se de atividades da Advocacia Pública, isto é, assessoria e consultoria a entidades e órgãos da Administração Pública, o entendimento que se mostra em conformidade com a ordem constitucional é de que tais atividades, inclusive sua chefia, são reservados a profissionais recrutados por concurso público (Enunciado de entendimento nº 35 da Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo).

    Trata-se da regra instituída no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, pela qual a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

    Desse modo, a regra é de que a atividade jurídica pública seja desempenhada por procuradores jurídicos concursados.
    Somente em casos excepcionais, isto é, diante da necessidade de um serviço advocatício de real “natureza singular” e desde que o profissional ou empresa escolhida tenha “notória especialização” é que se poderá realizar contratação direta, porquanto nesse caso a licitação se mostra inexigível nos termos da lei.

    Porém, visando burlar a regra constitucional, muitos órgãos da Administração Pública vêm contratando advogados e escritórios de advocacia, sem observância dos requisitos inerentes à configuração da inexigibilidade. O processo de justificação da escolha do Advogado/Escritório de Advocacia deve conter todos os elementos que nortearam o administrador público em sua decisão.

    É comum nos depararmos com municípios que possuem corpo jurídico próprio, dotado de número razoável de procuradores municipais, mas que realiza irregularmente a contratação de escritório de advocacia para defesa em procedimentos junto ao Tribunal de Contas do Estado, por exemplo, sob o argumento de que esse serviço advocatício deve ser especializado.

    Em recente julgado do Supremo Tribunal Federal foram explicitados8 diversos parâmetros para aferir a inviabilidade da competição, que devem ser apurados no caso concreto: a) existência de procedimento administrativo formal; b) notória especialização profissional; c) natureza singular do serviço; d) demonstração da inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e) cobrança de preço compatível com o praticado pelo mercado. [8. Inquérito nº 3074-SC, Relator Ministro Roberto Barroso, j. 26.08.2014.]

    a) Procedimento administrativo formal: todos os procedimentos e contratos celebrados em virtude de inexigibilidade de licitação devem atender, naquilo que couber, às exigências formais e de publicidade contidas na Lei n° 8.666/93, notadamente as previstas nos artigos 26 e 60 a 64. Destaque-se que a necessidade de motivação expressa propicia que se verifiquem possíveis irregularidades pelos órgãos de controle e da sociedade.

    b) Notória especialização do profissional a ser contratado: O artigo 25, §1°, da Lei n° 8.666/93 dispõe sobre a notória especialização9, determinando que a escolha recaia sobre profissional com especialização incontroversa. Não basta, desta forma, que o profissional goze da confiança pessoal do gestor público, sendo imprescindível que sua qualificação diferenciada seja aferida por elementos objetivos, reconhecidos pelo mercado, tais como formação acadêmica e profissional (do contratado e de sua equipe); autoria de publicações pertinentes ao objeto da contratação; experiência em atuações pretéritas semelhantes. [9. “Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato”.]

    Embora tais parâmetros permitam certa margem de discricionariedade na análise do que seja profissional capacitado a prestar o serviço mais adequado ao interesse público, é certo que parecem suficientes para estabelecer uma faixa de opções aceitáveis, afastando avaliações puramente pessoais dos administradores públicos. O que a lei permite não é a contratação de talentos ocultos, e sim de prestadores que já são reconhecidos pelo mercado como referências nas suas respectivas áreas.

    c) Natureza singular do serviço: refere-se ao objeto do contrato, ao serviço a ser prestado, que deve escapar à rotina do órgão contratante e da própria estrutura de advocacia pública que o atende. Não basta, portanto, que o profissional seja dotado de notória especialização, exigindo-se, igualmente, que a atividade envolva complexidades que tornem necessária a peculiar expertise. É essa nota de diferenciação que torna inviável a competição, mesmo entre prestadores qualificados, dada a necessidade de um elo de especial confiança na atuação do profissional selecionado. Nesse sentido é a Súmula 3910 do Tribunal de Contas da União. [10. “A inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços técnicos com pessoas físicas ou jurídicas de notória especialização somente é cabível quando se tratar de serviço de natureza singular, capaz de exigir, na seleção do executor de confiança, grau de subjetividade insuscetível de ser medido pelos critérios objetivos de qualificação inerentes ao processo de licitação, nos termos do art. 25, inciso II, da Lei nº 8.666/1993”]

    Podemos afirmar, de acordo com o ensinamento de Marçal Justen Filho, que para definir se o serviço é singular, é necessário apurar se a atividade necessária à satisfação do interesse sob tutela é complexa ou simples, se pode ser reputada como atuação padrão e comum ou não. “A natureza singular caracteriza-se como uma situação anômala, incomum, impossível de ser enfrentada satisfatoriamente por qualquer profissional. Envolve os casos que demandam mais do que a especialização, pois apresentam complexidades que impedem obtenção de solução satisfatória a partir da contratação de qualquer profissional (ainda que especializado)”.11 [11. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo, Dialética, 12º ed., p. 419/420.]

    Nesse sentido, o caráter parcialmente subjetivo da chamada confiança no profissional deve ser objeto de fundamentação por parte do administrador, de modo a permitir o controle intersubjetivo quanto à razoabilidade da escolha administrativa.
    Destaque-se que a natureza singular do serviço não demanda a existência de apenas um único profissional apto, mas sim a existência de característica própria do serviço que justifique a contratação de um profissional dotado de determinadas características, em detrimento de outros potenciais candidatos.

    d) Inadequação da prestação do serviço pelo quadro próprio do Poder Público: muitos municípios contam com quadro próprio e qualificado de procuradores, sendo regra que o exercício da advocacia pública seja por eles desempenhada. Porém, excepcionalmente, nos casos em que fique configurada a impossibilidade ou relevante inconveniência de que a atribuição seja exercida pela advocacia pública, dada a especificidade e relevância da matéria ou a deficiência da estrutura estatal, se admitirá a contratação de advogado particular. Do mesmo modo, a contratação deve ser motivada, expondo as razões que impedem a atuação da advocacia pública a fim de evitar abusos e permitir a fiscalização dos órgãos de controle, bem como da própria sociedade.

    e) Contratação pelo preço de mercado: parâmetro relevante para aferir a legalidade da contratação consiste na verificação do preço a ser pago pelo serviço, nos termos do artigo 48, da Lei n° 8.666/93. Normalmente, a escolha de profissionais de referência na prestação do serviço singular vem acompanhada da cobrança de honorários em patamar compatível. O fato de a contratação direta envolver casos de grande complexidade pode agravar essa circunstância, ensejando a cobrança de elevados honorários. O administrador deve demonstrar que os honorários ajustados estão inseridos dentro da faixa de razoabilidade segundo os padrões do mercado, observadas as características próprias do serviço singular e o grau de especialização profissional.

    Desse modo, a observância desses parâmetros permite uma análise sobre a legalidade da contratação direta de advogados.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    STJ - Recurso Especial 1377703/GO. Julgado em 03/12/2013;
    Contratação de dois escritórios de advocacia para prestar serviços jurídicos de defesa em questões de natureza tributária, administrativa e institucional. Ausência de demonstração de que os serviços contratados sejam singulares, isto é, excepcionais e complexos de modo a justificar a alegação de que seria inexigível a licitação para a escolha do prestador dos serviços.

    STJ - Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 350519/PR. Julgado em 13/05/2014.
    Contratação direta de Advogado para prestar serviços de promoção de medida judicial visando a liberação de ativos retidos pela União referentes aos royalties devidos pela União ao referido Município em decorrência da construção da Usina Hidrelétrica. Ausência da singularidade dos serviços e a necessidade de comprovação, pelo gestor público, de que era impossível instaurar processo de comparação entre os diversos possíveis prestadores dos mesmos serviços.

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    4. EMERGÊNCIA FABRICADA OU SIMULADA

    Fundamento Legal: Artigo 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/93. Dispensa de licitação.

    “Art. 24.  É dispensável a licitação:

    (...)

    IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos”.

    A fraude à licitação nestas situações geralmente ocorre quando o administrador público cria, simula ou mesmo prolonga os efeitos da situação emergencial, sempre com o propósito de justificar a dispensa do processo licitatório e a contratação direta.
    Em verdade, a hipótese de dispensa ora tratada teria aplicação aos casos nos quais o decurso do tempo necessário ao procedimento licitatório pelas vias normais impediria a tomada de medidas indispensáveis a evitar danos irreparáveis.
    É fundamental que a dispensa de licitação esteja baseada em uma verdadeira situação de emergência, entendida aqui como situação excepcional, caracterizada pela iminência de dano a bens, interesses e valores protegidos pelo interesse estatal, caso se aguardasse a normal tramitação do procedimento licitatório.

    A dispensa de licitação nas situações de emergência ou de calamidade pública exige do administrador, portanto, a demonstração de potencialidade real de dano e demonstração de que a contratação é a via adequada e efetiva a eliminar o risco.
    Outros dois importantes aspectos que devem ser analisados nestes procedimentos são: a) a previsibilidade da necessidade de contratação e b) a imprescindibilidade do serviço ou produto contratado.

    O Promotor de Justiça deve analisar e avaliar se o fato alegado como gerador da situação emergencial era ou não previsível objetivamente, isto é, se poderia ou não ter sido previsto pelo administrador público a ponto de permitir a adoção de medidas de cautela para não gerar a emergência e, portanto, ensejar a realização de certame entre os fornecedores. O que se avalia neste caso é se a necessidade de contratação era ou não previsível antes da ocorrência do fato alegado como emergencial.
    O segundo aspecto é a análise sobre o serviço ou produto contratado no que diz respeito à sua imprescindibilidade diante da situação emergencial alegada. Não se trata de analisar simplesmente se o produto/serviço finalmente contratado era ou não adequado para estancar ou fazer frente à situação emergencial exposta, mas sim se era imprescindível, indispensável sua contratação ou aquisição para tal fim.

    Evidente que, diante da situação concreta, muitas particularidades poderão ocorrer e suscitar dúvidas. Todavia, deve-se analisar se sem o produto/serviço contratado a situação emergencial teria ou não seus efeitos cessados ou minimizados, pois, somente diante de resposta afirmativa é que se poderá considerar imprescindível tal contratação. Exemplo: emergência relativa à falta de merenda escolar – aquisição de gêneros alimentícios que compõem a merenda. Eventual aquisição de outros produtos diante de tal situação, ainda que relacionados à educação (material escolar, por exemplo) não terá sido imprescindível para fazer cessar os efeitos da situação emergencial alegada.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    STJRecurso Especial 1188289/SP. Julgado em 14/08/2012

    Contratação direta de empresa, sob a alegação de situação emergencial, para realização de serviços de terraplanagem, pavimentação de rodovias, reencascalhamento, construção e reparo de bueiros, dentre outros, em valor superior a um milhão de reais. A ilicitude está no fato de a contratação ter ocorrido 09 (nove) meses depois dos eventos naturais (fortes chuvas) que deram causa à situação de calamidade pública que a justificaria.

    TJ-SP - Apelação nº 9193422-06.2008.8.26.0000 Sorocaba. Julgado em 10/04/2013.

    Contratação direta, sob a alegação de situação emergencial em favor de empresa para cobrança e composição amigável de créditos de tributos municipais. A emergência estaria no fato de que uma decisão judicial proferida em sede de Ação Popular havia determinado a suspensão de outro contrato firmado pelo mesmo Município para os mesmos serviços, sob a alegação de que aqueles serviços deveriam ser executados por pessoal próprio da Prefeitura. Portanto, não havia emergência que justificasse a contratação direta.

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    5. A RESPONSABILIDADE DO PROCURADOR DO ENTE PÚBLICO PELO
    PARECER APRESENTADO

    Fundamento legal: artigo 38, inciso VI, e parágrafo único da Lei nº 8.666/93.
    Questão importante relativa à ausência de licitação envolve a responsabilidade dos advogados públicos pelos pareceres envolvendo inexigibilidade ou dispensa indevidas.

    Não há dúvidas de que os advogados integrantes da Administração Pública ou contratados para o exercício de funções públicas específicas, se sujeitam ao regime jurídico administrativo de responsabilidade pela prática de atos de improbidade administrativa.
    A lei nº 8.429/92, em seu artigo 2º, considera agente público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios ou de Território.

    Desse modo, a lei de improbidade se aplica ao advogado que ocupe cargo em comissão, cargo efetivo ou tenha sido contratado para o exercício de função pública, quer de maneira permanente ou transitória, com ou sem remuneração, nas entidades mencionadas, quando vier a praticar ação ou omissão, dolosa ou culposa, que gere enriquecimento ilícito, cause lesão ao erário ou viole os princípios da Administração Pública.

    Estabelecida a possibilidade de responsabilização pela prática de improbidade administrativa, importante destacar que o artigo 38 da lei de licitações (Lei nº 8.666/93), ao disciplinar o procedimento licitatório, estabeleceu que os procuradores públicos promoverão: a) a juntada oportuna de pareceres técnicos ou jurídicos emitidos sobre a licitação, dispensa ou inexigibilidade (inciso VI) e b) prévio exame e aprovação das minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes a serem travados com a Administração (parágrafo único).

    Desse modo, a lei de licitações não apenas atribuiu ao procurador público a incumbência específica de elaborar pareceres jurídicos, mas também estabeleceu que o exame e aprovação prévios de minutas, contratos, convênios e ajustes pela assessoria jurídica constituem condições de validade para sua celebração pela Administração Pública.
    Porém, a questão consiste em saber se o procurador público seria responsável pela prática de improbidade administrativa toda vez que tiver elaborado parecer por dispensa ou inexigibilidade de licitação considerada indevida ou aprovado minutas e outros ajustes sem observância das regras legais.

    A discussão tem lugar na doutrina, porquanto durante muito tempo, com base em aresto do Supremo Tribunal Federal12, sustentou-se que os pareceres elaborados pelos procuradores públicos consistiriam em simples manifestações opinativas, não constituindo atos administrativos que pudessem ser objeto de responsabilização, a não ser quando demonstrado que o profissional laborou com culpa, em sentido largo, ou que cometeu erro grave, inescusável. [12. Mandado de segurança nº 24073, j. 06.11.2002]

    Posteriormente, por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança nº 24.584-1 do Distrito Federal, julgado em 9 de agosto de 2007, teve lugar, também no STF, debate a respeito da natureza do parecer emitido pelo procurador público, oportunidade em que o Ministro Joaquim Barbosa, citando ensinamento do administrativista francês René Chapus, classificou os pareceres jurídicos em três espécies: os facultativos, nos quais a prolação da opinião do procurador é facultativa, e o administrador a ela não se vincula; os obrigatórios, quando a manifestação é obrigatória e, caso dela discorde, a autoridade deve submeter novo ato a análise; e os vinculantes, quando, ou a autoridade age conforme o parecer ou, simplesmente, não age.

    Conforme destacado por José Vicente Santos de Mendonça13, o parecer facultativo, no silêncio da lei, não geraria, em princípio – porque com as ressalvas do dolo e da culpa –, responsabilidade. Já o parecer obrigatório atribuiria responsabilidade ao subscritor (compartilhada com a do administrador), e esse seria o caso dos pareceres havidos com base no artigo 38, parágrafo único, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. [13. Conforme José Vicente Santos de Mendonça in “A responsabilidade pessoal do parecerista público em quatro standards”. Disponível em: http://download.rj.gov.br/ documentos/10112/263739/DLFE-30775.pdf/10AResponsabilidadePessoaldoParecerista Publicoemquatrostandards.pdf. Acesso em 29.01.2015.]

    Dessa forma, é possível afirmar que os pareceres “obrigatórios” não se limitam a manifestações meramente opinativas, consubstanciando-se em verdadeiros atos administrativos expedidos no desempenho de função pública, de modo que ao exercer tal função, o procurador público submete-se ao regime jurídico do Direito Público, devendo zelar pelo interesse público e observar os princípios constitucionais da Administração Pública. Caso assim não proceda, se submeterá às penalidades da improbidade administrativa.

    Por outro lado, é oportuno destacar que os pareceres “facultativos”, quais sejam, os consistentes em opiniões a respeito de determinada questão, também podem ensejar responsabilidade do procurador jurídico quando demonstrado que foram elaborados com o fim de justificar a prática de ato ímprobo. A opinião pessoal não pode ser identificada com eventual fundamentação inidônea ou justificativa ilegal. A liberdade opinativa do procurador público encontra limites, devendo ser fundamentada em critérios seguros de legalidade, não podendo aludir a legislação que exige coisa diversa do que ali se fez constar para referendar um pedido despedido de elementos materiais de plausibilidade.

    Não há como excluir, prima facie, a elaboração de parecer jurídico das hipóteses de ato de improbidade administrativa apenas por não possuir caráter vinculante ou conteúdo decisório. A função meramente opinativa do parecer não induz automaticamente à inadequação típica, pois caso o parecer jurídico seja elaborado com o fim de justificar ato de improbidade administrativa, é possível a inclusão do parecerista no pólo passivo da ação de improbidade. Para tanto, repita-se, é preciso que, desde o nascedouro, a má-fé tenha sido o elemento subjetivo condutor da realização do parecer. Em situações como essa não há como se entender que o consultor jurídico está albergado pelas prerrogativas profissionais.

