Lei nº 12.183, de 29 de dezembro de
2005
Dispõe sobre a cobrança pela utilização
dos recursos hídricos do domínio do Estado de São Paulo, os procedimentos para
fixação dos seus limites, condicionantes e valores e dá outras providências.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO:
Faço saber que a Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo a
seguinte lei:
SEÇÃO I
Do Objetivo e da Implantação da Cobrança
Artigo 1º - A cobrança pela utilização dos recursos
hídricos objetiva:
I - reconhecer a água como bem público de valor
econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor;
II - incentivar o uso racional e sustentável da
água;
III - obter recursos financeiros para o
financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos
hídricos e saneamento, vedada sua transferência para custeio de quaisquer
serviços de infra-estrutura;
IV - distribuir o custo sócio-ambiental pelo uso degradador e indiscriminado da água;
V - utilizar a cobrança da água como instrumento de
planejamento, gestão integrada e descentralizada do uso da água e seus
conflitos.
Artigo 2º - A cobrança pela utilização dos recursos
hídricos será vinculada à implementação de programas, projetos, serviços e obras,
de interesse público, da iniciativa pública ou privada, definidos nos Planos de
Recursos Hídricos, aprovados previamente pelos respectivos Comitês de Bacia e
pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos.
§ 1º - O produto da cobrança estará vinculado às
bacias hidrográficas em que for arrecadado, e será aplicado em financiamentos,
empréstimos, ou a fundo perdido, em conformidade com o aprovado pelo respectivo
Comitê de Bacia, tendo como agente financeiro instituição de crédito designada
pela Junta de Coordenação Financeira, da Secretaria da Fazenda do Estado de São
Paulo, nas condições a serem definidas em regulamento.
§ 2º- Poderão obter recursos financeiros
provenientes da cobrança os usuários de recursos hídricos, inclusive os da
iniciativa privada, e os órgãos e entidades participantes de atividades afetas
ao Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos, na forma definida
em regulamento, exceto os usuários isentos por lei.
§ 3º - Desde que haja proporcional benefício para a
bacia sob sua jurisdição, o Comitê poderá, excepcionalmente, decidir pela
aplicação em outra bacia de parte do montante arrecadado.
§ 4º - Deverá ser aplicada parte dos recursos
arrecadados na conservação do solo e na preservação da água em zona rural da
Bacia, nos termos da regulamentação, respeitando-se o estabelecido no
respectivo Plano de Bacias, obedecidas as
características de cada uma delas.
Artigo 3º - A implantação da cobrança prevista nesta
lei será feita com a participação dos Comitês de Bacia, de forma gradativa e
com a organização de um cadastro específico de usuários de recursos hídricos.
Artigo 4º - O acompanhamento e a fiscalização da
aplicação dos recursos da cobrança, junto a cada um dos comitês de bacias será
efetuada de acordo com a legislação vigente.
Parágrafo único - A Assembléia Legislativa do
Estado, por meio de suas Comissões competentes, efetuará o acompanhamento e a
fiscalização da aplicação dos recursos da cobrança, para cujos membros serão
disponibilizadas todas as informações solicitadas.
Artigo 5º - Estão sujeitos à cobrança todos aqueles que utilizam os recursos
hídricos.
§ 1º - A utilização de recursos hídricos
destinada às necessidades domésticas de propriedades e de pequenos
núcleos populacionais distribuídos no meio rural estará isenta de cobrança
quando independer de outorga de direito de uso, conforme legislação específica.
§ 2º - Os responsáveis pelos serviços públicos de
distribuição de água não repassarão a parcela relativa à cobrança pelo volume
captado dos recursos hídricos aos usuários finais residenciais, desde que seja
comprovado o estado de baixa renda do consumidor, nas condições a serem
definidas em regulamento.
§ 3º - A cobrança para fins de geração de energia
elétrica seguirá o que dispuser a legislação federal.
§ 4º - A utilização de recursos hídricos por micro e
pequenos produtores rurais será isenta de cobrança, conforme dispuser a
regulamentação.
§ 5º - vetado.
