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Friday , 18 de september de 2015

‘MP tem de ser protagonista na reforma processual penal’

Para diretor do CEJA, promotor precisa controlar investigação para decidir o que entra no sistema
Para diretor do CEJA, promotor precisa controlar investigação para decidir o que entra no sistema

O Ministério Público precisa assumir o papel de protagonista em uma reforma processual penal no Brasil e a instituição só conseguirá decidir de fato quais casos devem entrar ou não no sistema se controlar as investigações policiais. Nosso modelo é inadequado para um Estado Democrático de Direito e os julgamentos mais parecem representações teatrais.

As afirmações são do diretor-executivo do CEJA (Centro de Estudos de Justiça das Américas, ligado à OEA), Jaime Arellano Quintana, que veio a São Paulo na semana passada para participar do II Encontro Nacional do Ministério Público. Ele e sua equipe trouxeram detalhes do estado da arte do direito processual penal no continente e apontaram caminhos que o Brasil poderia seguir para adaptar seu sistema à Convenção Americana dos Direitos Humanos e à própria Constituição Federal de 1988.Jaime Arellano Quintana assina convênio entre CEAF e CEJA

Uma das maiores autoridades no assunto, o chileno foi vice-ministro de Justiça de seu país no governo de Ricardo Lagos (2000-2006), justamente no período em que o Chile implementou sua a reforma processual penal. Desde Santiago, Arellano e os especialistas do CEJA ajudaram a implementar e monitoram reformas em países como Argentina, México, Panamá e República Dominicana.

Em entrevista concedida após o encontro, Arellano explicou as diferenças entre o atual sistema brasileiro --baseado no Código de Processo Penal de 1941-- e os modelos implementados nas últimas décadas por nossos vizinhos, que garantem maior sintonia com o Estado Democrático de Direito, segundo o diretor do CEJA. Ele também destacou a importância da parceria firmada com o CEAF (Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional) do Ministério Público de São Paulo, que permitirá novos eventos conjuntos e cursos específicos para promotores de Justiça.

Veja abaixo a íntegra da entrevista.

 

Como o CEJA avalia esse encontro com membros do Ministério Público brasileiro?

Ficamos muito contentes com essas primeiras jornadas realizadas pelo CEAF e o CEJA. Acho que alcançamos todos os objetivos. Da nossa parte, conseguimos entender melhor o sistema de Justiça penal brasileiro e o papel que o Ministério Público --tanto o Federal como os dos Estados-- cumprem nesse sistema fundamentalmente escrito que existe no país. Por outro lado, sentimos que os participantes do evento receberam uma visão bastante variada sobre as experiências latino-americanas. Era o que queríamos: dar um leque de opções e soluções possíveis para que conhecessem. Porque não há receitas. E o Ministério Público brasileiro vai ter que ir encontrando o caminho adequado para de alguma maneira definir uma nova identidade.

 

Qual seria o caminho natural de uma reforma processual penal brasileira?

O CEJA entende que um sistema acusatório e adversarial é o que melhor satisfaz o devido processo, as garantias que exige o Sistema Interamericano de Justiça e o sistema democrático de direito. Por isso, fazemos um convite para que o Brasil avance por esse caminho. A reflexão que aconteceu aqui em São Paulo foi muito rica. Percebe-se que já existe [dentro do MP] uma reflexão de anos e um debate sobre este tema, que permitiu a identificação dos pontos cruciais que precisam ser melhorados para que se aproxime mais do ideal acusatório e adversarial.

Um aspecto fundamental é declarar e instalar fortemente a ideia de que o MP deve dirigir a investigação penal. Um sistema acusatório só vai funcionar e só vai dar garantias quando o MP efetivamente cumprir o papel de motor e de custódio das portas de entrada e de saída desse sistema. Para isso, o MP precisa dirigir a investigação e o trabalho da polícia. O cérebro da investigação tem de ser o MP, porque ele vai ter que apresentar o caso mais tarde diante do juiz ou de um tribunal.

 

Jaime Quintana, diretor-executivo do CEJA, fala na abertura do II Encontro NacionalO senhor poderia citar algumas características do sistema acusatório que teriam de ser assimiladas pelo Brasil em uma mudança desse tipo?

É uma mudança de paradigma, gigantesca. O sistema que existe no Brasil é fundamentalmente escrito, que produz um inquérito policial. Um sistema acusatório, por definição, tem uma investigação desformalizada, dirigida pelo MP, que tem uma pasta de papeis e expedientes sem nenhum valor probatório. São simplesmente elementos e anotações que o MP faz enquanto dirige a investigação da polícia. A defesa precisa ter acesso a esse material, para que exista paridade de armas. Mas tudo isso não são mais que anotações, como eu poderia ter em meu caderno. O que importa para se tomar a decisão é o que se apresenta nas diferentes audiências (de controle de detenção, de preparação, e de juízo oral, etc).