    Esse entendimento encontra apoio na doutrina de Waldo Fazzio Junior14, para quem “é sempre interessante observar que, em regra, os pareceres técnicos emitidos pelos agentes públicos, no bojo dos procedimentos administrativos, têm natureza opinativa, e não vinculativa. Aliás, sequer configuram ato administrativo. Este advirá se e quando se concretizar a manifestação de vontade da Administração Pública. É a regra. O que não significa que todos os pareceres rotulados como opinativos estejam imunes à responsabilização de seu autor. É o caso anômalo do parecer opinativo formulado com o visível intuito de justificar ato de improbidade administrativa, restando demonstrada, inequivocamente, a má-fé que o moveu. Aqui, excepcionalmente, admite-se a inserção do parecerista no pólo passivo de ação de improbidade administrativa”. [14. Improbidade administrativa. São Paulo: Atlas, 2012. p. 62.]

    Conforme consigna Renato de Lima Castro15, “o advogado público que, dolosa ou culposamente, apresenta parecer teratológico, desconectado com o fato submetido à sua apreciação, ou se omite de registrar orientações doutrinárias aplicáveis à espécie, ou de enfatizar a inexistência de suporte fático que admita a incidência das regras excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licitação, ou, ainda, que se pronuncia favoravelmente a descabidas situações de dispensa ou inexigibilidade de licitação; que apresentam pareceres contraditórios, ou seja, em determinado momento, o advogado público se orienta, acerca de um tema, em determinado sentido e, em outra oportunidade, em caso idêntico, manifesta-se em sentido diametralmente oposto (sem, é lógico, justificar a alteração de posicionamento), poderá ser responsabilizado pela prática de Ato de Improbidade Administrativa”. [15. “A Intervenção do advogado público e sua responsabilidade, no regime jurídico administrativo” in Ministério Público: prevenção, modelos de atuação e a tutela dos diretos fundamentais, Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p.134.]

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    6. FORNECEDOR EXCLUSIVO

    Fundamento legal: artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.666/93. Inexigibilidade de licitação.

    “Art 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

    I – para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes”.

    Problema muitas vezes enfrentado, o contrato realizado sem licitação com fornecedor exclusivo deve ser muito bem analisado, posto que, não raras vezes, o dirigismo é recorrente.

    Não é difícil se verificar, quando da contratação sem licitação, o administrador público contratando empresa ou profissional de forma maculada, dirigida, inibindo a disputa entre pessoas jurídicas e físicas que poderiam prestar idênticos serviços ou fornecer produtos muito similares (e que também serviriam a Administração).

    E, deveras, isso decorre do entendimento do administrador de que os materiais e equipamentos somente podem ser fornecidos por esta ou aquela empresa, porém ao arrepio da legislação.

    Como sabido, as aquisições realizadas pelo Poder Público devem ocorrer, em regra, mediante licitação. Há exceções que justificam a dispensa ou a inexigibilidade, entretanto não pode o administrador interpretar da forma que quiser, que melhor lhe convenha, tais regras que fogem à regra. Mesmos as exceções devem sempre acontecer visando ao interesse público, nunca o próprio administrador ou determinados fornecedores.

    Segundo Marçal Justen Filho, “de modo geral, poderia dizer-se que a inviabilidade de competição apenas ocorre em casos em que o interesse público apresenta peculiaridades e anomalias. Quando o interesse público puder ser satisfeito por uma prestação padrão, desvestida de alguma peculiaridade, a competição será possível e haverá licitação. Deve destacar-se, portanto, que a inviabilidade de competição ocorre em casos em que a necessidade estatal apresenta peculiaridades que escapam aos padrões de normalidade. A disputa entre particulares por contratos administrativos retrata as peculiaridades do mercado, apto a atender satisfatoriamente as necessidades usuais, costumeiras, padronizadas.” 16 [16. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 8ª ed., São Paulo, Dialética, 2000, p. 278.]

    Assim, é primordial que, antes da contratação, o agente público tome o máximo de cautela para averiguar se, efetivamente, aquele bem somente pode ser fornecido por uma única empresa ou um único produtor.

    O E. Tribunal de Contas da União, após reiteradas decisões, sumulou o assunto:

    Súmula 255: “Nas contratações em que o objeto só possa ser fornecido por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, é dever do agente público responsável pela contratação a adoção das providências necessárias para confirmar a veracidade da documentação comprobatória das condições de exclusividade.”

    O E. Tribunal de Contas do Estado de São Paulo também firmou entendimento sobre o assunto, sob o viés de que, dentre as cautelas necessárias, o Administrador deve exigir prova da exclusividade através de patentes ou atestados dos órgãos de classes dos fornecedores:

    Súmula 5: “A prova da exclusividade na aquisição de material, como justificativa de dispensa de licitação, não deve se limitar a declaração da própria firma, mas demonstrada através de patentes ou atestados dos órgãos de classe”.
    Tomando-se por base tais enunciados, conclui-se que não pode o administrador decidir pela não realização de licitação sob o fundamento de que os produtos ou equipamentos devem ser desta ou daquela marca, ou apresentar características tão específicas que somente um fornecedor será capaz de cumpri-las.

    Ademais, em tempos de globalização, de expansão da industrialização e da tecnologia, dificilmente um só fornecedor será o habilitado para a entrega do produto ao Poder Público, motivo pelo qual a análise deve ocorrer de forma sempre cautelosa, o que sem dúvida evitará dispensas indevidas de licitação.

    Ainda de acordo com Marçal Justen Filho, “a decisão de contratar tem de ser antecedida de verificações acerca das diferentes soluções técnicas-científicas disponíveis para atender ao interesse público. Essa atividade administrativa prévia deverá conduzir à seleção de uma das alternativas como a melhor. A melhor alternativa deve ser avaliada não apenas sob o enfoque de critérios técnicos, mas também econômicos. Deve estabelecer-se uma relação entre os benefícios qualitativos que serão obtidos e os possíveis encargos financeiros com que o Estado arcará. Nada impede que a melhor solução técnica seja afastada em face de limitações orçamentárias. Lembre-se que o modelo consagrado pela Lei nº 8.666 é permeado por essa preocupação com o menor desembolso possível. Nessa linha, a própria licitação de melhor técnica envolve a escolha da proposta que importar o menor custo possível. Ou seja, o dever de considerar vantagens e encargos existe mesmo na fase interna da atividade administrativa, quando a Administração cogita de escolher dentre diversas alternativas para satisfazer suas necessidades”. 17 [17. Obra citada, p. 279/280.]

    Aliás, não basta a justificativa de que o produto seja patenteado para que o administrador justifique a compra, deve ocorrer a análise de que não existem produtos similares capazes de atender à necessidade pública.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    TJSP - Apelação com revisão nº 959.188.5/3-00 - Franca

    STJ - Recurso em mandado de segurança nº 37688 - MG

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    CAPÍTULO 03

    FRACIONAMENTO ILÍCITO DO OBJETO

    Fundamento legal: artigo 23, parágrafo 1º e seguintes e artigo 24, incisos I e II da Lei nº 8.666/93.
    “Art. 23.

    (...)

    § 1o As obras, serviços e compras efetuadas pela Administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala.

    § 2o Na execução de obras e serviços e nas compras de bens, parceladas nos termos do parágrafo anterior, a cada etapa ou conjunto de etapas da obra, serviço ou compra, há de corresponder licitação distinta, preservada a modalidade pertinente para a execução do objeto em licitação.

    § 3o A concorrência é a modalidade de licitação cabível, qualquer que seja o valor de seu objeto, tanto na compra ou alienação de bens imóveis, ressalvado o disposto no art. 19, como nas concessões de direito real de uso e nas licitações internacionais, admitindo-se neste último caso, observados os limites deste artigo, a tomada de preços, quando o órgão ou entidade dispuser de cadastro internacional de fornecedores ou o convite, quando não houver fornecedor do bem ou serviço no País.

    § 4o Nos casos em que couber convite, a Administração poderá utilizar a tomada de preços e, em qualquer caso, a concorrência.

    § 5o É vedada a utilização da modalidade “convite” ou “tomada de preços”, conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de “tomada de preços” ou “concorrência”, respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade diversa daquela do executor da obra ou serviço.

    Art. 24.  É dispensável a licitação: 

    I – para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea “a”, do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente;

    II – para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea “a”, do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez.

    Depreende-se do artigo 23 da Lei de Licitações que é vedado o fracionamento de despesas para adoção de dispensa de licitação ou modalidade de licitação menos rigorosa que a determinada para a totalidade do valor do objeto a ser licitado.
    Ocorre fracionamento ilegal (ou divisão ilícita do objeto) quando se utiliza modalidade de licitação inferior à recomendada pela legislação para o total da despesa ou para efetuar contratação direta. Por exemplo: convite, quando o valor determinar tomada de preços ou concorrência; ou tomada de preços, quando o valor for de concorrência.

    Assim, se o administrador público optar por realizar várias licitações ao longo do exercício financeiro, para um mesmo objeto ou finalidade, deverá preservar sempre a modalidade de licitação pertinente ao todo que deveria ser contratado. Muitas vezes o fracionamento ocorre pela ausência de planejamento18 do quanto vai ser efetivamente gasto no exercício para a execução de determinada obra, ou a contratação de determinado serviço ou ainda a compra de determinado produto. O planejamento do exercício deve observar o princípio da anualidade do orçamento. Logo, não pode o agente público justificar o fracionamento da despesa com várias aquisições ou contratações no mesmo exercício, sob modalidade de licitação inferior àquela exigida para o total da despesa no ano, quando decorrente da falta de planejamento. [18. Vide artigos 8º e 15 da Lei de Licitações.]

    A legislação admite, todavia, o parcelamento do objeto para a contratação de parcelas de natureza específica sempre que se mostrarem necessárias e economicamente viáveis, com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade. Em hipótese tais, a cada etapa deverá corresponder licitação distinta, preservada a modalidade pertinente para o conjunto dos certames.

    O TCU possui diversas deliberações a respeito do fracionamento ilícito do objeto, sendo relevante destacar algumas delas19: [19. TCU “Licitações e Contratos”, 3ª. ed. http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/ comunidades/licitacoes_contratos/10%20Fracionamento%20de%20Despesa.pdf]

    Vale observar, outrossim, que não se deve realizar licitações distintas para a contratação de serviços de mesma natureza, mesmo em locais diversos, quando os potenciais interessados são os mesmos.

    A Lei nº 8.666/93, ao utilizar o termo mesmo local (art. 23, § 5º) denota sentido de região geoeconômica, ou seja, a área de atuação profissional, comercial ou empresarial dos possíveis fornecedores ou prestadores de serviço a serem contratados pela Administração.

    Advertem Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, que “a identificação da fraude, empreitada nem sempre fácil de ser ultimada, deve ser feita com a individualização dos seguintes fatores: a) preexistência, por ocasião da primeira licitação, das situações fáticas que serviram de elemento deflagrador dos demais; b) idêntica natureza dos objetos das sucessivas licitações; c) ausência de situação excepcional (de natureza econômica, social, etc.) que pudesse justificar a limitação do montante de cada uma das contratações (art. 23, § 1º da Lei 8.666/93; d) que a licitação das partes, no caso de fracionamento justificado por situação excepcional, não observe a modalidade que seria realizada para o todo (arts. 23, § 2, e 7º, §. 1º, da Lei 8.666/93); e e) proximidade temporal entre as licitações, o que será verificado em conformidade com as peculiaridades do caso. Em casos tais, tem-se determinadas operações que, consideradas em sua individualidade, são lícitas, mas que visualizadas em conjunto perseguem um fim juridicamente ilícito, sendo nulas de pleno direito.” 20 [20. Improbidade administrativa, São Paulo: Saraiva, 7ª ed., p. 486.]

    Coisa diversa, todavia, é o parcelamento descrito no artigo 23, § 1º, em que se verifica a realização de sucessivas licitações, de modo simultâneo ou subsequente, dentro de um mesmo exercício financeiro, com observância da mesma modalidade licitatória. Em casos tais, há possibilidade de o objeto a ser licitado sofrer divisões sempre que tal se mostrar técnica e economicamente viável.
    Digno de nota, outrossim, observação no seguinte sentido: o fracionamento da despesa caracteriza-se por dividir o valor a ser contratado para utilizar modalidade de licitação inferior à prevista pela lei ou para realizar a contratação direta, valendo-se da possibilidade de dispensa previstas nos incisos I e II do artigo 24. Trata-se de prática ilícita, cujo procedimento é vedado pelo art. 23, §§ 2º e 5º, da Lei 8.666/93.

    Já o parcelamento do objeto não só é permitido, como se trata de um dever legal do gestor público, conforme previsto no art. 23, § 1º, da Lei 8.666/93. Nesse sentido, a referida lei corporifica dois princípios da licitação: parcelamento e proibição de fracionamento, princípios estes que visam à preservação da isonomia e a obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração (conforme Acórdão 1.780/2007, Plenário, relator Ministro Raimundo Carreiro. Processo: TC-005.517/2005-9).

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    TJ-SP – Apelação nº 0000117-24.2004.8.26.0172, da Comarca de Eldorado. Julgado em 16/06/2014;
    Licitação simulada e fracionada. Configuração de fraude. Superfaturamento.

    TJ-SP – Apelação nº 0000899-89.2012.8.26.0062, da Comarca de Bariri. Julgado em 29/04/2014;
    Dispensa indevida de processo licitatório. Fracionamento ilegal do objeto da contratação e dos pagamentos, mediante 73 notas fiscais de serviços cada uma de valor qualificado para dispensa de licitação, mas cuja soma supera o tal limite.

    STJ – Recurso Especial nº 1.245.765 - MG (2011/0040108-7);
    Carta-convite. Modalidade de licitação inadequada. Licitante vencedora. Quadro societário. Filha do Prefeito.

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    CAPÍTULO 04

    FRAUDE NO PREÇO DO PRODUTO OU SERVIÇO – SUPERFATURAMENTO E JOGO DE PLANILHAS

    Fundamentos Legais: artigo 7º e 40 da Lei nº 8.666/93.

    “Art. 7o As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência:

    (...)

    § 2o As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando:

    (...)

    II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários;
    Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:

    (...)

    X - o critério de aceitabilidade dos preços unitário e global, conforme o caso, permitida a fixação de preços máximos e vedados a fixação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em relação a preços de referência, ressalvado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 48;

    (...)

    § 2o Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante:

    (...)

    II - orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários.

    Analisando em conjunto os dispositivos acima transcritos, é possível concluir que a Administração Pública deve possuir, previamente à abertura do processo licitatório, um conjunto de informações seguras e o mais precisas possível a respeito dos preços dos produtos ou serviços que pretende contratar. Estas informações, que compõem o orçamento prévio a ser apresentado pelo órgão licitante por ocasião da abertura do processo licitatório, servirão de parâmetro para a oferta de preços pelos futuros concorrentes, sendo fator decisivo no julgamento das propostas.

    Jessé Torres Pereira Júnior e Marinês Restelatto Dotti21 asseveram que “o Tribunal de Contas da União, por meio do Acórdão nº 64/04, Segunda Câmara, assentou o entendimento de que os preços estimados e o critério de aceitabilidade de preços são fundamentais para o futuro julgamento das propostas, e que contratar com valores superiores ao orçado, sem justificativa ou comprovação, é falta grave, atraente de sanção. Admite-se, uma vez fixado o valor estimado para a contratação, decorrente de ampla pesquisa de mercado, o exame de compatibilidade entre o preço estimado e o proposto, devidamente justificado pela Administração. Preço estimado, segundo o Tribunal de Contas da União, é o parâmetro de que dispõe a Administração para julgar licitações e efetivar contratações, desde que reflita o preço de mercado”. [21. Políticas Públicas nas Licitações e Contratações Administrativas, Editora Fórum, 2ª edição, p. 207.]

    Neste ambiente, algumas fraudes incidentes sobre os preços constantes das propostas dos licitantes têm sido comumente constatadas, delas resultando considerável prejuízo aos cofres públicos.

    Em regra, os órgãos licitantes apresentam uma estimativa de preços para a contratação do produto ou serviço. As ofertas apresentadas durante o processo de licitação, qualquer seja seu tipo ou modalidade, devem ser, em regra, inferiores ao orçamento apresentado pelo órgão licitante.

    Propostas com preços superiores devem ser imediatamente rechaçadas, sob pena de caracterização de dano ao erário e improbidade administrativa, salvo em situações excepcionais, tal como nas licitações do tipo melhor técnica. A respeito do tema, Evelise Teixeira Prado Vieira destaca que “constitui indício de excessividade do preço o fato de ele ser superior ao preço médio orçado pela Administração. Na pesquisa de mercado realizada, obrigatoriamente, na fase interna da licitação, deve o Poder Público consultar o mercado para obter os valores dos bens e serviços que pretende contratar. Tais elementos deverão possibilitar a obtenção aritmética, que representará o valor médio da contratação”.22 [22. Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública comentada. São Paulo: Verbatim, p. 267.]