Artigo 6º - A fixação dos valores para a cobrança
pela utilização dos recursos hídricos obedecerá aos seguintes procedimentos:
I - estabelecimento dos limites e condicionantes
pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos;
II - proposta, pelos Comitês de Bacia Hidrográfica,
dos programas quadrienais a serem efetivamente realizados, das parcelas dos
investimentos a serem cobertos com o produto da cobrança, e dos valores a serem
cobrados na Bacia;
III - referenda, pelo Conselho Estadual de Recursos
Hídricos, das propostas dos Comitês, de programas quadrienais de investimentos
e dos valores da cobrança;
IV - aprovação e fixação dos valores a serem
aplicados em cada Bacia Hidrográfica, por decreto do Governador do Estado.
§ 1º - Da proposta, pelo Comitê de Bacia
Hidrográfica, dos valores a serem cobrados na Bacia, caberá recurso
administrativo ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos, na forma a ser
definida em regulamento.
§ 2º - As decisões do Conselho Estadual de Recursos
Hídricos e dos Comitês de Bacia sobre a fixação dos limites, condicionantes e
valores da cobrança pela utilização dos recursos hídricos serão tomadas por
maioria simples, mediante votos dos representantes da Sociedade Civil, dos
Municípios e do Estado, os quais terão os seguintes pesos:
1 - 40% (quarenta por cento), os votos dos representantes de entidades
da sociedade civil, fixado em 70% (setenta por cento), no contexto destas, o
peso dos votos das entidades representativas de usuários pagantes de recursos
hídricos;
2 - 30% (trinta por cento), os votos dos
representantes dos Municípios;
3 - 30% (trinta por cento), os votos dos
representantes do Estado.
Artigo 7º - A cobrança será realizada:
I - pela entidade responsável pela outorga de
direito de uso nas Bacias Hidrográficas desprovidas de Agências de Bacias;
II - pelas Agências de Bacias.
Parágrafo único - O produto da cobrança
correspondente à Bacia em que for arrecadado será creditado na subconta do Fundo Estadual de Recursos Hídricos - FEHIDRO,
de acordo com as condições a serem definidas em regulamento, devendo ser
repassadas:
1. à conta geral do Fundo, a parcela correspondente
aos empréstimos contratados pelo Estado, aprovados pelo Comitê ligado à Bacia;
2. à conta geral do Fundo, a quota-parte que couber
à Bacia, necessária à implantação e desenvolvimento das bases técnicas e
instrumentos da Política Estadual de Recursos Hídricos, conforme deliberado
pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos;
3. às subcontas
de outras bacias, as quantias que nelas devam ser aplicadas e que beneficiem a
região onde forem arrecadadas.
Artigo 8º - O modo e a periodicidade da cobrança
serão definidos pelos Comitês de Bacia, em função das respectivas
peculiaridades e conveniências.
SEÇÃO II
Dos Critérios Gerais para a Cobrança
Artigo 9º - A fixação dos valores a serem cobrados
pela utilização dos recursos hídricos considerará:
I - na captação, extração e derivação:
a) a
natureza do corpo d'água - superficial e subterrâneo;
b) a classe de uso preponderante em que estiver
enquadrado o corpo d'água no local do uso ou da derivação;
c) a disponibilidade hídrica local;
d) o grau de regularização assegurado por obras
hidráulicas;
e) o volume captado, extraído ou derivado e seu
regime de variação;
f) o consumo efetivo ou volume consumido, calculado
pela diferença entre o volume captado e o volume devolvido, dentro dos limites
da área de atuação do Comitê de Bacia, ou pelo volume exportado para fora
desses limites, segundo o tipo de utilização da água e seu regime de variação;
g) a finalidade a que se destinam;
h) a sazonalidade;
i) as características dos aqüíferos;
j) as características físico-químicas e biológicas
da água no local;
k) a localização do usuário na Bacia;
l) as práticas de conservação e manejo do solo e da
água;
II - na diluição, transporte e assimilação de
efluentes:
a) a classe de uso preponderante em que estiver
enquadrado o corpo d'água receptor no local;
b) o grau de regularização assegurado por obras
hidráulicas;
c) a carga lançada e seu regime de variação,
ponderando-se os parâmetros orgânicos e físico-químicos dos efluentes;
d) a natureza da atividade;
e) a sazonalidade;
f) a vulnerabilidade dos aqüíferos;
g) as características físico-químicas e biológicas
do corpo receptor no local do lançamento;
h) a localização do usuário na Bacia; e
i) as práticas de conservação e manejo do solo e da
água;
III - outros usos que alterem o regime, a quantidade
ou a qualidade da água existente em um corpo d'água.
