Esquema em cobrança de ISS causou prejuízos de pelo menos R$ 200 milhões aos cofres públicos
Uma operação do Ministério Público do Estado de São Paulo, realizada na manhã desta quarta-feira (30/10), com o apoio da Polícia Civil, após investigação em conjunto com a Controladoria Geral do Município de São Paulo, resultou na prisão de quatro agentes públicos ligados à Subsecretaria da Receita da Prefeitura da Capital. Eles são apontados como integrantes de um grande esquema de corrupção que causou prejuízos calculados em pelo menos R$ 200 milhões aos cofres públicos, somente nos últimos três anos. Todos são investigados pelos crimes de corrupção, concussão, lavagem de dinheiro e advocacia administrativa.
Na operação foram presos R.B.R., ex-Subsecretário da Receita Municipal; E.H.B., ex-Diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança; C.d.L.L.A., ex-Diretor da Divisão de Cadastro de Imóveis, e o agente de fiscalização L.A.C. de M., todos exonerados entre dezembro de 2012 e fevereiro de 2013 dos cargos em confiança que ocupavam junto a Prefeitura de São Paulo. Além das prisões, foram cumpridos mandados de busca e apreensão nas residências dos servidores e de terceiros, assim como nas sedes das empresas ligadas ao esquema.
A operação ocorreu nesta Capital, em Santos e também em Cataguases, Minas Gerais, e mobilizou mais de 40 pessoas, entre Promotores de Justiça, agentes da Controladoria Geral do Município, e das Polícias Civis de São Paulo e de Minas Gerais. Também foi determinado pela Justiça o sequestro dos bens dos envolvidos e das empresas por eles operadas. Nas investigações, iniciadas há cerca de seis meses e que contaram com o apoio da Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico e dos componentes da Agência de Atuação Integrada de Combate ao Crime Organizado (Secretaria de Segurança Pública, Polícia Civil e Polícia Federal), apurou-se que os quatro auditores fiscais do Município de São Paulo montaram um grande esquema de corrupção envolvendo os valores do ISS cobrado de empreendedores imobiliários. A elucidação começou a partir da identificação, pela recém-criada Controladoria Geral do Município, de agentes fiscais que apresentavam fortes indícios de evolução patrimonial incompatível com a respectiva remuneração. Também foi identificado que a análise da cobrança de ISS de grandes empreendimentos imobiliários da Capital era direcionada para o grupo criminoso.
O recolhimento do ISS – calculado sobre o custo total da obra – é condição para que o empreendedor obtenha o “habite-se” e os auditores fiscais sempre emitiam as guias com valores ínfimos e exigiam dos empreendedores o depósito de altas quantias em suas contas bancárias. Sem isso, os certificados de quitação do ISS não eram emitidos e o empreendimento não era liberado para ocupação.
Por meio de análise estatística efetuada pelo seu setor de inteligência e de produção de informações estratégicas, a Controladoria do Município constatou que nas obras sob a responsabilidade desses auditores fiscais a arrecadação do ISS era substancialmente menor ao percentual arrecadado pela média dos outros servidores que atuavam na mesma área. Como exemplo, uma grande empresa empreendedora recolheu, a título de ISS, uma guia no valor de R$ 17,9 mil e, no dia seguinte, depositou R$ 630 mil na conta da empresa de titularidade de um dos auditores fiscais. O valor da propina corresponde a 35 vezes o montante que entrou nos cofres públicos.
Prédio em Juiz de Fora, onde um dos agentes fiscais tem um apartamento duplex
As investigações também descobriram que empresas incorporadoras depositaram, em um período inferior a 6 meses, mais de R$ 2 milhões na conta bancária da referida empresa de titularidade de uma dos investigados. O esquema tinha como foco prédios residenciais e comerciais de alto padrão, com custo de construção superior a R$ 50 milhões. O Ministério Público investiga se as empresas foram vítimas de concussão, porque não teriam outra opção para obter o certificado de quitação do ISS, ou se praticaram crime de corrupção ativa, recolhendo aos cofres públicos valor aquém do devido.
Pousada em Visconde de Mauá, de propriedade de um dos agentes fiscais presos
Grande parte do dinheiro obtido ilicitamente era depositada na conta bancária de uma empresa de administração de bens em nome de L. A. C. de M. e da esposa dele. Depósitos em cheque também foram identificados. Um dos membros do grupo, R. B. R., mantinha um escritório no Largo da Misericórdia, a 300 metros da sede da Prefeitura, montado para atender aos interesses do grupo criminoso em detrimento do Patrimônio Público Municipal.
O Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime de Formação de Cartel e à Lavagem de Dinheiro e de Recuperação de Ativos (GEDEC), apurou que os quatro auditores fiscais construíram patrimônio superior a R$ 20 milhões com o dinheiro desviado dos cofres públicos. Dentre os bens adquiridos criminosamente e sequestrados estão apartamentos de luxo, flats, prédios e lajes comerciais, em São Paulo e Santos, barcos e automóveis de luxo, uma pousada em Visconde de Mauá (RJ) e um apartamento duplex em Juiz de Fora (MG).
Na operação desta quarta-feira foram apreendidos com os quatro investigados motos e carros importados, entre eles um Porsche, grande quantidade de dinheiro (reais, dólares e euros), documentos, computadores e pen-drives.
Na entrevista coletiva em que foi apresentado um balanço da operação, o Promotor de Justiça Roberto Bodini, que preside a investigação, destacou a importância da colaboração da Controladoria do Município para a apuração. “A agilidade no envio de informações do órgão ao Ministério Público foi fundamental para o resultado”, afirmou.
O trabalho cooperado entre MP e Prefeitura também foi elogiado pelo Procurador-Geral de Justiça, Márcio Fernando Elias Rosa. “O trabalho institucional realizado pelo Ministério Público e a Prefeitura permite a atuação permanente de controle, como demonstra essa operação, desenvolvida pelos Promotores com enorme competência e emprego da melhor técnica”, disse.
O GEDEC também contou com o apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) na operação.
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