    Entretanto, mesmo nas propostas com preços inferiores ao orçamento do ente licitante, o dano ao erário poderá ocorrer. Diversas são as formas em que este expediente fraudulento se materializa. Procuraremos comentar algumas delas, sem, contudo, esgotar as hipóteses de fraude, o que pensamos ser praticamente impossível.

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    1. Orçamento superfaturado

    A primeira delas é o orçamento superfaturado. É possível que o orçamento apresentado pelo ente licitante esteja superfaturado, ou seja, contenha estimativa de preços que não se coaduna com os praticados pelo mercado.

    Nesta hipótese, a fraude pode ocorrer na colheita de informações para elaboração do orçamento estimativo de preços pelo ente licitante, o que pode se dar mediante prévio ajuste entre agentes públicos (a comissão de licitação ou alguns de seus membros) e as empresas que forneceram os orçamentos superfaturados; ou também pode ocorrer fraude na oferta de preços pelos competidores, o que se dá em decorrência de conluio entre os potenciais prestadores de serviços para superfaturar o orçamento inicial. Em qualquer dos casos, o resultado é um orçamento superfaturado para que a proposta ao final vencedora seja aparentemente vantajosa ao erário do ente licitante, mas, de fato, prejudicial a ele, pois fixada em preço acima da média de mercado.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    2. Jogo de planilhas

    A segunda hipótese em que comumente ocorrem fraudes na composição de preços de serviços ou produtos é a que se conhece como “jogo de planilhas”.

    Já vimos acima que é dever legal do órgão licitante apresentar planilha detalhada contendo a estimativa de preços, com todos os itens que compõem o serviço ou obra a ser executada, especificando os quantitativos de cada um destes itens. Evidente que as informações contidas nestas planilhas devem ser justificadas pelo órgão licitante, que deverá esclarecer e fundamentar tecnicamente os dados constantes de seu orçamento.

    A doutrina tem se posicionado a respeito deste tema. Marçal Justen Filho leciona que “é um dever jurídico da Administração Pública elaborar a planilha mais consistente possível. Isso significa a necessidade de estimar todos os itens de custos, tomar em vista todas as despesas diretas e indiretas e atingir um resultado que seja respaldado por informações objetivas. Haverá violação aos deveres administrativos (senão crime) quando a autoridade administrativa produzir uma planilha sem base em dados concretos e objetivos. Essa orientação aplica-se não apenas em relação a planilhas que atingem valores superes àqueles respaldados pelo conhecimento. Também é um despropósito a Administração prever um resultado inferior àquele necessário à execução do objeto”. 23 [23. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 15ª ed., 2012, p. 161.]

    O jogo de planilhas é uma prática fraudulenta consistente na inserção de valores superiores aos de mercado para um item de composição dos serviços que possua quantidade pequena, com a correspondente inserção de valor inferior ao de mercado para um item com quantidade maior.


    Explicitando:
    Item da planilha com pequena quantidade
    (exemplo: grama) – valor superior ao mercado
    +
    item da planilha com grande quantidade
    (exemplo: concreto) – valor inferior ao de mercado
    =
    Preço final compatível com o de mercado e
    aparentemente vantajoso ao erário.

    Conforme se observa, o produto final da operação acima resulta em preço aparentemente vantajoso ao erário, compatível com o praticado no mercado. Com base neste preço, a empresa licitante é declarada vencedora da disputa.

    Uma vez celebrado o contrato e iniciada a execução de seu objeto, a empresa contratada (ou o próprio órgão contratante) manifesta a necessidade de aditamento do contrato para ajuste de alguns quantitativos dos itens que compõem a planilha de serviços. Assim, aquele item cuja quantidade era pequena, mas cujo valor era superior ao de mercado, tem seus quantitativos aumentados consideravelmente. O resultado desta modificação é um preço final superfaturado.

    Note-se que nesta situação o item alterado no aditamento contratual foi apenas aquele fixado em pequena quantidade, mas com preço superfaturado, rendendo ensejo, consequentemente, a um preço final muito acima da média de mercado, com inegável prejuízo ao erário.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    CAPÍTULO 05

    DIRECIONAMENTO E CLÁUSULAS RESTRITIVAS

    Fundamento legal: artigos 37, inciso XXI da Constituição Federal e artigos 2º, 3º ,41, 43 e 44 da Lei 8.666/93.
    Inconteste é que a licitação deve observar os princípios elencados na Lei nº 8.666/93. A não observância a tais princípios (legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade entre os concorrentes, publicidade, probidade, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo, etc.), implica na frustração do procedimento licitatório e, por conseguinte, na caracterização de ato de improbidade.

    Da análise do § 1º do artigo 3º extrai-se que é vedado ao Poder Público inserir cláusulas que inviabilizem a disputa e comprometam o princípio da igualdade entre os concorrentes. Trata-se do princípio da isonomia, em destaque no presente capítulo:

    “Art. 3º:

    (...)

    § 1o É vedado aos agentes públicos:

    I – admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3º da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991;

    II – estabelecer tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra, entre empresas brasileiras e estrangeiras, inclusive no que se refere a moeda, modalidade e local de pagamentos, mesmo quando envolvidos financiamentos de agências internacionais, ressalvado o disposto no parágrafo seguinte e noart. 3º da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991.”

    De acordo com Marçal Justen Filho24, a isonomia no procedimento licitatório incide em dois momentos diversos: na elaboração do ato convocatório e no curso do certame. Adverte o autor que “... o ato convocatório viola o princípio da isonomia quando: (a) estabelece discriminação desvinculada do objeto da licitação; (b) prevê exigência desnecessária e que não envolve vantagem para a Administração; (c) impõe requisitos desproporcionados com necessidades da futura contratação; e (d) adota discriminação ofensiva de valores constitucionais ou legais”. [24. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, São Paulo: Dialética, 15ª ed., 2012, p. 60 e s.]

    Já no curso do certame a violação ao princípio da isonomia se verifica no conluio entre os participantes e/ou entre estes e o agente público.

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    1. FRAUDE NA ELABORAÇÃO DO ATO CONVOCATÓRIO

    O objeto da licitação deve ser individualizado em conformidade com as necessidades da Administração Pública e o interesse a ser alcançado. Verifica-se a fraude sempre que forem inseridas cláusulas inúteis ao fim visado e que inviabilizem a disputa. Outrossim, não podem ser exigidas características específicas do licitante, que não estejam de acordo com a natureza do objeto licitado.
    A Lei de Licitações, nos artigos 27 e seguintes, prevê as exigências a serem supridas pelos interessados, por ocasião da habilitação, tecendo esclarecimentos quanto à documentação relativa à habilitação jurídica; qualificação técnica; qualificação econômico-financeira; regularidade fiscal e trabalhista e cumprimento do disposto no inciso XXXIII do artigo 7º da CF. Vale observar que para a habilitação jurídica (art. 28) e regularidade fiscal (art. 29) a Lei usa expressão consistirá, o que denota autorização para requisição dos documentos elencados no dispositivo. Já para a qualificação técnica e qualificação econômico-financeira, a Lei utiliza a expressão limitar-se-á, o que evidencia a possibilidade de exigência apenas dos documentos necessários. Nessa esteira, “toda e qualquer exigência que venha a ser feita haverá de estar antecedida de justificativa cabível”.25 [25. Sergio Ciquera Rossi, “Experiência do Controle Externo na Fiscalização de licitações e contratações Públicas” – Doutrina – Revista do TCESP no. 129 – jul a nov/13.]

    As principais fraudes relacionadas à formulação do edital referem-se à descrição do objeto a ser comprado ou contratado e condição de habilitação para as empresas. É estratégia frequente a exigência de qualificações técnicas muito detalhadas e específicas para a prestação de serviço ou compra de produto geralmente beneficiando apenas um dos concorrentes.

    A guisa de ilustração, em acréscimo às irregularidades do edital mencionadas no início do presente estudo (Capítulo 1 – item 3.3), coletamos julgados proferidos por ocasião da análise prévia de editais26, pelo TCE/SP e TCU, em que não foram aceitas as seguintes imposições consideradas abusivas: [26. Nos termos do artigo 113 da Lei 8.666/93.]

    a) exigência de cláusulas que impõem a identificação e a mobilização prévia, por todos os licitantes, de seus veículos, funcionários e instalações, já para a sessão pública, eis que referem-se a ferramentas para a produção de serviços ao longo do contrato (TCE/SP Pleno – Sessão: 8/10/2014 M00200004358/989/14-3, 00004393/989/14-0, 00004402/989/14-9, 00004415/989/14-4 e 00004417/989/14-2 - Acórdão - Relatório e voto)

    Concluiu-se que cláusulas com tais exigências violavam o disposto no § 6º do artigo 30 da Lei de Licitações27, motivo pelo qual deveriam ser revisadas, a fim de que a vistoria prévia e os documentos lá previstos fossem impostos apenas e tão somente à licitante que se sagrasse vencedora do certame, podendo o edital requisitar das demais licitantes somente a declaração formal de disponibilidade, sob as penalidades cabíveis, tal qual dispõe a Lei de Regência. [27. Art. 30, § 6º. As exigências mínimas relativas a instalações de canteiros, máquinas, equipamentos e pessoal técnico especializado, considerados essenciais para o cumprimento do objeto da licitação, serão atendidas mediante a apresentação de relação explícita e da declaração formal da sua disponibilidade, sob as penas cabíveis, vedada as exigências de propriedade e de localização prévia.]

    b) exigência de prova da propriedade dos veículos necessários a execução dos serviços, bem como especificação do ano de fabricação (TC-041897/026/09, TC- 042208/026/09 - Acórdão - Relatório e voto e TC 2806.989.14-1, em sessão de 20/08/2014)

    Entendeu-se que os veículos poderiam ser disponibilizados por outros meios, como contratos de leasing ou locação, e que a indicação do ano de fabricação poderia afastar do certame proponentes que disponham de veículos e maquinários em perfeitas condições de uso.

    Importante destacar, quanto aos itens “a” e “b”, por oportuno, a Súmula 14 do TCE/SP:
    SÚMULA Nº 14 - Exigências de comprovação de propriedade, apresentação de laudos e licenças de qualquer espécie só são devidas pelo vencedor da licitação; dos proponentes poder-se-á requisitar tão somente declaração de disponibilidade ou de que a empresa reúne condições de apresentá-los no momento oportuno.

    c) exigência de apresentação de amostras na fase de habilitação28 [28. Itens “c”, “d” e “e” extraídos do julgado TCE/SP (TRIBUNAL PLENO SESSÃO: 20/02/13, EXAME PRÉVIO DE EDITAL TC-000033/989/13-8 - Acórdão - Relatório e voto, SEÇÃO MUNICIPAL) em certame que tinha por objetivo a aquisição de Kits de uniforme escolar com entrega ponto a ponto.]
    Entendeu-se que somente poderia ser exigida amostra do licitante classificado em primeiro lugar, após a fase de lances como condição para sua contratação, e que somente poderia ser exigida apresentação de amostras personalizadas se fosse concedido prazo razoável para o licitante em primeiro lugar confeccioná-las (no mínimo alguns dias). E ainda: os critérios de análise das amostras deveriam se resumir à verificação da observância das especificidades descritas no edital, com critério do julgamento objetivo.

    d) previsão de possibilidade de participação de empresas nas quais acionistas com participação minoritária sejam servidores da Prefeitura 29 [29. Idem]
    Determinou-se a retificação, vedando-se a participação direta ou indireta de servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação nos exatos termos do artigo 9º da Lei nº 8.666/93.
    Vale destacar que essa vedação subsiste ainda que o servidor esteja licenciado, em virtude do vínculo existente com a Administração Pública.

    e) aglutinação de objetos distintos em um único lote30 [30. Idem.]
    Em licitação para aquisição de kits de uniforme para educação infantil, educação fundamental e especial, educação jovem e adulta, e educadores, realizadas em um único lote, constatou-se violação ao artigo 15, inciso IV da Lei nº 8.666/93, em virtude da previsão de contratação conjunta, com um mesmo licitante, dos quatro “Kits” distintos. Determinou-se a divisão do objeto em itens, a fim de que cada kit de uniforme correspondesse a um item e o critério de julgamento fosse o menor preço por item, elaborando-se pesquisa prévia de preços para orçamento em atendimento ao § 1º do artigo 15 da Lei nº 8.666/93. Determinou-se, ainda, que fosse refeita a pesquisa prévia, cotando os produtos individualmente (para verificar se não há distorções de custo dentro dos componentes), separando os kits em lotes ou itens, e adequando os números da pesquisa aos do futuro certame a ser empreendido.31 [31. Idem.]

    Sobre o fracionamento do objeto, importa considerar que o artigo 15, inciso IV, da Lei 8.666/93 estabelece que as compras, sempre que possível, deverão ser subdivididas em tantas parcelas quantas necessárias para aproveitar as peculiaridades do mercado, visando economicidade.

    E o artigo 23, § 1º, da mesma lei, também determina que as obras, serviços e compras efetuadas pela administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala.
    Já o § 7º do mesmo dispositivo prevê que na compra de bens de natureza divisível e desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo, é permitida a cotação de quantidade inferior à demandada na licitação, com vistas a ampliação da competitividade, podendo o edital fixar quantitativo mínimo para preservar a economia de escala.

    Assim, sempre que a falta de divisão do objeto licitado puder implicar em contratação mais onerosa e restrição à competitividade, necessária a correção.

    Imperioso destacar que a aglutinação em um único certame de objetos absolutamente distintos, mesmo com a permissão da formação de consórcios ou autorização para subcontratação, pode se caracterizar como prática restritiva a ser repelida. A propósito vale conferir o seguinte julgado: TC-001046/003/05 - Acórdão - Relatório e voto, 1ª. Camara, Sessão de 11/03/2014, Rel. Conselheiro Renato Martins Costa, em que se decidiu que a reunião de elevado número de serviços em um único procedimento, em detrimento de sua segregação, senão em diversas licitações, ao menos em lotes, sem qualquer comprovação de satisfação do interesse público, consiste em prática reprovável.

    f) exigência de distribuição mínima de mais de 20 mil exemplares diários, comprovados pelo IVC
    Em licitação visando a contratação de prestação de serviço especializado de publicação de leis, atos oficiais, extratos de procedimentos licitatórios, notícias e publicações institucionais de interesse público relativas ao Poder Executivo Municipal, em jornal de grande circulação e em jornal local, exigiu-se prova de distribuição mínima de 60.000 (sessenta mil) exemplares diários (circulação paga + assinantes), comprovados pelo Instituto Verificador de Circulação – IVC.
    Recomendou o TCE-SP que a Municipalidade promovesse a retificação do Edital, estabelecendo tiragem mínima do jornal de grande circulação no Estado em 20.000 (vinte mil) exemplares diários. E ainda: que a comprovação da tiragem mínima do jornal de grande circulação no Estado seja feita por qualquer meio idôneo competente para tal mister.32 [32. TRIBUNAL PLENO – SESSÃO: 27/08/2014, EXAME PRÉVIO DE EDITAL, SEÇÃO MUNICIPAL (M-006) PROCESSO: TC–003038/989/14-1 - Acórdão - Relatório e voto. No mesmo sentido: TC- 001345/989/12-3 (Sessão Plenária de 06/02/13, sob Relatoria do E. Conselheiro Robson Marinho), TC-034356/026/11 - Acórdão - Relatório e voto (Sessão Plenária de 07/12/11, sob Relatoria da Conselheira Cristiana de Castro Moraes) e TC- 000216/989/13-7 - Acórdão - Relatório e voto (Sessão Plenária de 17/04/13).]

    g) estabelecimento de especificações técnicas idênticas às ofertadas por determinado fabricante, com a exclusão de todas as outras marcas do bem pretendido, sem qualquer justificativa consistente
    Concluiu-se pela violação ao disposto no artigo 15, § 7º, inciso I, da Lei de Licitações, por tratar-se de situação que equivale à indicação de marca, o que é vedado.33 [33. Acórdão n.º 1.861/2012-Primeira Câmara, TC 029.022/2009-0, rel. Min. José Múcio Monteiro, 10.4.2012.]

    Nesse contexto, deliberou a primeira Câmara do TCU que “para aquisição de equipamentos, havendo no mercado diversos modelos que atendam completamente às necessidades da Administração, deve o órgão licitante identificar um conjunto representativo desses modelos antes de elaborar as especificações técnicas e a cotação de preços, de modo a evitar o direcionamento do certame para marca ou modelo específicos e a caracterizar a realização de ampla pesquisa de mercado”.
    (Acórdão 2383/2014 Plenário, TC 022.991/2013-1, relator Ministro José Múcio Monteiro, 10.9.2014).