§ 1º - A fixação dos valores a serem cobrados, de
que trata este artigo, terá por base o volume captado, extraído, derivado e
consumido, bem como a carga dos efluentes lançados nos corpos d'água.
§ 2º - Os Comitês de Bacia poderão propor
diferenciação dos valores a serem cobrados, em função de critérios e parâmetros
definidos em regulamento, que abranjam a qualidade e disponibilidade de
recursos hídricos, de acordo com as peculiaridades das respectivas unidades
hidrográficas.
§ 3º- Serão adotados mecanismos de compensação e
incentivos para os usuários que devolverem a água em qualidade superior àquela
determinada em legislação e normas regulamentares.
SEÇÃO III
Das Bases de Cálculo para a Cobrança
Artigo 10 - As entidades responsáveis pela outorga
de direito de uso, pelo licenciamento de atividades poluidoras, e as Agências
de Bacias manterão cadastro integrado de dados e informações, a serem
fornecidos pelos usuários em caráter obrigatório, que possibilitem determinar as
quantidades sujeitas à cobrança, facultado ao usuário acesso a seus dados
cadastrais.
§ 1º - Para a elaboração do cadastro os agentes
responsáveis poderão contar com o suporte técnico dos demais órgãos do Governo.
§ 2º - O cadastro de dados e informações de que
trata o "caput" deste artigo será definido em regulamento.
Artigo 11 - O volume consumido será avaliado em
função do tipo de utilização da água, pela multiplicação do volume captado,
extraído ou derivado por um fator de consumo, a ser definido em regulamento.
Artigo 12 - O valor a ser cobrado por captação,
extração, derivação e consumo resultará da multiplicação dos respectivos
volumes captados, extraídos, derivados e consumidos pelos correspondentes
valores unitários, e pelo produto dos coeficientes que considerem os critérios
estabelecidos no artigo 9º, respeitado o limite máximo correspondente a
0,001078 UFESP (um mil e setenta e oito milionésimos de UFESP) por m³ captado,
extraído ou derivado.
Parágrafo único - Na hipótese de extinção da UFESP,
o limite a que se refere o "caput" será definido com base na
legislação que vier a substituí-la.
Artigo 13 - Na diluição, transporte e assimilação de
efluentes, os parâmetros a serem considerados e as cargas referentes a cada um
deles, por atividade, serão definidos em regulamento.
Artigo 14 - A carga lançada será avaliada, em função
da atividade do usuário, pela multiplicação da carga produzida por um fator de
tratamento, conforme condições a serem definidas em regulamento.
Artigo 15 - O valor a ser cobrado pela utilização
dos recursos hídricos para a diluição, transporte e assimilação das cargas
lançadas nos corpos d'água resultará da soma das parcelas referentes a cada
parâmetro, respeitado o teto de 3 vezes o valor a ser cobrado por captação, extração,
derivação e consumo desde que estejam sendo atendidos os padrões de lançamentos
estabelecidos pela legislação ambiental vigente.
Artigo 16 - Se o usuário ou qualquer das entidades
encarregadas da cobrança julgar inconsistentes as quantidades calculadas,
poderão estas ser revistas com base em valores resultantes de medição direta
dos volumes captados, extraídos, derivados, consumidos e das cargas lançadas.
SEÇÃO IV
Das Sanções
Artigo 17 - O não-pagamento dos valores da cobrança
até a data do vencimento, sem prejuízo de sua cobrança administrativa ou
judicial, acarretará:
I - a suspensão ou perda do direito de uso,
outorgado pela entidade competente, a critério do outorgante, na forma a ser
definida em regulamento;
II - o pagamento de multa de 2% (dois por cento)
sobre o valor do débito;
III - o pagamento de juros moratórios de 1% (um por
cento) ao mês.