Em suma, é na audiência que ocorre a entrega de provas. Antes da audiência, o que há são evidências. Na audiência, se produzem provas. Quem admite as provas? O juiz. Quem as apresenta? O Ministério Público ou a defesa e cada uma das partes debate e questiona as provas do outro, porque esse é o conceito. Disso, surge um contraditório, com um juiz imparcial que não sabe nada do assunto antes da audiência e que então se inteira de tudo pelas falas do promotor, do defensor e das testemunhas. Ele então depura essa informação e se aproxima do que realmente aconteceu justamente pelo trabalho contraditório de ambas as partes, que vão se questionando reciprocamente.

Por isso, é tão importante que ocorra esse debate. Nada pode ficar para antes e nada pode acontecer depois, porque se ocorre fora da audiência entra imediatamente a suspeita e o véu que está sempre escuro no sistema escrito: quem produziu a prova? Por que o juiz tem de acreditar na prova que está no inquérito policial? Como o juiz pode questionar, por exemplo, a perícia se o perito não está em sua frente para contar como ela foi feita? E se não há um defensor que, por exemplo, questiona o quão qualificado é esse perito? Caberá ao promotor defender essa prova de acusação.

 

Qual é a principal distorção que o sistema escrito gera?

Em um sistema escrito, no fundo, tudo acontece na etapa prévia ao julgamento e está restrito ao inquérito que o promotor recebe da polícia. Então, fundamentalmente, foi a polícia que, ao montar o inquérito, tomou as decisões. Esse inquérito se transforma na pasta de investigação do MP e, finalmente, se converte depois no processo de julgamento. Nesse caminho, não houve nenhum filtro, nenhum questionamento. Quando chega às mãos do juiz, a audiência ou suposta audiência que há no procedimento brasileiro mais parece uma representação teatral de algo que já está dado.

No sistema escrito, as provas podem aparecer ou desaparecer sempre. Somem ou aparecem folhas no meio da noite, ou se queimam expedientes. Como é material, se o processo for perdido, o julgamento será perdido. Em um sistema acusatório, podem queimar a pasta do promotor. Não importa. Se o promotor se lembra e tem as testemunhas e os peritos, o julgamento ocorrerá na audiência, não antes. Então, nada desaparece, a não ser que seja prova documental.

Então, o sistema acusatório, em relação ao inquisitivo, é mais transparente, mais rápido, gera informações de melhor qualidade e garante um devido processo e o direito de defesa. Em um sistema acusatório não é raro que, quando começa a haver uma má defesa, o juiz pare o julgamento e diga: ‘um momento, vou declarar abandono da defesa porque, senhor defensor, você não está fazendo seu trabalho’. Isso faz com que a audiência seja imediatamente suspensa para substituição, porque o juiz quer estar seguro que no processo vai haver contraditório de qualidade e que vão ajudá-lo a depurar as provas para tomar sua decisão.

 

Jaime Arellano Quintana fala durante II Encontro Nacional

O senhor pode citar exemplos de países em que esse sistema já foi implementado e está mais desenvolvido?

Um dos motivos pelos quais o CEJA foi instalado no Chile é porque o país desenhou a partir de 1995 provavelmente um dos sistemas acusatórios mais bem pensados, justamente aprendendo com os acertos e os erros do demais que já haviam iniciado reformas. Por isso, no Chile, há um sistema acusatório bastante desenvolvido, que foi instalado entre 2000 e 2005. Não é perfeito! Também tem dificuldades. Não há sistemas perfeitos.

O Panamá também está desenvolvendo uma experiência muito interessante. É uma país pequeno também, o que torna a implantação mais fácil, provavelmente.

No México, há exemplos variados. Há Estados da federação com bons avanços, como Nuevo León, e outros não tão bem-sucedidos. Na Argentina, há províncias, como Neuquén, que estão indo bem. No sistema federal argentino, ainda estamos tentando entender o que está acontecendo. Costa Rica tem uma experiência interessante, ainda que parcial, e a República Dominicana tem boa oralidade em muitos aspectos, com o MP, defesa e Judiciário bem treinados.

 

Como o senhor volta ao Chile depois desse encontro? Vê oportunidades de manter um diálogo para impulsionar uma reforma no Brasil?

O Brasil é gigante e federativo. Por isso, é importante observar o que está acontecendo no México e na Argentina [que tem formas de Estado parecidas].

Já nos comprometemos com o CEAF para realizar novas jornadas CEJA no próximo ano e provavelmente vamos fazer alguns módulos de aulas com os novos promotores do Ministério Público de São Paulo que se formarão em janeiro de 2016.

Neste evento, surgiu uma sociedade importante com o Ministério Público de São Paulo. Voltamos informados das dificuldades e sabendo o que é necessário pensar para instalar um sistema acusatório no Brasil e nos sistemas federais. Tivemos contatos com ideias que vão nos permitir trabalhar e, no próximo ano, voltaremos para continuar apoiando o progresso em direção a um sistema adversarial. Mas insisto, depende muito da liderança do MP e da atitude de olhar-se no espelho e dizer: “temos que ter outro perfil, outra função dentro do sistema”. E acredito que muitas dessas coisas possamos fazer inclusive dentro da estrutura normativa e das leis hoje existentes. Quando isso não for possível, temos de pensar estrategicamente onde é que temos de mudar ou por onde temos de começar a mudar para que o MP vá evoluindo em direção a um papel mais ativo nas investigações penais.


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