    Invoca-se, em casos tais, o artigo 7º, inciso I, § 5º, da Lei nº 8.666/93, que estabelece que “é vedada a realização de licitação cujo objeto inclua bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas, salvo nos casos em que for tecnicamente justificável, ou ainda quando o fornecimento de tais materiais e serviços for feito sob o regime de administração contratada, previsto e discriminado no ato convocatório”. Outrossim, o artigo 15, § 7º, inciso I, que estabelece que deve haver a especificação completa do bem a ser adquirido,sem indicação de marca”.

    h) lacunas no edital
    O ato convocatório não poderá conter lacunas, o que impedirá a manipulação do certame em detrimento do interesse público. A omissão ou obscuridade do edital frustra o princípio do livre acesso dos interessados eis que a ausência de informações atinentes à finalidade da licitação, ao seu objeto, impede a oferta de propostas adequadas e inviabiliza a avaliação dos critérios de julgamento.

    i) exigência de índice de liquidez
    A exigência de índice de liquidez fora dos padrões geralmente aceitos para licitações, em que o objeto do certame se aperfeiçoa com a entrega do bem, é outro exemplo de exigência descabida. A propósito, a exigência de índice de liquidez e endividamento deve ser reservada a certames que envolvam altos custos ou que dependam de incursos de porte no mercado financeiro. Ainda assim, devem ser justificadas, motivadas tecnicamente, sob pena de afastarem interessados que reuniriam condições de atenderem às necessidades da Administração. O mesmo diga-se quanto à exigência de capital social, patrimônio líquido e garantias de participação e de contratação desproporcionais ao valor da licitação.

    j) exigência de laudos ou certificados não previstos na legislação aplicável, com a constatação posterior de serem de domínio dos vencedores do certame apenas, ou a exigência de prova de idênticos quantitativos já executados em obras e serviços já realizados pelo licitante, são práticas reprováveis.

    k) exigência de experiência mínima na aplicação de determinado quantitativo, de determinado revestimento que poucos fornecedores são capazes de fornecer (TCE/SP, Pleno, EPE 401/989/12-4 - Acórdão - Relatório e voto, Rel. Cons. Robson Marinho, j. 30.05.2012, v.u.), sem que tenha havido a demonstração técnica do tipo pretendido, igualmente configura cláusula restritiva.

    l) adoção dos tipos de licitação “técnica e preço” ou “melhor técnica”, com o estabelecimento de requisitos para avaliação, sem qualquer razoabilidade.

    m) prazos de entrega demasiadamente exíguos, criando a possibilidade de vantagem a licitante interessado que, por qualquer razão tenha tido conhecimento ou acesso antecipado a informações, não podem ser aceitos.

    Depreende-se, pois, que inúmeras podem ser as formas de fraude no ato convocatório, o que será identificado a partir do caso concreto.

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    2. FRAUDE NO CURSO DO CERTAME

    2.1. Vínculo subjetivo entre os participantes

    Além de selecionar a proposta mais vantajosa, a licitação visa assegurar a concreção do princípio da isonomia. A existência de vínculo subjetivo entre os concorrentes, em detrimento dos princípios da isonomia e competitividade, constitui uma das frequentes fraudes verificadas no curso do certame. Tal se verifica nas hipóteses em que as pessoas jurídicas participantes da licitação possuem um controlador comum, que exerce a gerência ou assume a responsabilidade técnica de todas. Esse artifício propicia a apresentação de diferentes propostas por uma pessoa, violando o sigilo e comprometendo a competitividade e igualdade entre os demais licitantes, os quais concorrerão com uma única proposta.

    Em casos tais, constatado o engodo, a nulidade do contrato será a solução que se impõe, além da aplicação das demais sanções previstas na Lei de Improbidade e na Lei de Licitações, ainda que tenha vencido a melhor proposta, posto que evidenciado o desrespeito ao princípio da isonomia.

    Questão a ser analisada é a possibilidade de participação de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico. Inicialmente importa observar que inexiste vedação legal à participação de empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico em procedimento licitatório. O que há nessa seara é a vedação da participação de empresas consorciadas (art. 33, Lei n° 8.666/93), que não se confundem com empresas de um mesmo grupo econômico. Assim, não podem ser impedidas de participar individualmente em licitação empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico, quando presentes elementos comprobatórios de sua plena qualificação pessoal (personalidade jurídica, capacidade técnica e idoneidade financeira próprias), ausente prova de fraude ou conluio para frustrar o caráter competitivo do certame.

    O que deve ser observado é como atua cada uma das empresas, ou seja, se cada uma tem, ou não, existência real e vida independente, não se podendo presumir a ocorrência de fraude apenas por força da coincidência da titularidade do controle societário. Portanto, em se tratando de empresas reais e diversas entre si, com funcionamento autônomo, não há falar em violação aos princípios norteadores dos procedimentos licitatórios, a menos que se constate que participam do certame apenas para conferir ares de legalidade, quando na realidade já se sabe previamente qual o vencedor, em verdadeiro jogo de cartas marcadas.
    Frise-se: é vedada a apresentação de duas propostas pela mesma empresa, mas nada impede que empresas distintas, embora vinculadas a um mesmo grupo econômico, apresentem diferentes propostas, ausente o conluio entre os participantes para fraudar o procedimento.

    Se é certo que a existência de licitantes com sócio em comum, por si só, não configura fraude, inconteste é que em determinadas circunstâncias mostra-se patente o risco à competitividade. A propósito, no Acórdão nº 297/2009 – Plenário, o TCU estabeleceu objetivamente que ofende a competitividade a participação de licitantes com sócios comuns quando se tratar de: convite; contratação por dispensa de licitação; existência de relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; e contratação de uma das empresas para fiscalizar serviço prestado por outra.

    Hipótese de fraude também se apresenta no caso em que empresas coligadas (mesmo grupo econômico ou jurídico), sendo apenas uma delas microempresa, invocam o benefício legal conferido pela Lei Complementar 147/2014. Já se decidiu que a participação simultânea de empresas coligadas em licitação afronta a legislação quando evidenciado que a empresa de maior porte – não enquadrada como microempresa ou de pequeno porte – busca usufruir indiretamente os benefícios da Lei, por meio da sociedade de pequeno porte (Acórdão 2978/2013 - Plenário, TC 036.959/2011-1, relator Ministro Benjamin Zymler, 6.11.2013).
    Vale destacar, ainda, que, havendo indícios de que a forma de constituição das empresas criou a possibilidade, em tese, de burlar a competitividade das licitações, numa espécie de manobra jurídica, porquanto participam dos certames de forma alternada, não soa desarrazoada ou ilegal a desconsideração da personalidade jurídica operada na via administrativa, estendendo-se a proibição à empresa integrante do mesmo grupo econômico.

    Nesses casos aplica-se o que a doutrina e a jurisprudência têm chamado de teoria da desconsideração expansiva da personalidade jurídica, que autoriza a extensão dos efeitos de punições a outras empresas. O entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que considerou que a constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar a aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações, de modo a possibilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à nova sociedade constituída. Nesse contexto, entendeu-se que a Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular (RMS n. 15166/BA, rel. Min. Castro Meira, j. 7-8-2003).

    Ademais, a “... aplicação da proibição de contratar com a administração pública não teria efeito prático algum se fosse permitido que os sócios burlassem a lei, mediante a constituição ou utilização de outra sociedade, com o mesmo objeto comercial, para, assim, continuarem a participar das licitações” (TRF5 - Apelação Cível n. 549737/AL, rel. Des. Francisco Barros Dias, Data da Publicação DJE 13-12-2012).

    Havendo, portanto, indícios de violação aos princípios da moralidade, impessoalidade e competitividade dos certames licitatórios, afigura-se plenamente possível a desconsideração da personalidade jurídica para estender os efeitos da sanção administrativa a outra empresa integrante do grupo econômico, a qual possui os mesmos sócios, corpo diretivo e endereço (MS n. 2013.055573-2, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 9-4-2014).

    Vale observar, ainda, que a constatação de que determinada pessoa jurídica foi constituída para fins ilícitos, pode acarretar sua dis­solução, nos termos do artigo 1218, inciso VII, do Código de Processo Civil e 19, inciso III, da Lei nº 12.846/2013.

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    2.2. Efetiva publicidade do certame

    Outra prática recorrente de fraude no curso do certame é a ausência de publicidade.

    Em matéria de licitação o principio da publicidade tem ampla aplicação. Basta conferir o § 3º do artigo 3º da Lei 8.666/93, que estabelece que a licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.

    A falta de ampla divulgação dos editais, ainda que por meio de avisos contendo informações fundamentais, dificulta a ampliação do número dos concorrentes e vicia de nulidade o procedimento licitatório.

    Acerca da publicidade, estabelece o artigo 21 da Lei de Licitações que:

    “Art. 21. Os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e dos leilões, embora realizados no local da repartição interessada, deverão ser publicados com antecedência, no mínimo, por uma vez:

    I - no Diário Oficial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras financiadas parcial ou totalmente com recursos federais ou garantidas por instituições federais;

    II - no Diário Oficial do Estado, ou do Distrito Federal quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Estadual ou Municipal, ou do Distrito Federal;

    III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço, fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração, conforme o vulto da licitação, utilizar-se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição.

    § 1º. O aviso publicado conterá a indicação do local em que os interessados poderão ler e obter o texto integral do edital e todas as informações sobre a licitação.

    (...)

    § 4º. Qualquer modificação no edital exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, exceto quando, inquestionavelmente, a alteração não afetar a formulação das propostas.”
    Vigora o entendimento no sentido de que a publicação em jornal diário de grande circulação implica na publicação na região geográfica abrangida pela execução da futura avença.

    A ausência de publicação em jornal de grande circulação local frustra a competição, violando os princípios da legalidade e transparência. Nesse sentido, vale conferir acórdão da 8ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, de 14 de maio de 2014, nos autos da Apelação nº 0001499-65.2003.8.26.0082, da Comarca de Boituva, Rel. Rubens Rihl, que confirmando a manutenção do decisum por seus próprios fundamentos, destacou:

    “O Procedimento Licitatório n.º 01/2001 – Tomada de Preços, é eivado de vícios, eis que não observou as regras previstas na Lei de Licitações. Além disso, violou os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, bem como violou o princípio da vinculação ao instrumento convocatório. O artigo 21 da Lei 8.666/93 dispõe que no caso de licitação na modalidade tomada de preços, deve ser publicado o resumo do edital do certame no Diário Oficial do Estado e, concomitantemente, em jornal de grande circulação no Estado. Também é necessário, se houver, publicação em jornal de circulação no Município ou na região, onde será realizada a obra ou serviço, facultados, ainda, outros meios de divulgação para ampliar a área de competição. No caso em apreço, só foi observada a publicação do edital da tomada de preços nº 001/2001 na Imprensa Oficial, sendo cristalina a violação ao princípio da publicidade. Verifica-se dos autos que o objeto do certame era a compra de combustível para diversos veículos municipais e gás liquefeito, sendo que a única candidata da licitação foi a empresa ré. Com a não publicação do edital em jornal de grande circulação local, inviabilizou-se a exigida competição entre interessados cadastrados ou passíveis de cadastro”
    (Apelação nº 0001499-65.2003.8.26.0082 – Boituva).

    Destaque-se que a existência de sítio oficial do órgão administrativo na internet acarreta a obrigatoriedade da sua utilização para divulgação das licitações.

    A propósito, a Lei de Acesso à Informação, em seu artigo 6º, inciso I, estabelece que cabe aos órgãos e entidades do poder público assegurar a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação. Além disso, o artigo 7º, inciso VI, assegura o direito de obtenção de informações relativas a licitações e contratos.

    Quanto aos prazos mínimos, estabelece o artigo 21 da Lei de Licitações, em seus §§ 2º e 3º, que:

    § 2º. O prazo mínimo até o recebimento das propostas ou da realização do evento será:

    I – quarenta e cinco dias para:

    a) concurso;

    b) concorrência, quando o contrato a ser celebrado contemplar o regime de empreitada integral ou quando a licitação for do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”;

    II – trinta dias para:

    a) concorrência, nos casos não especificados na alínea “b” do inciso anterior;

    b) tomada de preços, quando a licitação for do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”;
    III – quinze dias para a tomada de preços, nos casos não especificados na alínea “b” do inciso anterior, ou leilão;
    IV - cinco dias úteis para convite.

    § 3º. Os prazos estabelecidos no parágrafo anterior serão contados a partir da última publicação do edital resumido ou da expedição do convite, ou ainda da efetiva disponibilidade do edital ou do convite e respectivos anexos, prevalecendo a data que ocorrer mais tarde”.

    Nos autos da Apelação nº. 0010244-81.2008.8.26.0624, da Comarca de Tatuí, a 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, em que foi Relatora a Desembargadora Ana Liarte, reconheceu-se a prática de ato de improbidade administrativa em virtude da publicidade deficitária por ocasião da realização de concurso público.

    Argumentou-se que “a publicidade realizada foi meramente formal (publicação em jornal e no Diário Oficial), pois o prazo exíguo causou grande deficiência de publicidade do concurso público, comprometendo a efetiva competitividade do certame e propiciando que os aprovados fossem pessoas que já ocupavam cargos em comissão na Câmara Municipal. Com efeito, entre a publicação do Edital e o início do prazo para as inscrições transcorreu o lapso temporal de sete dias úteis, obstando a inscrição de possíveis interessados”.
    Pontuou-se que entre a fixação do Edital na sede da Câmara, e a realização da prova escrita, transcorreu apenas 30 dias, e não 45, como prevê a Lei de Licitação”.

    No mesmo sentido: Apelação cível nº 1.0342.08.111431-2/001 - MG

    Vale acrescentar que se o objeto for complexo, se as condições da participação forem rigorosas ou se a execução do futuro contrato demandar investimentos relevantes, a Administração Pública deverá propiciar aos interessados prazo compatível com o cumprimento das exigências indispensáveis à participação no certame. Em casos tais a Administração Pública estará obrigada a adotar prazos superiores aos previstos na Lei.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Jurisprudência:

    Apelação nº 0002614-53.2007.8.26.0415 – Palmital – Fraude no procedimento licitatório – Direcionamento da licitação – Modalidade convite – Inserção injustificada de exigências no edital de abertura – Restrição drástica das possibilidades de competição.

    Apelação cível nº 1.0398.06.000270-4/001 - Minas Gerais - Licitação - Indícios de favorecimento indevido - Conduta ímproba configurada.

    Mandado de segurança nº 2013.053581-9 - Santa Catarina - Licitação - Pregão presencial - Desclassificação motivada pela extensão dos efeitos de punição aplicada à empresa do mesmo grupo econômico - Suspensão do direito de licitar.

    Apelação cível nº 0009265-85.2009.8.26.0624 - Tatuí - Procedimento licitatório fraudulento - Irregularidade da contratação e da aquisição de veículo escolar para transporte municipal - Empresas licitantes que pertenciam aos mesmos sócios - Direcionamento do certame - Inexistência de competição e de sigilo nas propostas.

    Apelação nº 0001966-74.2011.8.26.0434 - Pedregulho - Ação proposta visando à responsabilização do Vice-Prefeito e de seu irmão por terem vencido algumas licitações das quais participaram indevidamente por meio de empresa “laranja”, na vigência de condenação que os impediu de contratar com a Administração Pública.

    Apelação nº 0022483-50.2009.8.26.0053 - São Paulo - Licitação - Registro de preços - Pregão eletrônico - Licitantes - Empresa de um mesmo grupo econômico.

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    CAPÍTULO 06

    CARTÉIS EM LICITAÇÕES

    Os cartéis são altamente prejudiciais à concorrência, pois geram dois efeitos rápidos ao consumidor: o aumento de preço e a redução da oferta36. Assim, “quanto maior a duração do cartel, maiores os danos aos consumidores” 37. Decorre ainda de sua atuação o monopólio num dado mercado relevante às empresas cartelizadas, de forma que o consumidor deixa de experimentar inovações ou evoluções no mesmo segmento. [36. MARTINEZ, Ana Paula, Repressão a cartéis. Interface entre Direito Administrativo e Direito Penal, São Paulo: Singular, 2013, p. 25.] [37. GABAN, Eduardo Molan, Juliana Oliveira Domingues, Direito Antitruste, São Paulo: Saraiva, 2012, p. 162. Em nossas investigações criminais já nos deparamos com cartéis que duraram dez anos, como o cartel de compressores herméticos de refrigeração, utilizados em geladeiras, bebedouros, congeladores e ar-condicionados.]

    O Direito Penal consagra tal conduta como ilícito penal, mas também há o ilícito administrativo (Lei n° 12.529/11), o que tem refletido numa saudável e eficiente apuração conjunta dos fatos entre o Ministério Público (MP) e o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Da mesma forma, a conduta pode configurar ato de improbidade administrativa, caso as empresas do cartel atuem em conluio, induzam ou concorram com algum agente público, ou mesmo se beneficiem direta ou indiretamente, de uma fraude à licitação (art. 3º da Lei nº 8.429/92).