Artigo 18 - A informação falsa dos dados relativos à
vazão captada, extraída, derivada ou consumida e à carga lançada pelo usuário,
sem prejuízo das sanções penais, acarretará:
I - o pagamento do valor atualizado do débito
apurado, acrescido de multa de 10% (dez por cento) sobre seu valor, dobrada a
cada reincidência;
II - a cassação do direito de uso a critério do
outorgante, a ser definida em regulamento.
Artigo 19 - Das sanções de que trata o artigo
anterior caberá recurso à autoridade administrativa competente, nos termos a
serem definidos em regulamento.
Artigo 20 - A regulamentação desta lei se fará no
prazo de 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação, mediante proposta do
Conselho Estadual de Recursos Hídricos, ouvidos os Comitês de Bacias
Hidrográficas.
Parágrafo único - O regulamento será estabelecido de
forma clara e objetiva de maneira a possibilitar o melhor entendimento
possível, especialmente pelos usuários de recursos hídricos.
Artigo 21 - Esta lei e suas Disposições Transitórias
entram em vigor na data de sua publicação, ficando expressamente revogados o
inciso III do artigo 7º das Disposições Transitórias da Lei nº 7.663, de 30 de
dezembro de 1991 e o artigo 31 das Disposições Transitórias da Lei nº 9.034, de
29 de dezembro de 1994, retroagidos os efeitos, quanto a esta, à data da
respectiva publicação.
SEÇÃO V
Disposições Transitórias
Artigo 1º - Os usuários urbanos e industriais dos
recursos hídricos estarão sujeitos à cobrança efetiva somente a partir de 1º de
janeiro do ano de 2006.
Parágrafo único - Os demais usuários estarão
sujeitos à cobrança somente a partir de 1º de janeiro do ano de 2010.
Artigo 2º - O Poder Executivo deverá propor, dentro
dos 24 (vinte e quatro) meses seguintes à aprovação desta lei, as leis
específicas, previstas na Lei nº 9.866/97, referentes às Áreas de Proteção e
Recuperação de Mananciais das Sub-Bacias do Guarapiranga, Cotia, Billings, Tietê-Cabeceiras e Juqueri-Cantareira, nos limites da Unidade de Gerenciamento
de Recursos Hídricos do Alto Tietê.
Parágrafo único - Na hipótese de não-aprovação das
leis referidas no artigo anterior, em até 24 (vinte e quatro)
meses após a sanção ou promulgação desta lei, o montante arrecadado a
partir do primeiro dia subseqüente ao período citado, no Estado, ficará retido
nas subcontas do Fundo Estadual de Recursos Hídricos
- FEHIDRO.
Artigo 3º - O Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto
Tietê deverá destinar, pelo período de 10 (dez) anos, no mínimo 50% (cinqüenta
por cento) dos recursos de investimento oriundos da cobrança para conservação,
proteção e recuperação das áreas de mananciais que atendam a sua área de
atuação.
Artigo 4º - A cobrança pela utilização de recursos
hídricos para abastecimento das operadoras públicas e privadas do serviço de
saneamento (abastecimento de água e esgotamento sanitário), devido às suas
peculiaridades de uso, será de 50% (cinqüenta por cento) do valor a ser cobrado
dos usuários de recursos hídricos, até dezembro de 2009, mediante comprovação
conforme dispuser o regulamento, da realização de investimentos com recursos
próprios ou financiamentos onerosos, em estudos, projetos e obras destinadas ao
afastamento de esgotos (exceto redes) e tratamento dos mesmos.
Artigo 5º - Excluem-se do disposto no § 4º do artigo 2º as Bacias da Baixada Santista
e do Alto Tietê, levando em consideração suas características de conurbação.
Palácio dos Bandeirantes, aos 29 de dezembro de
2005.
Geraldo Alckmin
Mauro Guilherme Jardim Arce
Secretário de Energia, Recursos Hídricos e
Saneamento
Fábio Augusto Martins Lepique
Secretário-Adjunto, Respondendo pelo Expediente da
Casa Civil
Publicada na Assessoria Técnico-Legislativa, aos 29
de dezembro de 2005.
Regulamentado pelo Decreto nº 50.667, de 30 de março
de 2006