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Friday , 23 de september de 2016

"Ato infracional é última etapa de uma série de rompimentos de vínculos", diz promotor Eduardo Brechani

CAO Cível promoverá seminário "O Ministério Público e o Ato Infracional"
CAO Cível promoverá seminário "O Ministério Público e o Ato Infracional"

No mês de outubro, o Centro de Apoio Operacional Cível do MPSP promoverá o primeiro seminário nacional “O Ministério Público e o Ato Infracional”, com o objetivo de discutir com procuradores, promotores, analistas jurídicos, estagiários e técnicos, além de outros profissionais do Direito, diversos temas concernentes ao atendimento socioeducativo. “Devemos nos conscientizar que o ato infracional é a última etapa de uma série de rompimentos de vínculos que fazem com que o adolescente acabe se enveredando pela prática de um ato definido em lei como crime”, afirma o promotor Carlos Eduardo Brechani, um dos coordenadores do evento (veja aqui a programação e como se inscrever).

 

A programação, segundo ele, foi elaborada para refletir a realidade de diversos Estados do país. “A ideia é que consigamos compartilhar experiências exitosas, construir possíveis soluções e ter uma linha mais uniforme, técnica e clara da interpretação da lei”, argumenta Brechani, que destaca a cooperação de diversos colegas de todo o Brasil para que o evento fosse viabilizado, como no caso do promotor de Justiça do MP do Ceará, Sérgio Maia Louchard, coorganizador.

 

A seguir, os principais trechos da entrevista de Brechani ao site do MPSP.

 

Qual o objetivo do seminário “O Ministério Público e o Ato Infracional”?

A ideia do evento é poder discutir todas aquelas questões que atingem os que trabalham com adolescentes em conflito com a lei. Para tanto, foram selecionados vários temas: boas práticas, aspectos de difícil interpretação da lei do Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo) e também um espaço para debater possíveis soluções para pontos de estrangulamento.  Essa é a razão de termos representantes do Brasil inteiro no seminário.

 

Hoje, a abordagem da lei não é uniforme?

Não. Não existe uma uniformidade nem mesmo dos doutrinadores, das pessoas que escrevem sobre a lei. Notamos que, mesmo em São Paulo, há muita divergência na sua aplicação. Quando nós vamos para outros Estados, percebemos que há mais variação ainda. Há um tópico em especial que bem reflete essa dissonância. Ele será abordado no dia 25 de outubro pela procuradora do Rio, Flávia Ferrer, e pela promotora de Justiça do MPSP, Maria Claudia Nardy Pereira, e trata da unificação das medidas socioeducativas, da internação com a respectiva absorção das medidas anteriores e, por fim, da maioridade penal como possível causa da extinção das medidas socioeducativas. Esses três temas são muito heterogêneos na aplicação, desde o nível nacional até o municipal, já que, em cada comarca, cada promotor tem um entendimento bem peculiar sobre o assunto.

 

Então, o problema seria mais de interpretação do que do aparato legal. Porque a mídia recorrentemente fala da necessidade de alteração da lei...

Não dá para colocar a questão de forma tão simples assim. Há muita variação na interpretação jurídica em decorrência até mesmo da ineficiência do poder público em cumprir o que está disposto na lei. Se vivêssemos em um contexto jurídico-social em que o Estatuto da Criança e do Adolescente e a lei do Sinase fossem eficazmente aplicados, aí sim teríamos plenas condições de identificar se é necessária ou não alguma alteração legislativa. Hoje, existe um vácuo. As políticas estabelecidas nunca foram implementadas. Por isso, não se consegue dizer com base na experimentação prática se a falha é legislativa ou executiva. Vamos promover esse debate para mostrar o que pode ser feito para a efetiva implantação da lei do Sinase. No dia 26, um dos módulos vai tratar das ações efetivas contra entes públicos para tanto.

 

Por que membros do MPF estarão no evento? A questão do ato infracional não se circunscreve à esfera estadual?

É competência e atribuição exclusiva do MP estadual atuar diante da prática de atos infracionais. Mas como estamos discutindo fragilidades de políticas públicas, que podem ser também debatidas pelo Conanda (Conselho Nacional do Direito da Criança e do Adolescente) e como também existe um plano de atendimento socioeducativo que foi estabelecido em nível nacional, a participação dos procuradores da República será fundamental para que eles possam tomar conhecimento de como essa política está sendo implantada efetivamente. O ECA atribui a todos os poderes públicos a responsabilidade sobre a criança e o adolescente, sendo que, na prática, o que a gente vê só Estado e município atuando no financiamento da área do adolescente em conflito com a lei.

 

Uma saída para a atual conjuntura seria a revisão da legislação, impondo medidas socioeducativas mais duras? Fala-se da redução da maioridade penal ou do aumento do tempo de internação. Esses temas devem surgir no evento?

Esses temas certamente serão debatidos. É um dos objetivos. Haverá duas exposições no dia 25 de outubro que os circunscrevem: são as falas do doutor Walter Agra Júnior, conselheiro do CNMP, e do corregedor-geral do Ministério Público, Paulo Afonso Garrido de Paula. Especificamente sobre a pergunta tecida, é importante demonstrar que são duas questões paralelas: a redução da maioridade penal e o aumento do prazo da internação. A grande realidade é que não é possível discutir a redução da maioridade penal sem efetuar um real diagnóstico da situação atual. Essa redução de fato diminuirá o número de infrações? Quais são as causas dos atos infracionais? Ademais, pela experiência do CAO, a proposta de reduzir a maioridade penal para os atos infracionais equiparados a crimes hediondos, mas excluindo-se o tráfico de entorpecentes, vai abarcar uma quantidade mínima de adolescentes internados. Vale dizer, não vai ter um resultado efetivo. Parece-me até que há uma carga de inconstitucionalidade na conclusão de que um adolescente que pratica um ato infracional equiparado a um crime hediondo tem a consciência necessária para compreender a gravidade daquele ato, mas um jovem que comete um ato infracional diverso não tem essa maturidade. Parece um pouco incoerente. No que toca ao aumento dos prazos de internação, a dúvida reside também na eficácia prática: o aumento do tempo de internação, sem que seja estabelecido um prazo mínimo de cumprimento da medida (que é obrigatoriamente fixada por prazo indeterminado), irá traduzir alguma mudança? O CAO espera que todas essas questões sejam discutidas no evento. 


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