    O sujeito ativo do crime, portanto, estará sujeito a diversas punições: multas pecuniárias, no âmbito administrativo, impostas pelo CADE; e eventuais penas de reclusão, no âmbito judicial, impostas pelo Judiciário38. [38. Mas não é só, porque poderá ainda ser interposta Ação Civil para reparação dos danos suportados pelos consumidores.]

    Tais regras punitivas encontram apoio em princípios constitucionais, pois a Constituição Federal (CF), em seu artigo 173, § 3°, estabeleceu que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Portanto, o Direito Penal e o Direito Administrativo sancionador são instrumentos de garantia do preceito constitucional.

    Pois bem. Pode-se conceituar o cartel como o acordo horizontal entre empresas independentes, que atuam num mesmo mercado relevante, para a adoção de decisões sobre políticas comuns quanto a um determinado aspecto de suas atividades. Assim, as empresas cartelizadas resguardam a sua autonomia e apenas se submetem aos termos do acordo no seu particular âmbito de aplicação.

    Os cartéis visam sempre à maximização do lucro e, para tanto, não medem esforços operacionais. Valem-se de todo o aparato tecnológico para se manter na clandestinidade e, se preciso, recorrem ao emprego da corrupção. Não raro, atuam com a mesma ousadia e periculosidade de integrantes de organizações criminosas em seu sentido estrito39, pois ameaçam os integrantes do cartel que descumprem os ajustes ilícitos. [39. Marcelo Mendroni faz um interessante paralelo entre os cartéis e as organizações criminosas: A lógica acusatória nos crimes de cartel, em A nova Lei do CADE: o 1º ano na visão das autoridades, org. FARINA, Laércio, Ribeirão Preto: Migalhas, 2013, p. 93.]

    Por tais motivos, a OCDE - Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico - concluiu: “cartéis causam danos a consumidores, por meio do aumento de preço ou da restrição da oferta, (...) o que possibilita, sem que saibam, a transferência de riquezas aos membros do cartel. Além disso, os cartéis geram desperdício e ineficiência. Eles protegem seus membros da exposição às forças de mercado, reduzindo a pressão pelo controle de gastos e para inovação, o que acarreta na perda de competitividade da economia nacional”.

    Caracterizam-se, pois, os cartéis como fenômenos perniciosos, porque visam eliminar a concorrência para prevalecer o monopólio estabelecido pela associação de empresários.

    A Lei n° 12.529/11, em seu artigo 36, § 3o, define as seguintes condutas, além de outras, como infrações à ordem econômica: 

    “I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma: 

    a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente; 

    b) a produção ou a comercialização de uma quantidade restrita ou limitada de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita ou limitada de serviços; 

    c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou potencial de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição de clientes, fornecedores, regiões ou períodos; 

    d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública;”

    Pode-se dizer, portanto, que as condutas de “fixar ou praticar, em acordo com concorrente, sob qualquer forma, preços e condições de venda de bens e prestação de serviços” caracterizam a prática do cartel. Com as palavras de Ana Paula Martinez, constituem os cartéis os “acordos, ajustes ou mesmo troca de informações sobre variáveis comercialmente sensíveis entre concorrentes com o objetivo de alterar artificialmente as condições de mercado com relação a bens ou serviços, restringindo ou eliminando a concorrência” 40. [40. Repressão a cartéis, ob. cit., p. 36-37.]

    Contudo, o simples fato de representantes de empresas de um mesmo segmento comercial estarem reunidos, seja por meio de uma Associação de Classe, Sindicato, ou por outro pretexto, não caracteriza o crime contra a ordem econômica. É “imperioso observar se o contexto que reveste a conduta investigada propicia-lhe ou não relevância sob o ponto de vista antitruste, vale dizer, se estão presentes poder de mercado, barreiras à entrada, enfim, elementos que viabilizem que o poder de mercado exista e que seu exercício seja possível e incontestável”. 41 [41. GABAN, Eduardo Molan, Direito Antitruste, ob. cit., p. 163.]

    Se o acordo ou ajuste não restringe a livre concorrência, não há que se falar em cartel42. Afinal, o crime visa ofender a ordem econômica. [42. Ibidem. Esta questão foi simplificada por nós para atingir o objetivo desse texto. É que o CADE, por vezes, já entendeu que a simples ocorrência do acordo entre concorrentes já seria o bastante para caracterizar o ilícito penal.]

    Ainda as condutas de “abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo entre empresas” (art. 4º, inc. I, da Lei nº 8.137/90), exigem a demonstração do domínio do mercado ou, ao menos, a eliminação parcial da concorrência, no que o MP poderá ser auxiliado pelo CADE, PROCON, CGU, FIPE, dentre outros órgãos e entidades parceiras.

    Não basta, ademais, o simples paralelismo de preço para a caracterização do cartel e, tampouco, é possível supor a ocorrência de um ajuste entre os empresários, como já decidiu o TJRS:

    “Quanto ao delito contra a ordem econômica, objeto da denúncia, para sua caracterização não basta simplesmente a prática de preços similares ou o chamado alinhamento de preços, mas sim que esse alinhamento ou similaridade de preços decorra de efetivo ajuste entre os comerciantes, de modo a fixar artificialmente os preços, eliminando assim a concorrência entre eles, o que sabidamente é nocivo aos consumidores em geral”

    (TJRS, Apelação n. 70017858093, 4ª Cam., Rel. Des. Constantino Lisboa de Azevedo, DJ 12.4.2007).

    No que concerne aos acordos ou ajustes restritivos à livre concorrência, a doutrina, aqui sem polêmica, os classifica em horizontais e verticais. Os acordos horizontais são estabelecidos por representantes de empresas que estão no mesmo nível da cadeia econômica ou industrial e atuam em mesmo mercado relevante, numa relação de direta concorrência. A sua vez, nos acordos verticais os representantes das empresas estão em atividades e mercados relevantes diversos, numa cadeia econômica também diferente.
    Dentre os acordos horizontais ressaltam-se aqueles já ocorridos entre representantes de autoescolas; postos de combustíveis; empresas de cargas aéreas; caminhões do tipo cegonha; vigilância privada de segurança; indústria de vela de ignição para carros, fornecedores de merendas às escolas públicas; fornecedores de uniforme e material escolar, dentre outros tantos. E nos verticais, os ajustes celebrados entre revendedores de botijões de gás e os distribuidores; revendedores de combustíveis, postos de combustíveis e os seus distribuidores.

    A doutrina classifica, ainda, os cartéis em difusos (soft) e clássicos (hard-core).

    A OCDE define os clássicos – os mais comuns – como sendo um acordo, explícito ou tácito, anticompetitivo e concentrado, entre concorrentes para fixar preços, fraudar licitações, estabelecer restrições na oferta ou quotas, ou ainda dividir mercados por meio de alocação de clientes, fornecedores, área geográfica ou linhas de comércio.

    Na oportunidade do julgamento do Cartel das Britas, o CADE definiu os cartéis clássicos da seguinte forma:

    “Acordos secretos entre competidores, com alguma forma de institucionalidade, com o objetivo de fixar preços e condições de venda, dividir consumidores, definir nível de produção ou impedir a entrada de novas empresas no mercado. [...] Este tipo de cartel opera através de um mecanismo de coordenação institucionalizado, podendo ser reuniões periódicas, manuais de operação, princípios de comportamento etc. Isto é, sua ação não decorre de uma situação eventual de coordenação, mas da construção de mecanismos permanentes para alcançar seus objetivos” 43. [43. Seguimos o estudo de MARTINEZ, Ana Paulo, Repressão a Carteis, ob. cit., p. 42-43. Ainda, sobre o Cartel de Pedra Britada vide: GABAN, Eduardo Molan, Juliana Oliveira Domingues, Direito Antitruste, ob. cit., pp. 313/319.]

    A sua vez, os cartéis hard-core – ou difusos – caracterizam-se pelo ajuste eventual entre empresas, numa simples troca de informações sensíveis entre os seus representantes. Embora tenha o mesmo objetivo do cartel clássico, os cartéis difusos não são institucionalizados, pois surgem numa eventualidade. Por exemplo, em razão de uma doença generalizada no gado em determinada região do Brasil, alguns Frigoríficos decidem se reunir para aumentar e fixar preços, além de dividir o mercado, numa clara manifestação de um novo cartel.

    Os cartéis podem ainda ser classificados tendo como critério seu objeto:

    - cartéis que visam à fixação de preços;

    - a divisão de mercados;

    - e fraudar licitações públicas.

    Considerando a importância da atuação dos cartéis em licitações públicas – prescindindo-se das licitações privadas, nas quais os cartéis também atuam –, pois coincidente com a missão primordial e prioritária do MP o combate à corrupção, algumas considerações sobre esse tipo de ilícito devem acontecer.

    Estima-se que normalmente o cartel em licitação pública eleve os preços em 20%, em claro prejuízo ao erário público e ao consumidor em geral, para além da perda da qualidade e, muitas vezes, da quantidade do produto ou prestação do serviço.
    No âmbito da atuação dos cartéis em licitações públicas verificamos – assim como toda a (escassa) doutrina – que os seus integrantes organizam-se em loteamentos para atender mercados regionalizados, ou não. Vamos exemplificar com as licitações para o fornecimento de refeições a órgãos públicos: diversas empresas reúnem-se periodicamente dentro de restaurantes de aeroportos – o exemplo é retirado de casos concretos – e loteiam as diferentes licitações: as empresas A, B e C irão ganhar os contratos para fornecer alimentação em Presídios; já as empresas D, E e F irão ganhar as licitações para fornecer merendas em escolas públicas; outras empresas assumem o fornecimento de alimento num determinado Tribunal de Contas; e assim por diante.

    Para que o cartel tenha efetividade, dentro do marco do plano global e nacional, as empresas A, B e C – assim como as demais – deverão se organizar para que os diferentes certames públicos sejam divididos de forma equilibrada. Assim, na licitação para fornecer alimentação num Presídio, todas participam, mas apenas a empresa A propõe o preço mais vantajoso ao erário público e vence. Para outro Presídio, grosso modo, todas estão novamente participando e habilitadas, mas a vencedora desta vez é a empresa B; e assim por diante. Há, pois, um claro e manifesto rodízio entre os integrantes do cartel.

    A visualização do loteamento ou do rodízio demanda uma investigação cautelosa e que não se restrinja a uma única licitação pública. Exige-se o conhecimento amplo de vários certames, em localidades diversas, sem desprezar o aprofundamento, por exemplo, de uma proposta elaborada por uma empresa que não tem condições econômicas ou estruturais para cumprir o futuro contrato. É que para que o rodízio das empresas cartelizadas não seja notado com facilidade, surgem no certame empresas com propostas de cobertura, apenas para que uma outra pessoa jurídica, eleita pelo cartel, consagre-se vencedora.

    Ana Paula Martinez cita situações concretas vistas em diferentes investigações e anota que a proposta de cobertura, ou pró-forma, “o membro do cartel apresenta proposta que, contudo, contém erros que provocam a desqualificação do agente econômico do certame – o agente deixa de apresentar documentos obrigatórios exigidos no edital, por exemplo (o efeito é o mesmo causado pelo mecanismo de supressão de propostas, em que um determinado membro do cartel deixa de apresentar lance que, ausente o acordo, teria submetido ao agente público)” 44. [44. Repressão a cartéis, ob. cit., p. 48.]

    Para além do rodízio e do loteamento, outra manobra utilizada pelo cartel em licitação pública é a subcontratação, através da qual o perdedor do certame tem a garantia de que será recompensado por ser o fornecedor àquela empresa, também cartelizada, que venceu a licitação.

    Podem-se sistematizar como sinais de alertas da atuação de um cartel em licitação pública, as seguintes situações:

    a) Desistência inesperada por parte de uma das empresas em perfeitas condições de vencer o certame: nesta hipótese, a desistência é fruto do acordo no seio do cartel e é importante verificar se, na mesma época, essa mesma empresa venceu outra licitação em outra cidade, ou na mesma; ou se tal empresa que desistiu recebeu valores como contrapartida pela desistência;

    b) Ausência de proposta: embora qualificada e em condição de vencer o certame, a empresa deixa de apresentar proposta para uma determinada licitação, isto é, abre mão de sua participação em prol da outra integrante do cartel;

    c) Diferenças entre as propostas com manifesta desproporcionalidade: nota-se valores contidos em propostas que não se explicam racionalmente, à vista de sua margem elevada num nítido propósito de não vencer a disputa;

    d) Diferenças mínimas, em valores na casa dos decimais, nas propostas, notadamente nos Pregões eletrônicos45: os representantes das empresas disputam o Pregão eletrônico e, não raro, estão reunidos numa sala de reunião num hotel de luxo pouco distante da sede do órgão público; [45. Compartilhamos aqui a experiência de MARTINEZ, Ana Paula, Repressão a Cartéis, ob. cit., p. 49.]

    e) Erros ou rasuras na redação das propostas: evidenciam terem sido apresentadas pelo mesmo grupo econômico, ou por empresas que integram o cartel; foi o que se observou na investigação do cartel da merenda escolar: empresas cartelizadas cometeram o mesmo erro ao escreverem “prospostas”, o que não escapou do Relatório dos Analistas do CAEX/MPSP;

    f) Empresa que nunca vencem certame; já se apurou, durante investigações, que algumas empresas são utilizadas para conferir cobertura às demais integrantes do cartel; embora participem de licitações públicas, os contratos firmados são ínfimos e irrelevantes, porque são utilizadas dentro do plano ilícito da associação criminosa do cartel; nessa situação, muito provável que seus sócios estejam, de alguma forma, auferindo vantagens financeiras e a demonstração de tal fato concreto será o desafio da investigação; já houve caso, ainda, em que os representantes da empresa, aquela que nunca ganha, ter seu cartão de crédito pessoal pago por um concorrente, integrante do cartel.

    g) As conversas mantidas entre os representantes de empresas num Pregão Presencial: Também já foi providenciado o envio de funcionários do MP para acompanhar um Pregão Presencial e observou-se que os representantes das empresas, que já eram investigados, conversavam sem qualquer disfarce.

    De outro lado, quando se depara com a atuação de um cartel numa licitação, é certa a ocorrência de ofensa a dois bens jurídicos autônomos: primeiro, a ordem econômica (crimes de cartéis); segundo, a administração pública (fraude em licitação pública). À toda evidência, existem duas condutas criminosas distintas, que se verificam em momentos diferentes e, daí, exigem duas imputações em concurso material de delitos.

    Este tema é importante, porque os Defensores sempre se insurgem com essa tese. Mas, sem razão.

    Marcelo Mendroni46 analisou com perfeição o assunto e concluiu: “De um lado, em um momento, mediante uma ação, os acusados formam acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes visando a ‘ofensa à ordem econômica’, fixando preços de forma artificial, controlando o mercado e a concorrência. De outro lado, os acusados praticam crime especificamente contra a administração pública, (efetivamente) frustrando ou fraudando concorrência pública”. [46. A nova Lei do CADE: o 1º ano na visão das autoridades, FARINA, Laércio, Ribeirão Preto: Migalhas, 2013, p. 101. No mesmo sentido, o entendimento de Eduardo MolanGaban e Juliana Oliveira Domingues (Direito Antitruste, ob. cit., p. 162): “É importante destacar que essa modalidade de cartel, além de poder estar acobertada pela hipótese de crime previsto na Lei n° 8.137/90, também pode configurar crime com base na Lei de Licitações (Lei n° 8.666/93), restando o sujeito ativo de tal ilícito passível das sanções de todos os diplomas legais aplicáveis”.]

    Assim, o cartel, como crime formal que é, consuma-se antes do crime de fraude à licitação pública. É o que ocorre também com o crime de associação criminosa, cuja tutela jurídica é a paz pública, e os delitos em concreto cometidos por ela.
    O crime de cartel é, pois, mais abrangente do que o de fraude à licitação. O primeiro acarreta o domínio amplo do mercado, abrangendo toda a comunidade exposta à prática anticompetitiva. O segundo frauda a concorrência no âmbito de licitação específica, lesando apenas seus participantes e o ente público que a promove.

    Lado outro, o delito de fraude à licitação também não está inserido na linha de desdobramento causal do cartel. O acordo anticompetitivo pode se envolver apenas no domínio do mercado privado, tipificando, tão somente, o delito contra a ordem econômica. Como também pode exercer o domínio do mercado explorado pela Administração Pública, fraudando múltiplas licitações e contratos administrativos, hipótese em que serão tipificados os crimes de cartel e fraude à licitação em concurso material.
    Assim, a prática do crime de cartel não pressupõe a fraude às licitações públicas. Assim como o delito de fraude à licitação pública não impõe que seja praticado por agentes cartelarizados. Logo, o cartel pode, perfeitamente, atuar em uma licitação pública sem a necessidade de fraudá-la. Inapelável concluir, pois, que os crimes são autônomos e possuem definições típicas diferentes, podem, perfeitamente, serem praticados em concurso material.

    Afora o citado concurso de crimes, a mesma conduta ilícita também pode configurar ato de improbidade administrativa, nos termos da Lei nº 8.429/92, desde que as empresas cartelizadas atuem em conluio, induzam ou concorram com algum agente público, ou mesmo se beneficiem direta ou indiretamente, numa fraude à licitação, por força do disposto no art. 3º da Lei nº 8.429/92.
    Com efeito, a fraude a licitação configura ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário e que atenta contra os princípios da Administração Pública, podendo ainda importar em enriquecimento ilícito.

    Resta a abordagem sobre a investigação.

    A investigação sobre a atuação do cartel não é fácil, porque os agentes normalmente não deixam rastros dos acordos ou ajustes celebrados sempre na clandestinidade. Ainda, em 2008, ano de criação do GEDEC – Grupo de Atuação Especial de Repressão aos Delitos Econômicos, encontravam-se em buscas e apreensões atas ou rascunhos de reuniões de tais acordos ilícitos. Hoje dificilmente tal prova é encontrada.

    Não obstante a dificuldade, a investigação do Ministério Público burocrática, cautelosa e ampla, invariavelmente é exitosa. Como já se pontuou acima, a atuação do cartel em licitação pública reclama o conhecimento do manejo das empresas em certames diversos dentro do mesmo tipo de mercado relevante.

    São sugeridas como pesquisas e consultas iniciais da investigação:

    Sem prejuízo das demais, a consulta aos dados do Tribunal de Contas afigura-se como relevante. Ao analisar procedimentos licitatórios, esse Tribunal administrativo costuma apontar cláusulas restritivas, que são coincidentes com a investigação civil e criminal. Na grande maioria das vezes, a licitação versa sobre tema específico e técnico, sendo fundamental o estudo dos julgados do Tribunal de Contas para entender eventuais falhas em editais e cláusulas que restringem a concorrência, muitas vezes inseridas por influência do cartel.

    As informações obtidas por tais pesquisas permitirão desenhar um mapa com os certames, nos quais as empresas alvos participaram. Por exemplo, pode-se verificar que uma determinada empresa “A”, alvo, participa de licitações, distantes de sua sede, mas nunca vence. E, ao contrário, aqueles certames mais próximos de sua localização são vencidos por ela. O mesmo ocorre com a empresa “B”, que vence as licitações disputadas em outra região e perde naqueles certames vencidos pela empresa “A”. E também com a empresa, “C”, “D”, etc., numa evidência do rodízio entre elas.

    Já foi elaborado um levantamento, em rede aberta, das licitações vencidas pelas empresas que fornecem merenda às escolas públicas municipais na Capital de São Paulo, Grande São Paulo, Região de Sorocaba e Região Metropolitana de Campinas. Esse levantamento permitiu concluir pela divisão de mercado realizado pelas empresas integrantes do cartel. Transcrevem-se aqui os mapas e os gráficos, que fizeram parte do corpo da denúncia:

     

    Região de Sorocaba

    Figura 1

     

     

     

    Região Metropolitana de Campinas

    Figura 2

     

     

     

    Grande São Paulo:                                                Estado de São Paulo:

    Figura 3

     

    Todas essas pesquisas são realizadas no início da investigação criminal, que reclama o uso de outros meios de provas, os mesmos, aliás, utilizados para se apurar os crimes cometidos por organizações criminosas, tais como:

    a) interceptação telefônica;

    b) interceptação telemática (os e-mails são fundamentais nesses casos, pois o empresário prefere escrever a falar no telefone);

    c) interceptação ambiental (se houver o efeito surpresa, a interceptação ambiental certamente será proveitosa);

    d) a busca e apreensão (pen drives, computadores pessoais, e-mails abertos ou impressos, agendas, apontamentos de reuniões, etc);

    e) a colaboração premiada;

    f) os depoimentos e;

    g) finalmente, o instituto da leniência47. [47. Lei n. 12.529/11. Art. 86. O Cade, por intermédio da Superintendência-Geral, poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de 1 (um) a 2/3 (dois terços) da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte: I - a identificação dos demais envolvidos na infração; e II - a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação. § 1o O acordo de que trata o caput deste artigo somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - a empresa seja a primeira a se qualificar com respeito à infração noticiada ou sob investigação; II - a empresa cesse completamente seu envolvimento na infração noticiada ou sob investigação a partir da data de propositura do acordo; III - a Superintendência-Geral não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação da empresa ou pessoa física por ocasião da propositura do acordo; e IV - a empresa confesse sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento. § 2o Com relação às pessoas físicas, elas poderão celebrar acordos de leniência desde que cumpridos os requisitos II, III e IV do § 1º deste artigo.]

    Importante destacar que essas provas poderão ser compartilhadas e aproveitadas, em alguns casos a depender de autorização judicial (como a interceptação, por exemplo), com eventual investigação civil instaurada para apuração da prática de improbidade administrativa.

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    CAPÍTULO 07

    EXECUÇÃO E ALTERAÇÃO CONTRATUAL

    Este Capítulo trata da execução contratual, oportunidade em que inúmeras irregularidades podem acontecer e ganhar contornos de improbidade administrativa.

    Inicialmente, calha observar que a regra é a de que o contrato celebrado pela Administração deve ser cumprido tal como celebrado (art. 66 da Lei nº 8.666/93), e deve ser celebrado na forma em que licitado (artigo 54, § 1º c.c. art. 55, XI, da Lei nº 8.666/93) ou, se não houver licitação, deve ser cumprido nos termos do ato que autorizou a dispensa ou inexigibilidade (art. 54, § 2º c.c. art. 55, XI, da Lei de Licitações).

    A exceção é a alteração dos contratos, quando autorizada por lei (art. 65 da Lei de Licitações).

    Lembre-se, também, que, nos termos do artigo 60 da Lei de Licitações, é proibido o contrato verbal, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite do convite para compras e serviços não considerados como de engenharia (atualmente fixado em R$ 8.000,00 - oito mil reais).

    Lembre-se, ainda, que o instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas aquisições diretas cujos valores estejam compreendidos nestas duas modalidades de licitações (art. 62 da Lei de Licitações).
    Não obstante a possibilidade, em alguns casos, da dispensa de lavratura do instrumento do contrato, o instrumento escolhido deve consignar todos os elementos da avença, não se admitindo, a pretexto da facultatividade mencionada, que seja utilizada forma que não comporte a descrição de todas as obrigações das partes. Caso, por exemplo, a Administração decida utilizar a nota de empenho, nela deve constar a descrição sucinta da prestação, como pactuada.

    Especialmente em alguns Municípios de pequeno porte, tem-se constatado a utilização de nota de empenho em casos em que o instrumento de contrato é facultativo, não obstante não conste, dela, todas as obrigações das partes. Anote-se que o art. 62 faculta a dispensa do instrumento de contrato, em alguns casos, quando a Administração possa substituí-lo por outros instrumentos hábeis, o que não significa autorização para a adoção de forma simplificada, quando esta não se mostre adequada e suficiente para este fim.
    Observada esta ocorrência, parece adequado e suficiente, num primeiro momento, a expedição de recomendação, visando a que a Administração passe a observar a lei.

    Seguem as hipóteses mais comumente verificadas na atividade do Ministério Público.

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    1. Necessidade da contratação

    Um dos casos recorrentes de ações civis é o que se funda na desnecessidade da contratação, vale dizer, a contratação de objeto que não se destina a satisfazer interesse público ou, ainda, a contratação de quantidades excessivas.
    Analisa-se, inicialmente, a questão da necessidade da contratação.

    Neste enfoque, só restará caracterizará improbidade administrativa se o objeto contratado não atender ao interesse público. Como exemplos, citem-se a contratação de buffet para festas cuja realização não atenda às finalidades do Estado, ou a contratação de assessorias para realização de serviços que devem ser realizados por servidores públicos, ou o pagamento de despesas que deveriam estar a cargo de determinado contratado.

    Nestes exemplos – como em outros casos semelhantes - é importante que se demonstre: (a) a celebração do contrato; (b) o valor dispendido e (c) a natureza do serviço ou do produto adquirido e a sua finalidade.

    Em outros casos, a desnecessidade não diz respeito ao objeto licitado – em tese, apto a satisfazer determinada necessidade da Administração – mas sim à quantidade adquirida.

    Neste caso, é importante apurar se a quantidade foi estimada de forma razoável. Nem sempre é possível fixar, de forma objetiva, a necessidade da Administração, mas a estimativa de quantitativos deve ser feita seguindo critérios técnicos (no caso de obras de engenharia) ou por qualquer critério que aproxime, o mais possível, a quantidade contratada (no caso das demais contratações).

    O resultado que possibilita o ajuizamento de ação civil pública é aquele que demonstra que o excesso de quantitativos adquiridos decorreu da falta de qualquer estimativa ou, ainda, de erro inescusável desta.
    Assim, há que se obter: (a) a prova da efetiva aquisição dos quantitativos e (b) o documento que demonstre como foi apurada a quantidade efetivamente adquirida.

    Havendo este documento, o descompasso entre um e outro autorizará, desde logo, a conclusão de ato de improbidade administrativa, especialmente quando o produto contratado for suscetível de perecer (não precisa, necessariamente, ser perecível, bastando que o decurso do prazo para sua utilização acarrete o perecimento).

    No entanto, pode não haver este descompasso, estando o problema na forma incorreta da apuração dos quantitativos, apuração esta feita sem qualquer base em fatos ou previsões razoáveis. Atente-se para o fato de que não é possível, na maioria dos casos, fixar o número exato de quantitativos, uma vez que, dependendo do bem a ser adquirido, há natural variação da necessidade. O que importa é que exista uma apuração da necessidade da Administração e que esta previsão seja razoável.

    Tome-se como exemplo a fixação de quantidade de frutas para a merenda escolar. Há um documento fixando o número de unidades que deve ser adquirido. Este número foi calculado considerando o número de crianças matriculadas no ano anterior acrescido de percentual de aumento de matrículas que ocorreu nos anos anteriores. Ainda que este percentual não se concretize, ficando abaixo, não há como fugir do fato de que houve uma previsão e que esta foi realizada de forma adequada. No entanto, se a Administração foge de qualquer fixação ou a faz sem qualquer base, comprando o dobro, ou o triplo, sem qualquer justificativa, haverá ato ilícito.
    Finalmente, algumas vezes é contratada a prestação de serviço público, com ou sem licitação, como forma de burlar a regra constitucional da admissão após aprovação em concurso público. Esta hipótese deve ser tratada sob a ótica da contratação sem concurso público.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    No caso de desnecessidade da contratação:

    No caso de excesso de quantitativos:

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    2. Pagamentos antecipados

    Outra questão que surge é o do pagamento antecipado, que é proibido por lei.

    Para constatar a sua ocorrência, há que se confrontar a data do cumprimento da obrigação e a data do pagamento realizado. Note-se que não basta que este confronto seja feito com as notas de empenho. Estas são contemporâneas à contratação, já que é proibida a despesa sem prévio empenho. Há que se ter em mãos a data do pagamento.

    No caso de o contrato prever o pagamento antecipado, há que se distinguir duas situações: se o contrato estiver de acordo com o edital de licitação (esta é a regra, mas nem sempre acontece), em geral será suficiente expedição de recomendação ao agente, alertando-o da ilegalidade da situação.

    Caso o pagamento antecipado não esteja previsto – e não deve estar, como mencionado no parágrafo anterior –, vale dizer, se na licitação era previsto o pagamento em determinado prazo após o cumprimento da obrigação e, mesmo assim, no contrato previu-se o pagamento antecipado, o caso será de ajuizamento de ação.

    Com mais razão é o caso de ajuizamento de ação se o contrato – com redação igual à do edital – previu o pagamento em determinado prazo e, não obstante, foi ele realizado antecipadamente.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    3. Celebração de contrato para acobertar desvio de verba pública

    Não é raro deparar com casos em que há celebração de contrato administrativo como forma de justificar o desvio de verba pública. Em geral, o objeto da contratação são serviços, cuja existência física mostra-se difícil de apurar. Contrata-se com algum parceiro ou, por vezes, com empresas que não existem de fato.

    Nestas hipóteses, inicialmente há que ser buscado o registro da empresa para verificar se ela, efetivamente, existe.
    Também é importante verificar, junto à autoridade fiscal, a situação dela, vale dizer, se está ou não em atividade. E solicitar que seja verificada, por esta autoridade, a efetiva emissão da nota fiscal que deu ensejo ao pagamento.

    Tudo isto sem prejuízo de buscar subsídios acerca da efetiva prestação dos serviços, o que pode se dar pela requisição dos documentos que a demonstrem, ou pela coleta de prova testemunhal.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    4. Pagamentos a maior

    O pagamento a maior pode ocorrer pela entrega de valor superior ao da prestação, pelo reajuste ou pela revisão indevidos da obrigação. Nestes casos, há necessidade de cálculo do valor pago a mais, valor este que será igual ao do dano causado ao erário.
    Em regra, no pagamento do valor superior ao da prestação, haverá necessidade de perícia contábil para apurar se houve o pagamento a maior.

    Também aqui não é suficiente a prova do empenho: há necessidade de comprovar o efetivo pagamento, confrontando-o com o contrato e com as medições realizadas.

    Outra forma de pagamento a maior é a concessão de reajuste quando ele não era cabível.

    E, finalmente, há que se considerar o pagamento a maior decorrente de revisão incabível de preços.

    A revisão de preços encontra suporte legal no artigo 65, II, “d”, da Lei de Licitações, sendo cabível “para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual”.
    Por aí se vê que não é qualquer aumento de custo que possibilita a revisão do contrato. Apenas fatos supervenientes e que, ademais, sejam, imprevisíveis, ou previsíveis mas de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado (afora a hipótese de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, necessariamente supervenientes e que configurem álea econômica extraordinária).

    Não constituem fatos imprevisíveis, ou previsíveis, de consequências extraordinárias: (1) a inflação (STJ, 2ª. Turma, REsp n. 744446/DF, Relator Min. Humberto Martins, julg. 17.04.2008, v.u); (2) a existência de dissídio coletivo relativo aos empregados do contratado (STJ, 2ª. Turma: AgRg no AREsp n. 132095/SP, Relator Min. Castro Meira, julg. 21.06.2012, v.u; REsp n. 411.101/PR, Relatora Min. Eliana Calmon, julg. 07.08.2003, v.u; REsp n.; 776790/AC, Relator Min. Mauro Campbell Marques, julg. 15.10.2009, v.u; AgRg no REsp 957999/PE, Relator Min. Mauro Campbell Marques, julg. 22.06.2010, v.u; AgRg no REsp 695912/CE, Relator Min. Mauro Campbell Marques, julg. 17.11.2009, v.u; REsp n. 382.260/RS, Relatora Min. Eliana Calmon, julg. 03.12.2002, v.u)
    De outra parte, quando cabível a revisão, ela deve ser contada da data da proposta ou, se tiver ocorrido já uma revisão de preços, da data desta última.

    Lembre-se que o artigo 5º, “caput”, da Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, dispõe que são considerados lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, os atos praticados por pessoas jurídicas que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil: “g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública”.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    5. Falsas medições ou recebimento

    As medições – termo utilizado quando se trata de obra ou serviço de engenharia – ou o recebimento – termo adequado para produtos e os demais serviços - realizados por agente público especialmente designado para este fim devem, evidentemente, retratar a realidade. No entanto, constatam-se inúmeros casos em que elas são falsas, quer no que se refere à quantidade, quer no que se refere à qualidade.

    A natureza da prestação a ser fornecida à Administração determinará o tipo de providência que deve ser adotada para a investigação.

    A regra é que qualquer serviço seja recebido ou medido com a comprovação de sua prestação. Quanto a produtos, deve haver, sempre, o recebimento do material. As obras devem ser medidas, de tudo resultando comprovação suficiente do cumprimento da obrigação.

    Nem sempre, todavia, existirão elementos documentais que possibilitem comprovar que o recebimento ou medição são falsos. Muitas vezes, apenas a prova testemunhal será possível, v.g., quando determinado serviço de vigilância não foi prestado em determinado período.

    Outras vezes, a prova pericial se mostrará indispensável, especialmente quando se tratar de obra, quer quanto à sua realização efetiva, quer no que respeita à qualidade.

    É indispensável que a investigação parta do contrato celebrado pela Administração e dos recebimentos/medições realizados e respectivos pagamentos.

    A partir daí, dependendo da prestação, a atuação deverá ser direcionada à realização de perícia, quando possível, ou à coleta de prova testemunhal.

    Os produtos recebidos deverão, obrigatoriamente, ser registrados no setor próprio e daí distribuídos às unidades destinatárias. É importante que os autos contenham, ao lado do recebimento, o registro da entrada no setor e a distribuição às unidades requisitantes. O saldo físico deve estar no almoxarifado.

    É útil acionar a autoridade fazendária para que esta verifique a expedição de notas fiscais representativas da venda.
    A qualidade do produto deve ser a exigida no edital. Para constatar que a prestação foi corretamente entregue, isto é, que o produto tem a qualidade exigida no edital, muitas vezes é indispensável que haja exame pericial demonstrando que a qualidade entregue não correspondeu à adquirida e, ainda, que é inferior à contratada. Isto demonstrado, cumpre fazer avaliação do produto entregue e o comprado, apurando-se a diferença em favor do erário. Esta diferença será o valor do dano.

    Os serviços comuns podem deixar registros materiais ou não. Caso deixem – por exemplo, o conserto de determinado equipamento – o caminho a seguir será o mesmo indicado para os produtos. Caso não, a prova testemunhal será o único caminho para apurar a sua efetiva prestação ou a qualidade inferior à contratada.

    Serviços e obras de engenharia são objeto de medições. Em geral, será indispensável a realização de perícia e a apuração do valor do montante que deixou de ser realizado ou, no caso de qualidade, a diferença entre o contratado e o medido.
    Falsas medições ou recebimentos implicam que os agentes públicos responsáveis por elas também integrem o pólo passivo de ação civil pública de responsabilidade por ato de improbidade administrativa.

    Por fim, deve ser lembrado que constitui crime, previsto no artigo 96 da Lei de Licitações, punido com pena de detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa, “fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: (...) II – vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada: III – entregando uma mercadoria por outra; IV – alterando substância, qualidade ou quantidade da mercadoria fornecida”.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    6. Alterações contratuais

    A lei possibilita que a Administração proceda a alterações contratuais. Mas esta possibilidade encontra limites na lei. É o quanto disposto no artigo 65, I da Lei nº 8.666/93, que dispõe que os contratos podem ser alterados, com as devidas justificativas, quando (a) houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos ou (b) necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites constantes da Lei. Estes limites estão previstos no § 1º do citado artigo 65, sendo de até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato e, no caso de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.
    Deve ser apontado que o limite para a majoração é o valor atualizado do contrato na data do aditamento.

    Qualquer alteração contratual deve ser devidamente motivada pela autoridade administrativa. E, pela teoria dos motivos determinantes, esta ficará vinculada aos fundamentos alegados.

    As alterações podem ocorrer para majoração ou supressão do objeto. No entanto, as irregularidades acontecem quando se trata de majoração, não se conhecendo caso que tenha originado ação civil pública de responsabilidade por improbidade administrativa em hipótese de supressão do objeto. Registre-se, no entanto, que a não alteração do contrato quando a hipótese determinar a supressão pode dar ensejo à improbidade administrativa.

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    6.1. Modificação do objeto

    Em caso de modificação, há necessidade de se verificar se ela ocorreu dentro do objeto inicialmente contratado ou se, ao contrário, implicou em novo objeto. Lembre-se a Súmula 261 do Tribunal de Contas da União: “Em licitações de obras e serviços de engenharia, é necessária a elaboração de projeto básico e adequado e atualizado, assim considerado aquele aprovado com todos os elementos descritos no artigo 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, constituindo prática ilegal a revisão de projeto básico ou a elaboração de projeto executivo que transfigurem o objeto originalmente contrato em outro de natureza e propósito diversos”.

    Neste tópico, importante mencionar, também, a súmula 260 do Tribunal de Contas da União: “É dever do gestor exigir apresentação de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART referente a projeto, execução, supervisão e fiscalização de obras e serviços de engenharia, com indicação do responsável pela elaboração de plantas, orçamento-base, especificações técnicas, composições de custos unitários, cronograma físico-financeiro e outras peças técnicas”.

    Não se admite que em caso de modificação, seja inserido objeto novo no anteriormente contratado. A contratação assim feita equivalerá à contratação sem licitação.

    Nem sempre será possível concluir se a modificação acarretou a inclusão de novo objeto. Em casos assim, será indispensável a realização de perícia, para que reste esclarecido se as modificações ocorreram dentro do objeto anteriormente contratado.
    A título exemplificativo, não há dúvida de que o contrato de serviços de hidráulica não pode ter o seu objeto majorado para incluir serviços de jardinagem, à vista da natureza completamente diversa de cada um deles; a contratação da instalação de uma caixa d’água, igualmente, não pode ser majorada para a inclusão da instalação de um portão. O objeto deve permanecer o mesmo e a majoração deve decorrer de fatos imprevistos e imprevisíveis. Exemplificando, se na realização dos serviços de hidráulica for percebido que os condutores inicialmente previstos não podem ser colocados na forma imaginada pela Administração, mas apenas de outra forma, que dispenderá mais material, o acréscimo pode ser feito; se a instalação da caixa d’água demandar algum reforço estrutural não previsto, o acréscimo também poderá ser feito. Sempre observando os limites legais.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    6.2. Majoração de quantitativos

    Vale, aqui, o quanto já afirmado com relação à necessidade de contratação, ou seja, verificar se a majoração decorre de efetiva necessidade da Administração. Também vale o quanto já exposto no item jogo de planilhas, lembrando que a alteração contratual após curto período de tempo da celebração do ajuste indica, fortemente, a ocorrência do jogo de planilhas.

    Além disto, muitas vezes licita-se quantidade menor de produtos para a adoção de modalidade licitatória mais simples. Há que se verificar, então, quando houver majoração de quantitativos: (a) se a razão do aumento foi conhecida após a contratação e (b) se com a alteração a contratação permanece dentro dos limites de valor da licitação realizada.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    7. Prorrogação do prazo contratual

    O artigo 57 da Lei nº 8.666/93 permite, em determinados casos, a prorrogação do prazo contratual, vedando o contrato por prazo indeterminado (§ 3º).

    Prorrogar o contrato é prolongar o prazo de sua vigência com o mesmo contratado, nas mesmas condições.
    No entanto, esta prorrogação só pode ocorrer se prevista no ato convocatório e não constitui direito do contratado. Deve ocorrer, apenas, se interessar à Administração. Daí porque toda prorrogação de prazo deve ser justificada por escrito e previamente autorizada pela autoridade competente para celebrar o contrato (art. 57, § 2º). Registre-se que só se prorroga contrato ainda em vigor, sendo inadmissível a prorrogação de contrato cujo prazo já encontrou seu termo final.

    Assim, diante da notícia da prorrogação indevida de prazo contratual, é de rigor verificar se a prorrogação está prevista no ato convocatório e se o prazo dela obedece aos parâmetros previstos no artigo 57 e, ainda, se o objeto do contrato admite a prorrogação. Atente-se que a prorrogação não deve ser tácita, mas expressa e justificada. A não prorrogação independe de motivação, uma vez que o término do prazo do contrato opera, por si só, a extinção do vínculo entre as partes, independentemente de qualquer outra providência.

    A prorrogação não admite que se estipulem novas cláusulas contratuais: “Termo aditivo a contrato administrativo que fixa novo período de prestação de serviço, mas mediante novas condições, não previstas no contrato original, introduzidas mediante negociação superveniente à licitação constitui, não uma simples prorrogação de prazo, mas um novo contrato” (STJ, 1ª. Turma, RMS n. 24.118/PR, Relator Min. Teori Zavascki, julg. 11.11.2008)

    Anote-se que no caso de serviços contínuos, a prorrogação deve ocorrer com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosos para a Administração, limitada a sessenta meses (art. 57, II).

    A Lei, ainda, admite a denominada prorrogação excepcional (art. 57, § 4º), por até doze meses, por ato justificado e mediante autorização da autoridade superior. Esta prorrogação excepcional não pode ocorrer com fundamento em vantagem para a Administração, mas, sim, com fulcro em fato imprevisto ou imprevisível, que possa vir a acarretar a paralisação de serviços contínuos.
    Os requisitos da prorrogação excepcional são muito mais rigorosos e devem, igualmente, ser demonstrados pela autoridade administrativa.

    Havendo prorrogação indevida, o novo ajuste equivalerá à contratação sem prévia licitação.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

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    8. Subcontratação indevida e delegação da execução do contrato

    Casos existem em que o contratante delega a execução do contrato a terceiros, total ou parcialmente. Trata-se da subcontratação, que só é lícita quando a sua possibilidade e os seus limites estão previstos no ato convocatório e no contrato. Não havendo disposição expressa neste sentido, a subcontratação é proibida (art. 72 da Lei de Licitações) e constitui causa para rescisão contratual por culpa do contratado (art. 78, VI, da Lei n. 8.666/93).

    Havendo notícia de subcontratação, é importante verificar se a subcontratação foi permitida, e em que limite.
    Muitas vezes, há verdadeira delegação da execução do contrato a terceiro. Em geral isto ocorre para driblar proibição de contratação com o Poder Público (caso de empresas pertencentes a agente público, por exemplo) ou requisitos de habilitação. Assim, um terceiro se apresenta para licitar e, sendo vencedor, assina contrato cuja execução é realizada por outrem.

    Esta hipótese pode ser provada por prova testemunhal ou por filmagens e fotografias do local de execução do serviço ou da obra, se ela ainda estiver em andamento. Em geral, ali ficam os veículos e equipamentos do verdadeiro executor, além de empregados, que poderão declarar o nome de seu empregador e fornecer cópia de sua carteira de trabalho.

    Também é importante ouvir o contratado e o real executor e deles solicitar a prova de pagamento deste último, a fim de investigar a existência de superfaturamento.

    Também é importante requisitar do contratante cópia dos cheques que serviram como pagamento, para ali verificar se foram depositados na conta corrente dele ou de terceiro. Se este terceiro for o apontado executor real do contrato, a prova da delegação será mais robusta. Se não for, em busca da mesma robustez, é possível requerer a quebra do sigilo bancário do contratado e do executor, na época dos pagamentos, para verificar se a movimentação bancária estabelecida entre ambos demonstra o pagamento pelo serviço total ou parcialmente delegado.

    Diligências a serem realizadas no inquérito civil:

    O auxílio do Tribunal de Contas e das Corregedorias Administrativas

    Muitas vezes, na apuração da ilegalidade em casos de execução ou alteração contratual mostra-se inestimável o auxílio do Tribunal de Contas e, onde houver, das Corregedorias Administrativas. Em geral, a notícia das irregularidades vem destes Órgãos, que tratam de apontar a falta.

    Nestes casos, a investigação parte destas comunicações, restando obter a documentação e laudos faltantes e de estabelecer o imprescindível elemento subjetivo necessário para caracterizar ato de improbidade administrativa.
    Por outro lado, nem sempre será apontado o valor do dano. Sendo possível estabelecê-lo, a improbidade administrativa configurada será a prevista no artigo 10 da Lei n. 8.429/92. Caso contrário, restará a incidência do art. 11 da mesma Lei.
    Finalmente, nem sempre a conduta dos ímprobos será a mesma. Tome-se o exemplo de falsa medição: a conduta do servidor encarregado da tarefa será uma, a do agente pagador será outra e, finalmente, a da empresa será, ainda, outra. É indispensável que a petição inicial descreva a conduta de cada um dos Réus, quando a participação de cada um nos fatos for diversa.

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    CAPÍTULO 08

    EXTENSÃO DAS SANÇÕES APLICADAS ÀS EMPRESAS E POSTURA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

    Nossa legislação disciplina que, em algumas situações, as pessoas jurídicas de direito privado, em razão de condutas anteriormente praticadas em detrimento dos princípios da legalidade e da moralidade, tornam-se suspensas ou impedidas de contratar com o Poder Público.

    Afora as sanções dispostas na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/13) e em outros diplomas legais (vide Anexo I), a Lei nº 8.666/93, em seus artigos 87 e 88, disciplina os casos em que a Administração Pública poderá aplicar sanções administrativas a empresas que não se portaram adequadamente perante o ente, sendo de relevância, para o presente tópico, transcrever os textos:
    “Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

    (...)

    III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

    IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior”.

    “Art. 88. As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por esta Lei:

    I – tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;

    II – tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;

    III – demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados.”

    Ainda sob o enfoque administrativo, o artigo 7º da Lei nº 10.520/02 (que instituiu o pregão), regra a possibilidade de impedimento da pessoa jurídica de direito privado de contratar com o Poder Público, por prazo não superior a 5 (cinco) anos:
    “Art. 7º. Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4º desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais”.

    Daí se extrai que, administrativamente, o Poder Público dispõe de poderosa arma para extirpar (mesmo que temporariamente) do rol de empresas passíveis de contratação, aquelas que não são confiáveis, seja pela inexecução (parcial ou total) de contrato, seja por fatores outros que podem ser estendidos para todas as situações em que se entenda pela inidoneidade da empresa.

    Tal possibilidade decorre do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, ainda que em relações contratuais, conforme disciplinado pelo artigo 54 da Lei nº 8.666/93: o Poder Público pode impor, desde que assegurada a defesa da empresa, as penalidades de suspensão de contratar e de declaração de inidoneidade, independentemente de pronunciamento judicial.

    A par disto, a Lei nº 8.429/92, no rol das penas aplicadas em casos de improbidade administrativa, estabelece no artigo 12, incisos I, II e III, que as pessoas jurídicas de direito privado podem ser condenadas judicialmente à proibição de contratar com o Poder Público, direta ou indiretamente, pelos prazos, respectivamente, de 10 (dez), 5 (cinco) ou 3 (três) anos.

    Em todos os casos, em que pese a existência de opiniões contrárias a respeito, prevalece o entendimento de que a suspensão temporária, a declaração de inidoneidade e a proibição de contratação temporária, devem abranger todos os entes de direito público, e não apenas aquele que teve seu patrimônio lesado pela empresa.

    Há corrente doutrinária que entende que as penalidades de suspensão temporária de licitar e de declaração de inidoneidade restringem-se apenas às licitações do ente público que as aplicou, ou seja, o efeito é restritivo48. [48. Vide Carlos Ari Sundfeld, in A Abrangência da declaração de inidoneidade e da suspensão de participação em licitações, Web Zênite – 240/169/março/2008, e ToshioMukai, Novo Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos Administrativos, São Paulo, 2ª ed.]

    Outra parte da doutrina49 admite o efeito extensivo a todos os entes da Administração Pública no caso de declaração de inidoneidade, e o efeito restritivo (aplicação somente pelo ente que impôs a sanção) no caso de suspensão temporária. Tal corrente entende que o artigo 87, inciso III, da Lei nº 8.666/93 (que versa sobre a suspensão temporária), ao expressar apenas o vocábulo Administração, dá margem à interpretação que se refere apenas à pessoa jurídica de direito público que aplicou a sanção (interpretação extraída do artigo 6º, inciso XII, da Lei nº 8.666/93), ao tempo em que o artigo 87, inciso IV, como consta a expressão Administração Pública, faz compreender todos os entes públicos, e não apenas o que determinou o sancionamento (entendimento extraído do artigo 6º, inciso XI, da Lei nº 8.666/93). [49. Marçal Justen Filho, in Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 382.]

    Entretanto, apesar de tais entendimentos acerca do assunto, não se pode admitir interpretação restritiva em quaisquer dos casos.

    Não se mostra razoável, nem mesmo legítimo sob os olhos dos princípios que devem reger a Administração Pública, dentre eles os da legalidade, moralidade e eficiência, que determinada empresa não possa contratar com o Município X, mas esteja apta, mesmo suspensa, declarada inidônea ou proibida, a contratar ou participar de licitação com o Município Y (muitas vezes vizinho do primeiro), com o Estado a qual pertence o Município X, ou mesmo com a União.

    Inviável que a pessoa jurídica de direito privado que já se mostrou inapta a firmar e a dar cumprimento a contratos públicos, tenha tratamento diferenciado perante os entes da Administração e, ao contrário do apurado em seu detrimento, seja considerada idônea por outra pessoa de direito público.

    As sanções mencionadas têm reflexo patrimonial na pessoa jurídica de direito privado, buscam puni-la de modo severo, limitando a possibilidade de auferir lucros mediante contratos travados com a Administração Pública.

    Resultaria letra morta na legislação a possibilidade da empresa ser condenada a não contratar com determinado ente público e, em contrapartida, ser agraciada com contratos públicos até mesmo mais vultosos ao que gerou a condenação.
    A pessoa jurídica de direito privado, a partir do momento em que sofre a penalidade (administrativa ou judicialmente), recebe um título, assim como ocorre com pessoas que cometem infrações penais, de maus antecedentes, que deve ser observado por todos os entes públicos que estejam prestes a contratá-la.

    Nem se pode dizer, também, que a diferenciação entre as expressões Administração e Administração Pública do artigo 87, incisos III e IV, da Lei nº 8.666/93, pode ser determinante à definição da abrangência da aplicação das penalidades, afinal parte-se do princípio que a Administração Pública é una e somente se divide para melhor atender os interesses dos cidadãos. Também calha destacar que a falta de técnica legislativa pode ter dado margem a tal distinção desnecessária entre as expressões em comento.
    O entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto é pacífico no sentido que as penalidades administrativas aplicadas estendem-se a todos os entes públicos (âmbito nacional) e, por conseguinte, também a sanção prevista na Lei de Improbidade Administrativa de proibição de contratar com o Poder Público:

    “Administrativo. Mandado de segurança. Licitação. Suspensão temporária. Distinção entre Administração e Administração Pública. Inexistência. Impossibilidade de participação de licitação pública. Legalidade. Lei 8.666/93, art. 87, inc. III. É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as figuras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não participação em licitações e contratações futuras. A Administração Pública é uma, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum. A limitação dos efeitos da “suspensão de participação em licitação” não poder ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública. Recurso Especial não conhecido.”

    (STJ, Recurso Especial nº 151567/RJ, rel. Ministro Francisco Peçanha, j. 25/02/2003).

    “Mandado de segurança. Penalidade aplicada com base na Lei 8.666/93. Divulgação no Portal da Transparência gerenciado pela CGU. Decadência. Legitimidade passiva. Lei em tese e/ou ato concreto. Dano inexistente.

    1. O prazo decadencial conta-se a partir da data da ciência do ato impugnado, cabendo ao impetrado a responsabilidade processual de demonstrar a intempestividade.

    2. A Controladoria Geral da União é parte legítima para figurar em mandado de segurança objetivando atacar a inclusão do nome da empresa no PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, por ela administrado.

    3. O writ impugna ato concreto, oriundo do Ministro dirigente da CGU, inexistindo violação de lei em tese.

    4. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a penalidade prevista no art. 87, III, da Lei 8.666/93, suspendendo temporariamente os direitos da empresa em participar de licitações e contratar com a administração é de âmbito nacional.

    5. Segurança denegada”. (STJ, S1 – Primeira Seção, MS 19,657/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 14/08/2013, p. DJe 23/08/2013).

    No mesmo sentido colaciona-se entendimento do E. Tribunal de Justiça de São Paulo:

    “Mandado de segurança. Lei 8.666/93, art. 87, III. É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração – A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum – A limitação dos efeitos da “suspensão de participação de licitação” não pode ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública. Recurso não provido”. (TJSP, Apelação Cível nº 00395542-51.2009, Rel. Des. José Luiz Germano, j. 14/06/2011).
    “Mandado de Segurança. Licitação. Empresa excluída de procedimento licitatório na modalidade de Pregão Presencial. Sentença concessiva, que anulou referido ato da autoridade impetrada e os subsequentes, e determinou designação de nova data para a sessão pública. Ao contrário da interpretação restritiva dada pela r. sentença à cláusula do edital de licitação nº 6.2, a suspensão temporária imposta à impetrante de licitar e contratar com a UNESP, penalidade aplicada com fulcro no artigo 7º da Lei Federal nº 10.520/2002, estende-se a todo e qualquer outro órgão da Administração Pública, consoante também preconiza o artigo 87, inciso III, da Lei Federal nº 8.666/93. Precedentes deste Egrégio Tribunal e do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Recurso oficial, único interposto, provido, para denegar a segurança”.

    (TJSP, Apelação Cível nº 0018567-51.2009.8.26.0071, Rel. Aroldo Viotti, 11ª Câmara de Direito Público, j. 28/05/2013).

    Daí se conclui que o Poder Público, nas vezes que deseja firmar contratos para a realização de obras, serviços ou fornecimento de produtos, tem o dever, diante do atual regramento legal e entendimento jurisprudencial formado, de verificar com cautela as empresas que podem participar da licitação (ou as que podem ser chamadas nos casos de dispensa/inexigibilidade) e, ulteriormente, firmar contratos.

    Independentemente de não estar expressa tal verificação nos artigos 27 a 37 da lei nº 8.666/93 e no artigo 4º, inciso XIII, da Lei nº 10.520/02, que disciplinam a fase de qualificação da pessoa jurídica de direito privado em licitações, é evidente que, para se evitar a contratação de empresa suspensa, declarada inidônea ou proibida de contratar, há a obrigação de avaliar quem é ou não apto a firmar avenças com o Poder Público.

    A falta de verificação acerca da existência de impedimentos legais pode acarretar prejuízos imensos no futuro, o que por certo deve ser evitado pelos agentes públicos.

    Diligências na instrução do inquérito civil:

    Deparando-se com notícias a respeito da participação em licitações de empresas suspensas, declaradas inidôneas ou proibidas de contratar, ou mesmo de contratação de tais empresas sem licitação, deve o Promotor de Justiça instaurar procedimento preparatório de inquérito civil ou inquérito civil (dependendo da verossimilhança das informações recebidas), tomando-se as seguintes providências:

    Jurisprudência:

    Apelação nº 0018567-51.2009.8.26.0071.

    Agravo de Instrumento nº 0261331-82.2012.8.26.0000 - 3ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Camargo Pereira j. 25.06.2013 - Segundo a jurisprudência do STJ, é irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, pois a Administração Pública é una. A descentralização das suas funções serve para melhor atender o bem comum. A suspensão de participação de licitação não pode restringir-se a um órgão do poder público ou apenas a uma esfera administrativa, pois os efeitos da penalidade inabilitam o sujeito para contratação com a Administração como um todo.

    Apelação nº 3001221-53.2013.8.26.0311 – 2ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Luciana Almeida Prado Bresciani j. 12.08.2014. Inabilitação de licitante que figura na relação de sanções administrativas. Penalidade aplicada pelo Estado de São Paulo, com fundamento no artigo 7º da Lei 10.520/2002 – Sanção que não se restringe ao âmbito do órgão ou entidade federativa que impôs a medida – Não comprovada a suspensão judicial dos efeitos da punição imposta – Ausência de impugnação ao edital em tempo oportuno – Ação mandamental julgada improcedente, com denegação da ordem – Sentença mantida – Recurso desprovido.

    Apelação nº 0034032-40.2009.8.26.0576 – 8ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Osni de Souza j. 12.09.2012. Apelação cível. Mandado de segurança. Licitação. Impetração visando desconstituir a decisão de não credenciamento da impetrante no Pregão Presencial nº 011/2009 do Município de São José do Rio Preto. Licitante impedida de contratar com a Administração Pública. Ordem concedida. Reforma que se impõe. Penalidade que não fica circunscrita ao órgão que a aplicou. Exame da doutrina e da jurisprudência. Inadmissibilidade da formulação de pedido de desistência da impetração após a sentença. Precedentes. Reexame necessário acolhido. Recurso voluntário provido.

    STJ – REsp 151.567/RJ – É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as figuras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não-participação em licitações de contratações futuras. A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum. A limitação dos efeitos da “suspensão de participação de licitação” não pode ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública.

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    ANEXO I

    DISPOSITIVOS QUE PODEM RESTRINGIR A PARTICIPAÇÃO EM LICITAÇÃO OU A CONTRATAÇÃO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

    Normas que estabelecem sanções que restringem licitar e/ou contratar com a Administração Pública:

    1) CONSTITUIÇÃO FEDERAL

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 195, § 3º: A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.

    2) LEI 8.429/1992
    Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 12.  Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:
    I – na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;
    II – na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
    III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

    3) LEI 8.666/1993
    Institui normas para licitações e contratos da Administração Pública.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVOS
    Art. 81.  A recusa injustificada do adjudicatário em assinar o contrato, aceitar ou retirar o instrumento equivalente, dentro do prazo estabelecido pela Administração, caracteriza o descumprimento total da obrigação assumida, sujeitando-o às penalidades legalmente estabelecidas.
    Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
    (...)
    III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
    IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
    Art. 88.  As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por esta Lei:
    I - tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;
    II - tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;
    III - demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados.

    4) LEI 8443/1992
    Lei Orgânica do TCU e Leis Orgânicas dos Tribunais de Contas dos Estados e Municípios.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 46. Verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação, o Tribunal declarará a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na Administração Pública Federal.

    5) LEI 8.212/1991
    Dispõe sobre a organização da Seguridade Social.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 95
    (...)
    § 2º A empresa que transgredir as normas desta Lei, além das outras sanções previstas, sujeitar-se-á, nas condições em que dispuser o regulamento: 
    (...)
    c) à inabilitação para licitar e contratar com qualquer órgão ou entidade da administração pública direta ou indireta federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal.

    6) LEI 12.462/2011
    Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 47. Ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas no instrumento convocatório e no contrato, bem como das demais cominações legais, o licitante que:
    I - convocado dentro do prazo de validade da sua proposta não celebrar o contrato, inclusive nas hipóteses previstas no parágrafo único do art. 40 e no art. 41 desta Lei;
    II - deixar de entregar a documentação exigida para o certame ou apresentar documento falso;
    III - ensejar o retardamento da execução ou da entrega do objeto da licitação sem motivo justificado;
    IV - não mantiver a proposta, salvo se em decorrência de fato superveniente, devidamente justificado;
    V - fraudar a licitação ou praticar atos fraudulentos na execução do contrato;
    VI - comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal; ou
    VII - der causa à inexecução total ou parcial do contrato.

    7) LEI 10.520/2002
    Lei dos Pregões.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 7º  Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4o desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.

    8) LEI 12.529/2011
    Dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 38.  Sem prejuízo das penas cominadas no art. 37 desta Lei, quando assim exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público geral, poderão ser impostas as seguintes penas, isolada ou cumulativamente: 
    (...)
    II - a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitação tendo por objeto aquisições, alienações, realização de obras e serviços, concessão de serviços públicos, na administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, bem como em entidades da administração indireta, por prazo não inferior a 5 (cinco) anos.

    9) LEI 12.232/2010
    Dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratação pela Administração Pública de serviços de publicidade.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 18.  É facultativa a concessão de planos de incentivo por veículo de divulgação e sua aceitação por agência de propaganda, e os frutos deles resultantes constituem, para todos os fins de direito, receita própria da agência e não estão compreendidos na obrigação estabelecida no parágrafo único do art. 15 desta Lei. 
    (...)
    § 2o  As agências de propaganda não poderão, em nenhum caso, sobrepor os planos de incentivo aos interesses dos contratantes, preterindo veículos de divulgação que não os concedam ou priorizando os que os ofereçam, devendo sempre conduzir-se na orientação da escolha desses veículos de acordo com pesquisas e dados técnicos comprovados. 
    § 3o  O desrespeito ao disposto no § 2o deste artigo constituirá grave violação aos deveres contratuais por parte da agência contratada e a submeterá a processo administrativo em que, uma vez comprovado o comportamento injustificado, implicará a aplicação das sanções previstas no caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

    10) LEI 9.504/1997
    Estabelece normas para eleições.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações.
    § 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.
    § 2º A doação de quantia acima do limite fixado neste artigo sujeita a pessoa jurídica ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso.
    § 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, a pessoa jurídica que ultrapassar o limite fixado no § 1º estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos, por determinação da Justiça Eleitoral, em processo no qual seja assegurada ampla defesa.

    11) LEI 9.605/1998
    Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:
    (...)
    XI - restritiva de direitos.
    (...)
    § 8º As sanções restritivas de direito são:
    (...)
    V - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até três anos.

    12) LEI 12.527/2011
    Regula o acesso à informações.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanção para licitar e contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 33.  A pessoa física ou entidade privada que detiver informações em virtude de vínculo de qualquer natureza com o poder público e deixar de observar o disposto nesta Lei estará sujeita às seguintes sanções: 
    (...)
    IV - suspensão temporária de participar em licitação e impedimento de contratar com a administração pública por prazo não superior a 2 (dois) anos; e 
    V - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública, até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade.

    13) LEI 13.019/14
    Estabelece o regime jurídico das parcerias voluntárias.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Sanções administrativas à entidade.
    DISPOSITIVO
    Art. 73. Pela execução da parceria em desacordo com o plano de trabalho e com as normas desta Lei e da legislação específica, a administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar à organização da sociedade civil parceira as seguintes sanções:
    I - advertência;
    II - suspensão temporária da participação em chamamento público e impedimento de celebrar termos de fomento, termos de colaboração e contratos com órgãos e entidades da esfera de governo da administração pública sancionadora, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
    III - declaração de inidoneidade para participar em chamamento público ou celebrar termos de fomento, termos de colaboração e contratos com órgãos e entidades de todas as esferas de governo, enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que a organização da sociedade civil ressarcir a administração pelos prejuízos resultantes, e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso II deste artigo.
    Parágrafo único. A sanção estabelecida no inciso III do caput deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado ou do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação.

     

    Normas que estabelecem exigências
    que podem restringir licitar e/ou
    contratar com a Administração Pública:

    1) LEI 8.666/1993
    Institui normas para licitações e contratos da Administração Pública.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Exigência para licitar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 27.  Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a:
    (...)
    IV – regularidade fiscal e trabalhista; 
    (...)
    Art. 29.  A documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista, conforme o caso, consistirá em:  
    (...)
    III - prova de regularidade para com a Fazenda Federal, Estadual e Municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra equivalente, na forma da lei;
    IV - prova de regularidade relativa à Seguridade Social e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), demonstrando situação regular no cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei.
    V – prova de inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, mediante a apresentação de certidão negativa, nos termos do Título VVI-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.

    2) LEI 8.212/1991
    Dispõe sobre a organização da Seguridade Social.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Exigência para contratar com a Administração Pública.
    DISPOSITIVO
    Art. 47. É exigida Certidão Negativa de Débito-CND, fornecida pelo órgão competente, nos seguintes casos:
    I - da empresa:
    na contratação com o Poder Público e no recebimento de benefícios ou incentivo fiscal ou creditício concedido por ele.

    3) LEI 8.036/1990
    Dispõe sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

    ASSUNTO
    Regularidade Trabalhista.
    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Exigência para licitar com a Administração Pública
    DISPOSITIVO
    Art. 27. A apresentação do Certificado de Regularidade do FGTS, fornecido pela Caixa Econômica Federal, é obrigatória nas seguintes situações:
    a) habilitação e licitação promovida por órgão da Administração Federal, Estadual e Municipal, direta, indireta ou fundacional ou por entidade controlada direta ou indiretamente pela União, Estado e Municípios.

    4) LEI 13.019/14
    Estabelece o regime jurídico das parcerias voluntárias.

    TIPO DE RESTRIÇÃO
    Vedações.
    DISPOSITIVO
    Art. 39. Ficará impedida de celebrar qualquer modalidade de parceria prevista nesta Lei a organização da sociedade civil que:
    (...)
    V - tenha sido punida com uma das seguintes sanções, pelo período que durar a penalidade:
    a) suspensão de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração.

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    ANEXO II

    CADASTROS EXISTENTES COM INFORMAÇÕES SOBRE CONDENAÇÕES
    Cadastro/Condenação Responsável Link para acesso por meio de internet
    Consulta à Certidão Negativa de Débito
    (CND) Débito com a Seguridade Social – Previdência
    RFB, Dataprev e PGFN
    https://www.receita.fazenda.gov.br/aplicacoes/atspo/certidao/cndconjuntainter/informanicertidao.asp?tipo=1
    Certificado de Regularidade do FGTS (CRF) Débito com a Seguridade Social (FGTS) CEF https://www.sifge.caixa.gov.br/Cidadao/Crf/FgeCfSCriteriosPesquisa.asp
    Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT) Débito Trabalhista TST http://tst.jus.br/certidao
    Certidão Conjunta de Débitos Relativos a Tributos Federais e Dívida Ativa da União Cadastro das Fazendas Estaduais Cadastro das Receitas Municipais Irregularidade com a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal RFB e PGFN http://www.receita.fazenda.gov.br/ Aplicacoes/ATSPO/Certidao/CndConjuntaInter/InformaNICertidao. asp?Tipo=1 Secretaria Estadual da Fazenda Secretaria Municipal da Fazenda Obs.: cadastros das esferas estadual e municipal devem ser buscados nos respectivos sites
    Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa e por Ato que implique Inelegibilidade (CNCIAI) Improbidade administrativa CNJ http://www.cnj.jus.br/improbidade_adm/consultar_requerido.php
    Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEI) CGU http://www.portaldatransparencia.gov.br/ceis
    Cadastro de Inidôneos Declaração de Inidoneidade pelos Tribunais de Contas TCU http://portal2.tcu.gov.br/portal/ page/portal/TCU/comunidades/responsabilizacao/inidoneos TCEs e TCMs Obs.: cadastros de esferas estadual e municipal devem ser buscados nos respectivos sites.
    Cadastro de Inabilitados Inabilitação para ocupar cargo em comissão ou função de confiança TCU http://portal2.tcu.gov.br/portal/ page/portal/TCU/comunidades/responsabilizacao/inabilitados
    Cadastro de Expulsões da Administração Federal (CEAF) Demissão CGU http://www.portaldatransparencia. gov.br/expulsoes/entrada
    Cadastro de Responsáveis com Contas Julgadas Irregulares Cadastro Integrado de Condena- ções por Ilícitos Administrativos (CADICON) Contas Julgadas Irregulares TCU http://portal2.tcu.gov.br/portal/ page/portal/TCU/comunidades/responsabilizacao/irregulares

    https://contas.tcu.gov.br/cadicon/procura

     

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